José Gomes Ferreira – A Poética do Canto e do Grito - Repositório ...
José Gomes Ferreira – A Poética do Canto e do Grito - Repositório ...
José Gomes Ferreira – A Poética do Canto e do Grito - Repositório ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Nestes poemas, <strong>José</strong> <strong>Gomes</strong> <strong>Ferreira</strong> confessa repulsa pelo reina<strong>do</strong> da lógica em<br />
favor da imaginação, <strong>do</strong>s sonhos, da fusão destes e da realidade numa outra realidade 98<br />
em que o sonho pre<strong>do</strong>minasse. Propõe uma fuga para o inconsciente e, com isso,<br />
pretenderia, como os surrealistas, anular a contradição entre sonho e realidade.<br />
Erigin<strong>do</strong> a revolta, a irreverência, a emancipação da imaginação como metas<br />
principais. Faz poética a vida e a sociedade, apelan<strong>do</strong> à subjectividade e à desregração<br />
da realidade objectiva 99 .<br />
2.4. CONGREGAÇÃO DAS VOZES NA CONFISSÃO DE UMA SÓ VOZ 100<br />
A construção <strong>do</strong> auto-retrato, concretizada nos três volumes <strong>do</strong> Poeta Militante,<br />
caracteriza-se pela forte relação dialógica 101 que se estabelece neste universo textual,<br />
98 “(…) Esta poesia de compromisso entre a realidade e o sonho, — to<strong>do</strong> aquele «enre<strong>do</strong> subterrâneo / de<br />
luas com raízes» (<strong>Ferreira</strong>, 1990a:314) que é o verdadeiro universo da poesia de <strong>José</strong> <strong>Gomes</strong> <strong>Ferreira</strong>”<br />
(Mourão-<strong>Ferreira</strong>, 1960:50).<br />
99<br />
“Podemos descobrir mais que um traço comum entre a poesia de <strong>José</strong> <strong>Gomes</strong> <strong>Ferreira</strong> e o<br />
Surrealismo. Saliente-se, em primeiro lugar, o esta<strong>do</strong> de euforia emocional, de alucinação que<br />
diríamos voluntária e próxima da alucinação mental, que constitui a atmosfera de quase to<strong>do</strong>s os<br />
poemas de <strong>José</strong> <strong>Gomes</strong> <strong>Ferreira</strong> (…) é o esta<strong>do</strong> quase de nevrose revela<strong>do</strong> por tal imagens que<br />
constitui o ideal da concessão poética para os Surrealista” (Nogueira, 1954:240).<br />
100<br />
“A voz <strong>do</strong> poeta que ecoa todas as outras vozes que interioriza: Pensai também que, entre todas as<br />
artes, a nossa é talvez aquela que congrega o maior número de especialidades ou de factores<br />
independentes: o som, o senti<strong>do</strong>, o real e o imaginário, a lógica a sintaxe e a dupla invenção <strong>do</strong><br />
fun<strong>do</strong> e da forma… <strong>–</strong> e tu<strong>do</strong> através desse meio essencialmente prático, perpetuamente altera<strong>do</strong>,<br />
mancha<strong>do</strong>, faze<strong>do</strong>r de to<strong>do</strong>s os ofícios, a linguagem comum, frente à qual a nossa tarefa é retirar<br />
uma Voz pura, ideal, capaz de comunicar sem fraquezas, sem esforço aparente, sem ferir a<br />
sensibilidade <strong>do</strong> ouvi<strong>do</strong> e sem romper a esfera instantânea <strong>do</strong> universo poético: uma ideia de algum<br />
eu maravilhosamente superior a Mim” (Valéry, 1995:90).<br />
Encruzilhadas de uma Escrita 105