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José Gomes Ferreira – A Poética do Canto e do Grito - Repositório ...

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estética, se não de uma poética: a recusa da poesia 135 - “Vai-te Poesia!” - e a sua<br />

substituição pelo grito. O poeta faz daquele verso o estribilho <strong>do</strong> seu poema, uma vez<br />

que considera a Poesia impeditiva da visão objectiva <strong>do</strong> real:<br />

Deixa-me ver friamente<br />

a realidade nua<br />

sem ninfas de iludir<br />

ou violinos de lua. (ibidem)<br />

Acusa-a de transformar o mun<strong>do</strong> frio e duro<br />

num céu de esquecer<br />

com mendigos de nuvens<br />

mendigos de estrelas (ibidem)<br />

enquanto o que reina é a <strong>do</strong>r e a fome 136 , e de ocultar o rosto “ [deste] planeta feito de<br />

carne humana a chorar”. Eis por que o poeta recusa a poesia. É que ele aqui a<br />

identificará com o canto dulcificante <strong>–</strong> “ninfas de iludir / ou violinos de lua”.<br />

135 Diz a respeito deste poema Ramos Rosa “(…) esta poesia contesta a sua herança, contesta-a<br />

permanentemente, e a tal ponto, que o seu mo<strong>do</strong> de ser, o seu fazer-se, se confunde com o desta<br />

contestação e com a sua própria auto contestação: «Vai-te, Poesia! /Deixa-me ver friamente / a<br />

realidade nua / sem ninfas de iludir / os violinos de lua». (Poesia <strong>–</strong> III, p.198)” (Rosa, 1971:84).<br />

136<br />

“A poesia de <strong>José</strong> <strong>Gomes</strong> <strong>Ferreira</strong> é uma permanente contestação <strong>do</strong> real ou, antes, da aparência a<br />

que chamamos realidade. Contestação da sua mecânica feroz, <strong>do</strong> seu artificialismo absur<strong>do</strong>, <strong>do</strong> seu<br />

não -senti<strong>do</strong>, da sua falta de imaginação. Daí que esta poesia se torne antilírica, uma poesia <strong>do</strong> não<br />

radical, um grito, mais <strong>do</strong> que um canto e, também, uma violenta auto -contestação” (Rosa, 1986:8).<br />

148 <strong>José</strong> <strong>Gomes</strong> <strong>Ferreira</strong>: a <strong>Poética</strong> <strong>do</strong> <strong>Canto</strong> e <strong>do</strong> <strong>Grito</strong>

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