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textos em vastas “bibliotecas de Alexandria” de vários andares – foram destruídos
pelas invasões e ocupações islâmicas persas e turcas do subcontinente indiano,
e, além disso, a grande mãe das civilizações foi obscurecida por ondas de
invasão, dominação e exploração cristãs europeias.
Não creio que eu tenha lido On the Road antes, coisa que fiz para este trabalho,
e não creio que teria gostado muito do aspecto de vigarista manhoso de
Dean Moriarty, embora minhas caronas e perambulações frenéticas de Nova
York à Califórnia iniciadas em 1958 e estendendo-se intermitentemente até 1961
fossem de algum modo semelhantes. Contudo, jamais pulei em um trem de
carga e admiro Kerouac por seu conhecimento e coragem para fazer isso.
Uma questão que aparentemente pairou sobre Kerouac é se ele realmente
entendia bastante do Darma, como se não fosse de fato genuíno em seu entendimento
sobre a iluminação ou coisa assim. Ouviu-se Alan Watts dizer que ele poderia
ter tido “alguma carne Zen, mas nenhum osso Zen”, referindo-se ao título
de uma obra de outro escritor do Zen, o formidável Paul Reps. E Gary Snyder,
que passou anos em mosteiros Zen e hoje em dia é uma espécie de mestre Roshi
do Zen, bem como poeta, talvez tenha pensado que Kerouac não captou direito a
mensagem, embora permanecesse sendo um amigo querido. Não há dúvida de
que o trágico vício do álcool, que abreviou sua vida e seu trabalho aos 47 anos de
idade, é a evidência de que, fosse qual fosse a iluminação que ele houvesse obtido,
era desprovida do estado de buda perfeito, pois budas em geral não bebem
até morrer prematuramente, visto que tal coisa não ajuda ninguém, sendo que
ajudar é exatamente o que os budas fazem com naturalidade. Mas quem realmente
pode reivindicar essa espécie de transmutação física transcendente e essa
transmutação mental cósmica? Na vasta literatura psicológica dos budistas, existem
muitas análises sobre os vários estágios de iluminação; de acordo com
elas, é possível estar iluminado em certo grau e ainda assim ser vítima de defeitos
humanos. De fato, uma pessoa torna-se um bodisatva, ou herói da iluminação,
ao fazer com sinceridade o voto de se tornar perfeitamente iluminada em
alguma vida futura, próxima ou distante, a fim de desenvolver o conhecimento e
a capacidade para libertar do sofrimento todos os seres sensíveis. Ou seja: nem
todos os bodisatva são entidades celestiais ou divinas. Muitos são humanos, demasiado
humanos.
O que pode ter tornado Kerouac menos aceito entre os primeiros budistas
da Califórnia – Gary Snyder, Alan Watts e outros – foi não ter ficado tão atraído
pela linha Ch’an/Zen, embora adorasse as obras de Han Shan, as meditações
poéticas da “montanha gelada” transmitidas por Snyder. Kerouac ficou mais comovido
com a linha indiana Maaiana, que emerge tanto da presente obra, a