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O Pasquim nos anos de chumbo (1969 – 1971): A CHARGE COMO ...

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A partir do episódio marcante da prisão, a censura tentou corroer, e <strong>de</strong> fato<br />

restringiu, não apenas as mensagens e a criativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seus jornalistas, mas,<br />

principalmente, o jornal em si, através <strong>de</strong> repressões diretas e indiretas a quem se<br />

envolvia com o jornal (principalmente as bancas <strong>de</strong> jornal e os anunciantes) e da crise<br />

financeira que, naturalmente, foi vivenciada pelo <strong>Pasquim</strong> e por gran<strong>de</strong> parte da<br />

imprensa, na medida em que havia atraso na produção e distribuição do jornal.<br />

O artigo <strong>de</strong> Millôr Fernan<strong>de</strong>s, Réquiem para um Jornal Humorístico, abaixo<br />

<strong>de</strong>scrito, na edição <strong>de</strong> número 200, veiculada em junho <strong>de</strong> 1973, aponta a gravida<strong>de</strong> do<br />

confronto com os censores e a ameaça constante <strong>de</strong> fechamento do <strong>de</strong>bochado jornal<br />

carioca:<br />

71<br />

Sob as mais variadas pressões, realmente violentas e sempre parecendo<br />

invencíveis, escrevi alguns artigos sobre a vida do <strong>Pasquim</strong>. Este, dramático,<br />

tinha sua razão <strong>de</strong> ser; o jornal estava, mais uma vez, pra ser fechado. Assim,<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> quatro a<strong>nos</strong> <strong>de</strong> muitas e gargalhantes pelejas, algumas das quais<br />

foram acompanhadas alegremente pelo leitor, e outras das quais o leitor nem<br />

po<strong>de</strong> tomar conhecimento, O <strong>Pasquim</strong> chega ao número 200. Chega, não<br />

passa. Este é o último número do <strong>nos</strong>so jocoso semanário. (...) Como todo o<br />

mundo viu, cresceu, diminuiu e cresceu <strong>de</strong> novo, sempre castigando os<br />

mores, e hoje morre, rindo às ban<strong>de</strong>iras <strong>de</strong>spregadas. Pois morre ven<strong>de</strong>ndo<br />

saú<strong>de</strong> (100.000 exemplares). Morre atropelado. Uma força <strong>de</strong> alguns milhões<br />

<strong>de</strong> toneladas, uma teia <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> restrições e impedimentos, uma<br />

incalculável massa <strong>de</strong> obrigações e imposições, tornaram irrespirável a <strong>nos</strong>sa<br />

já mo<strong>de</strong>sta ração <strong>de</strong> ar.<br />

Dos seus quatro a<strong>nos</strong> <strong>de</strong> hilariante vida, este zombeteiro hebdomadário po<strong>de</strong><br />

contabilizar a glória <strong>de</strong> ter modificado fundamentalmente a linguagem dos<br />

outros jornais e ter influído muito na expressão falada da juventu<strong>de</strong> e no<br />

estilo da comunicação publicitária. Durante quatro a<strong>nos</strong>, este risonho jornal<br />

cuja maioria <strong>de</strong> sorri<strong>de</strong>ntes redatores não é ligada a nenhum grupo político,<br />

econômico, religioso, nacional ou estrangeiro, que tem como único objetivo o<br />

exercício <strong>de</strong> uma crítica geral e <strong>de</strong>mocrática a tudo e a todos (os po<strong>de</strong>rosos e<br />

estabelecidos sendo, naturalmente, os mais criticados, pois, não há graça<br />

nenhuma em criticar os caídos), foi combatido pela maioria dos gran<strong>de</strong>s<br />

órgãos <strong>de</strong> imprensa brasileira e por todos os <strong>de</strong>tentores <strong>de</strong> algum po<strong>de</strong>r,<br />

inconformados com um veículo que não tinha preço <strong>de</strong> venda a não ser o da<br />

banca e era dirigido por intelectuais inatacáveis porque sem fichas pregressas<br />

que os situassem em qualquer esquema <strong>de</strong> ilegalida<strong>de</strong> ou qualquer espécie <strong>de</strong><br />

criminalida<strong>de</strong>, mesmo fiscal.<br />

Chegando a circular com um máximo <strong>de</strong> 64 e um mínimo <strong>de</strong> 16 páginas, o<br />

risonho <strong>Pasquim</strong> conseguiu sobreviver a tudo, até mesmo à prisão <strong>de</strong> todos<br />

seus redatores, provada inútil pelas próprias autorida<strong>de</strong>s num processo que<br />

foi a consagração <strong>de</strong>ste grupo <strong>de</strong> profissionais, pois <strong>de</strong>monstrou que eles<br />

tinham como único e total objetivo <strong>de</strong> vida o exercício <strong>de</strong> sua apaixonante<br />

profissão.<br />

A coação física não impossibilitou a saída do jornal. Durante dois meses, ele<br />

circulou sem a colaboração <strong>de</strong> qualquer dos seus redatores habituais.<br />

Sobreviveu graças à solidarieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> inúmeros colegas. Saiu fraco e<br />

sobreviveu mal. Mas sobreviveu com a barriga doendo <strong>de</strong> tanto rir.<br />

Agora, porém, temos que <strong>nos</strong> ren<strong>de</strong>r e afirmamos, humil<strong>de</strong>mente, a <strong>nos</strong>sa<br />

<strong>de</strong>rrota, diante da única coação irresistível, a coação intelectual, hoje<br />

absoluta. Uma censura inconstitucional - a Constituição vigente é explícita<br />

quanto à liberda<strong>de</strong> plena <strong>de</strong> jornais e revistas circularem sem qualquer

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