Certo <strong>de</strong> que a Caveira não o <strong>de</strong>cepcionaria, mais doque <strong>de</strong>pressa o caçador os conduziu até a sua estranhacompanheira. Vendo-a, apressou-se em fazer astais perguntas <strong>de</strong> que tanto falara, mas a Caveiranão murmurou sequer qualquer coisa. Cala<strong>da</strong> estava,cala<strong>da</strong> ficou. Mais o caçador perguntava e maisela ficava cala<strong>da</strong>. Nem um “ai”, quanto mais umaresposta.Diante dos olhares ameaçadores dos companheiros,ele ain<strong>da</strong> tentou argumentar, dizendo qualquer coisa,encontrar um jeito <strong>de</strong>... Mas ninguém quis saber <strong>de</strong>conversa e muito menos <strong>de</strong> explicação. Caíram sobreele com to<strong>da</strong> a raiva do mundo e <strong>de</strong>ram-lhe uma gran<strong>de</strong>surra. A <strong>maio</strong>r que já levara. Foram embora reclamandomuito e gritando:— Mentiroso!Pobre caçador! Todo machucado, o corpo dolorido,ficou estirado no chão, gemendo,gemendo. Só commuito esforço, conseguiu se encostar na árvore, procurandoforças para ficar <strong>de</strong> pé. Quando finalmenteconseguiu se levantar, olhou cheio <strong>de</strong> raiva para aCaveira e resmungou:— Olha bem, coisa do diabo, o que fez comigo!Os olhos <strong>de</strong>la cintilaram quase zombeteiramente e,<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> algum tempo, ela afirmou:— Quem per<strong>de</strong> o corpo é a língua, meu amigo, é alíngua...E cá entre nós, com to<strong>da</strong> razão!O caçador, bem machucado, foi para casa e, <strong>de</strong>ssavez, calou-se, guar<strong>da</strong>ndo para si aquilo que somenteele ouvira.MUKUENDANGÓ,MUKÚFUANGÓ,MUKUZUELANGÓ, MUKUIANGÓ.(por an<strong>da</strong>r à toa, morre-se à toa; por falar à toa, vaiseà toa!).De olho na Cultura 129
Expressando seus saberesVocê já <strong>de</strong>ve ter ouvido provérbios ou ditos popularessobre a língua, a boca ou quem fala <strong>de</strong>mais. Agora, solteo escritor que está <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> você. Selecione um assuntoque esteja <strong>de</strong>ntro do que você já estudou neste livro ecrie seu(s) próprio(s) provérbios.Ampliando a arte <strong>de</strong> contarContar e escrever histórias po<strong>de</strong> ser algo muitobom, muito ruim ou ain<strong>da</strong> as duas coisas. Leia otexto a seguir, <strong>da</strong> escritora Márcia Silva, artista plásticae atriz, sobre o assunto.Era uma vezArte <strong>de</strong> contar estórias na escola e na vi<strong>da</strong>Na <strong>maio</strong>ria <strong>da</strong>s <strong>cultura</strong>s não existe uma linha claraseparando o conto folclórico do popular, do conto <strong>de</strong>fa<strong>da</strong>s e <strong>da</strong> fábula. Antes <strong>de</strong> serem escritas, as estóriaseram transmiti<strong>da</strong>s oralmente, fundindo-se umascom as outras, incorporando a experiência <strong>de</strong> umasocie<strong>da</strong><strong>de</strong>; foram se modificando <strong>de</strong> acordo com oque o contador julgava ser <strong>de</strong> <strong>maio</strong>r ou <strong>de</strong> menorinteresse para os ouvintes <strong>de</strong> sua época. Aos contossão atribuídos diversos valores, o entretenimento éapenas um aspecto interno do contar estórias.Uma estória apresenta uma série <strong>de</strong> conhecimentoscom os quais somos alimentados para formar umabase em nosso interior, ao longo dos anos, <strong>de</strong> modoque esse conjunto agirá sobre a pessoa, reavivandoinformações e tradições. É como se fosse uma pílulacom cobertura açucara<strong>da</strong>, cujo ingrediente ativo resi<strong>de</strong>em seu interior.Ain<strong>da</strong> nos dias <strong>de</strong> hoje, algumas pessoas rejeitam oscontos <strong>de</strong> fa<strong>da</strong>s julgando que as crianças po<strong>de</strong>m tomáloscomo <strong>de</strong>scrições <strong>da</strong> reali<strong>da</strong><strong>de</strong> e/ ou, ain<strong>da</strong>, se afastardo gosto pela leitura. Vamos argumentar sobreesses dois aspectos.É ver<strong>da</strong><strong>de</strong> que as fábulas, narrativas em que seresirracionais, e algumas vezes inanimados, assumemcaracterísticas humanas, geralmente diverti<strong>da</strong>s, sem-130 De olho na Cultura
- Page 4:
Andréia Lisboa de SouzaAna Lúcia
- Page 10 and 11:
IntroduçãoLivros circulam em todo
- Page 12 and 13:
A CRIAÇÃO DOS MUNDOSPELA CULTURAA
- Page 14:
Nomeando e julgandoO ser humano tem
- Page 18 and 19:
As lentes da culturana representaç
- Page 20 and 21:
Antigas colônias francesasAntigas
- Page 22 and 23:
de certas relações sociais e econ
- Page 24 and 25:
Mas nem sempre a cultura a ser cons
- Page 26 and 27:
CULTURAE FORMAÇÃO DE IDENTIDADESO
- Page 28 and 29:
Quais são as relações entre cult
- Page 30 and 31:
Identidades:pequenos grandes retrat
- Page 32 and 33:
Porém, independentemente da miscig
- Page 34 and 35:
Texto AFrechal: Terra de Preto 3Ter
- Page 36 and 37:
Na escola dos mestres das palavras
- Page 38 and 39:
REPRESENTAÇÕES DO HOMEME DA MULHE
- Page 40 and 41:
Em nossa sociedade muito se tem dis
- Page 42 and 43:
Mãe Hilda JitoluHilda Dias dos San
- Page 44 and 45:
Esta é uma conhecida frase da pesq
- Page 46 and 47:
E tu te lembras da Casa-Grandee vam
- Page 48 and 49:
Filhote no subúrbioMulato, pardo o
- Page 50:
mulher. Os adultos educam as crian
- Page 53 and 54:
52 De olho na Cultura
- Page 55 and 56:
Geralmente podemos observar, por me
- Page 57 and 58:
cabelos dreadlocks, em contraste à
- Page 59 and 60:
mada em mercadorias. As expansões
- Page 61 and 62:
criadas no Brasil. Essas classifica
- Page 63 and 64:
Dicas culturais:A Casa Branca do En
- Page 65 and 66:
Uma das maiores dificuldades na soc
- Page 67 and 68:
Nas irmandades, um dos princípios
- Page 69 and 70:
68 De olho na Cultura
- Page 71 and 72:
Sim, somos todos seres humanos, por
- Page 73 and 74:
Brincadeiras sem constrangimentosN
- Page 75 and 76:
Mais explicitamente agressora, do p
- Page 77 and 78:
Estudo sobre a relação entre tele
- Page 79 and 80: Dicas culturais:Você sabia que, h
- Page 81 and 82: Das ruas para as academiasNo ano de
- Page 83 and 84: 82 De olho na Cultura
- Page 85 and 86: 84 De olho na Cultura
- Page 87 and 88: Essa interação envolve os reinos
- Page 89 and 90: os valores e a memória são revivi
- Page 91 and 92: Ancestral do metalDo ferro naturalD
- Page 93 and 94: Muitos só tiveram a sorteda mortal
- Page 95 and 96: prospectivo, vertical e horizontal,
- Page 97 and 98: 1. O Cacumbi, manifestação da reg
- Page 99 and 100: tral — espécie de bateria — co
- Page 101 and 102: Desafio no rap emboladaÉ o Rap emb
- Page 103 and 104: Mente em açãoNote que o jogo desa
- Page 105 and 106: 104 De olho na Cultura
- Page 107 and 108: Levante de Sabres Africanos(Guellwa
- Page 109 and 110: línguas faladas no continente afri
- Page 111 and 112: ar um movimento em direção oposta
- Page 113 and 114: 4. Um dos significados de territori
- Page 115 and 116: Linguagem e poder... A começar do
- Page 117 and 118: termos lingüísticos com a finalid
- Page 119 and 120: da igreja/comprovante vai pro fogo/
- Page 122 and 123: MODALIDADES CULTURAISDE LINGUAGEML
- Page 124 and 125: Patrimônio oralNas unidades anteri
- Page 126 and 127: Soltando o verboO provérbio é out
- Page 128 and 129: Um traço marcante nas modalidades
- Page 132 and 133: pre afirmam explicitamente uma verd
- Page 134 and 135: cas em histórias e tradições. Do
- Page 136 and 137: Mestre Lico: Tatu tá véio/ (coro)
- Page 138: Utilizando outras modalidades na fa
- Page 141 and 142: 140 De olho na Cultura
- Page 143 and 144: Os adornos corporais, os objetos ri
- Page 145 and 146: uso de madeira, que era entalhada c
- Page 147 and 148: Da África para o MundoPor muito te
- Page 149 and 150: pectiva e a ilusão de profundidade
- Page 151 and 152: Arte de MemóriaQuando o ser humano
- Page 153 and 154: Cultura e identidade na arteNem tod
- Page 155 and 156: África-Brasil - re/traduçãoNão
- Page 157 and 158: técnica e expressão artística, c
- Page 159 and 160: etratam suas lembranças de infânc
- Page 161 and 162: Pérolas do BrasilTambém nos anos
- Page 163 and 164: Afinal, o que é arte?Podemos aceit
- Page 165 and 166: Para dar certo: Encha a bexiga até
- Page 167 and 168: Caso esteja quebradiça, proceda da
- Page 169 and 170: 168 De olho na Cultura
- Page 171 and 172: A cara negra da imprensaA imprensa
- Page 173 and 174: Herbel e Tibério, o Teatro Experim
- Page 175 and 176: Televisão em questãoA televisão,
- Page 177 and 178: Em 1996, a Rede Manchete de Televis
- Page 179 and 180: Cinema em preto e brancoNo Brasil d
- Page 181 and 182:
Luz, câmera... re/açãoA represen
- Page 183 and 184:
O papel da mídiana discussão étn
- Page 185 and 186:
etomado, mas também é generoso, p
- Page 187 and 188:
Capítulo 21. CARNEIRO, Sueli. Negr
- Page 189 and 190:
Capítulo 51. AREIAS, Almir. O que
- Page 191 and 192:
3. __________. “Colaboração, An
- Page 193 and 194:
5. RODRIGUES, João Carlos. O Negro
- Page 195 and 196:
194 De olho na Cultura
- Page 197:
Uma história do negro no Brasilde