You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
POLÍTICA, CIÊNCIA E RELIGIÃO<br />
No pano <strong>de</strong> fundo eclético-neoplatônico do pensamento renascentista se <strong>de</strong>stacam algumas figuras <strong>de</strong><br />
vulto, começando com Nicolau <strong>de</strong> Cusa e terminando com Giordano Bruno. É uma nova concepção<br />
filosófica do mundo e da vida, ainda não bem claramente esboçada, <strong>de</strong> que seus próprios autores, às<br />
vezes, não têm clara consciência. É uma época <strong>de</strong> transição, em que novo e velho se entretecem<br />
mutuamente.<br />
Deixando <strong>de</strong> lado o alto valor da arte e da literatura, a maior conquista do pensamento da Renascença<br />
está na história humana e na ciência natural. Daí <strong>de</strong>rivam, em seguida, a ciência política e a técnica<br />
científica, ou ciência aplicada, que tiveram o seu gran<strong>de</strong> início. É o fruto do vivo interesse e da<br />
penetrante observação da experiência e do concretismo, quase <strong>de</strong>sconhecidos do pensamento clássico e<br />
medieval, que por sua vez estavam absorvidos pelo universal e pela transcendência.<br />
A expressão clássica da nova ciência política é Nicolau Maquiavel, que não era filosófico, mas<br />
teórico da técnica política, embora seu pensamento esteja alicerçado na metafísica do humanismo e do<br />
imanentismo renascentista. Galileu Galilei é a maior expressão da ciência nova. Ele também não foi<br />
filósofo, mas teórico e técnico da renovada ciência da natureza, mesmo que tenha valeida<strong>de</strong>s e faça<br />
afirmações <strong>de</strong> alcance metafísico.<br />
Dado o caráter imanentista e humanista da Renascença, não é logicamente possível uma religião<br />
verda<strong>de</strong>ira e própria, porquanto à religião é indispensável o conceito <strong>de</strong> um Deus transcen<strong>de</strong>nte e<br />
pessoal.<br />
A Renascença teve, no entanto, a sua religião, ou um sucedâneo <strong>de</strong> religião. Tal sucedâneo po<strong>de</strong><br />
procurar-se especialmente nas ciências ocultas — magia e astrologia —, que <strong>de</strong>sfrutaram então <strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />
favor; pois em todas as épocas <strong>de</strong> <strong>de</strong>scrença, a superstição toma fatalmente o lugar da religião.<br />
Mas o Cristianismo não esteve ausente do pensamento da Renascença, e muito menos da vida<br />
transcen<strong>de</strong>nte e ascética, embora o renascentismo não se harmonize com o cristianismo católico romano<br />
da época, pois o verda<strong>de</strong>iro cristianismo da Renascença po<strong>de</strong> ser representado pelo protestantismo, e,<br />
em especial, pelo protestantismo luterano.<br />
O protestantismo, apesar <strong>de</strong> tantos <strong>de</strong> seus aspectos exteriores estarem em oposição com o espírito<br />
renascentista, exprime, no fundo, o mesmo i<strong>de</strong>al imanentista e individualista da Renascença.<br />
Portanto, teremos <strong>de</strong> tratar da Reforma Protestante como sendo a religião da época nova, e, em<br />
seguida, da Contra-Reforma Católica como natural reação, ou melhor, como <strong>de</strong>senvolvimento lógico do<br />
cristianismo católico perante as duas novas tendências <strong>de</strong> pensamento e <strong>de</strong> vida.<br />
Os ensinamentos da Reforma Protestante baseiam-se na Bíblia Sagrada e vão <strong>de</strong> encontro a diversos<br />
dogmas fundamentais do catolicismo. A Contra-Reforma é o movimento <strong>de</strong> reação e <strong>de</strong> renovação contra<br />
a Reforma e a Renascença. Culmina no Concílio <strong>de</strong> Trento (1546-1563), e tem como maior expressão a<br />
Or<strong>de</strong>m dos Jesuítas da Companhia <strong>de</strong> Jesus, então recentemente fundada (1534).<br />
Do ponto <strong>de</strong> vista filosófico, a Contra-Reforma tem como característica fundamental a valorização do<br />
concretismo mo<strong>de</strong>rno, mas subordinado a uma reafirmação profunda e vigorosa da transcendência e do<br />
ascetismo.<br />
Da Itália, berço do Humanismo e da Renascença, o renascentismo propagou-se por toda a Europa<br />
civilizada, que, aliás, estava preparada para receber estas novas formas <strong>de</strong> pensamento e <strong>de</strong> vida. Nas<br />
gran<strong>de</strong>s nações européias o Humanismo e o Renascimento se interessam especialmente pelos problemas<br />
religiosos, que, entretanto, não <strong>de</strong>spertaram na Itália <strong>de</strong>masiado interesse possivelmente em virtu<strong>de</strong> da<br />
intolerância do catolicismo romano.