O Pasquim nos anos de chumbo (1969 – 1971): A CHARGE COMO ...
O Pasquim nos anos de chumbo (1969 – 1971): A CHARGE COMO ...
O Pasquim nos anos de chumbo (1969 – 1971): A CHARGE COMO ...
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é sempre viver melhor” (FREUD, 1927, p. 192). O autor ainda distingue o humor tanto<br />
do efeito dos chistes quanto do cômico. O que caracteriza os chistes é serem<br />
manifestações do inconsciente, formas <strong>de</strong> escapar da repressão e do controle. O humor,<br />
ao contrário, embora tenha como os chistes e o cômico algo <strong>de</strong> libertador.<br />
Possui também qualquer coisa <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>za e elevação, que faltam às outras<br />
duas maneiras <strong>de</strong> obter prazer na ativida<strong>de</strong> intelectual. Essa gran<strong>de</strong>za resi<strong>de</strong><br />
claramente no triunfo do narcisismo, na afirmação vitoriosa da<br />
invulnerabilida<strong>de</strong> do ego. O ego se recusa a ser afligido pelas provocações da<br />
realida<strong>de</strong>, a permitir que seja compelido a sofrer. Insiste em que não po<strong>de</strong> ser<br />
afetado pelos traumas do mundo extremo; <strong>de</strong>monstra, na verda<strong>de</strong>, que esses<br />
traumas para ele não passam <strong>de</strong> ocasiões para obter prazer. (Freud,<br />
1974[1927]:190).<br />
A charge, por ter um catater imediatista, expressa a situação do país e do mundo<br />
com os mesmos critérios <strong>de</strong> noticiabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um texto, ou seja, (proximida<strong>de</strong>,<br />
atualida<strong>de</strong>, impacto, conflito, interesse pessoal, entre outros), assim, representa com<br />
humor uma situação, um contexto social ou político. Por ser imediatista, é apresentada<br />
no jornal do dia, e dias <strong>de</strong>pois per<strong>de</strong> seu valor e se torna uma fonte histórica.<br />
Como artista do riso e sujeito politicamente ativo, Henfil assinalou<br />
repetidamente o seu entendimento <strong>de</strong> que todo humor é político. Não como <strong>de</strong>fensor <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>terminadas plataformas partidárias, mas como a afirmação <strong>de</strong> uma postura perante os<br />
acontecimentos imediatos. Em suas palavras,<br />
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É óbvio que a chave para se fazer humor engajado é você estar engajado. Não<br />
há chance <strong>de</strong> você ficar na sua casa vendo os engajamentos lá fora, e<br />
conseguir fazer algo. Esse talvez seja o humor panfletário. É o humor que<br />
você faz <strong>de</strong> fora (...) Você não participa, você não age. Você <strong>de</strong>senha a ação.<br />
(Como se faz humor político. Henfil em <strong>de</strong>poimento a Tarik <strong>de</strong> Souza.<br />
Petrópolis: Vozes, 1984, p. 40).<br />
No <strong>Pasquim</strong>, Henfil encontrou espaço para apresentar <strong>de</strong> forma mais aberta sua<br />
“armadura” tanto contra as práticas políticas e econômicas do Regime, como<br />
jornalísticas e comportamentais. Ao convite <strong>de</strong> Sérgio Cabral que, como Jaguar,<br />
acreditava que o tipo <strong>de</strong> humor produzido por Henfil, humor porrada, se ajustava como<br />
uma luva ao perfil do <strong>Pasquim</strong>.<br />
A manifestação do humor como uma forma <strong>de</strong> oposição <strong>de</strong>ntro do período<br />
ditatorial brasileiro não se estabelece num caráter revolucionário, nem se apresenta<br />
como uma voz universal dos que não apoiavam o Regime. O jornal O <strong>Pasquim</strong>,<br />
principal referência do humor oposicionista, direcionava a sua produção a uma<br />
população boêmia, intelectualizada e <strong>de</strong> classe média do Rio <strong>de</strong> Janeiro, não<br />
representando uma força or<strong>de</strong>nada para a construção <strong>de</strong> uma nova hegemonia.