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O Pasquim nos anos de chumbo (1969 – 1971): A CHARGE COMO ...

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5. A PATOTA ENFRENTA A CENSURA<br />

66<br />

Como beber <strong>de</strong>ssa bebida amarga<br />

Tragar a dor, engolir a labuta<br />

Mesmo calada a boca, resta o peito<br />

Silêncio na cida<strong>de</strong> não se escuta<br />

De que me vale ser filho da santa<br />

Melhor seria ser filho da outra<br />

Outra realida<strong>de</strong> me<strong>nos</strong> morta<br />

Tanta mentira, tanta força bruta<br />

Como é difícil acordar calado<br />

Se na calada da noite eu me dano<br />

Quero lançar um grito <strong>de</strong>sumano<br />

Que é uma maneira <strong>de</strong> ser escutado<br />

Esse silêncio todo me atordoa<br />

Atordoado eu permaneço atento<br />

Na arquibancada pra a qualquer momento<br />

Ver emergir o monstro da lagoa<br />

De muito gorda a porca já não anda<br />

De muito usada a faca já não corta<br />

Como é difícil, pai, abrir a porta<br />

Essa palavra presa na garganta<br />

Esse pileque homérico no mundo<br />

De que adianta ter boa vonta<strong>de</strong><br />

Mesmo calado o peito, resta a cuca<br />

Dos bêbados do centro da cida<strong>de</strong><br />

Talvez o mundo não seja pequeno<br />

Nem seja a vida um fato consumado<br />

Quero inventar o meu próprio pecado<br />

Quero morrer do meu próprio veneno<br />

Quero per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vez tua cabeça<br />

Minha cabeça per<strong>de</strong>r teu juízo<br />

Quero cheirar fumaça <strong>de</strong> óleo diesel<br />

Me embriagar até que alguém me esqueça<br />

Pai, afasta <strong>de</strong> mim esse cálice<br />

Pai, afasta <strong>de</strong> mim esse cálice<br />

Pai, afasta <strong>de</strong> mim esse cálice<br />

De vinho tinto <strong>de</strong> sangue.<br />

Chico Buarque, “Cálice” (1973)<br />

Chico Buarque compôs diversas músicas no período da Ditadura Militar,<br />

buscando driblar a censura através <strong>de</strong> seus versos e ao mesmo tempo, protestar contra o<br />

Regime Militar. Entre as músicas <strong>de</strong> Chico no período <strong>de</strong> 1964 a 1980, citamos Cálice<br />

logo na introdução do capítulo <strong>de</strong>vido sua importância nesse contexto. A letra, feita por<br />

Chico Buarque, contém em seus versos, pensamentos <strong>de</strong> revolta sobre o Regime, sendo<br />

que a palavra Cálice, está associada foneticamente a outra palavra: Cale-se. Chico refere<br />

à censura, que queria calar a voz <strong>de</strong> uma geração. Ele argumenta que o silêncio<br />

predominava naquele momento do país.

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