José Gomes Ferreira – A Poética do Canto e do Grito - Repositório ...
José Gomes Ferreira – A Poética do Canto e do Grito - Repositório ...
José Gomes Ferreira – A Poética do Canto e do Grito - Repositório ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
O pior é que a solidão,<br />
como a Poesia,<br />
não lambe as mãos <strong>do</strong> <strong>do</strong>no.<br />
Morde (<strong>Ferreira</strong>, 1998:234) 123 .<br />
A Poesia morde, porque incomoda. Se assim é, o poeta procura a verdadeira Poesia:<br />
“E a Poesia? Onde estava a verdadeira Poesia?” (<strong>Ferreira</strong>, 1998:269).<br />
Ao confrontar-se com a ausência da Poesia, lamenta-se, “Pobre de mim”, e<br />
consciencializa-se da falência <strong>do</strong> seu acto: “tentar abrir e fechar as pedras e as palavras/<br />
com chave falsa”. O sujeito poético não encontra a Poesia verdadeira, pois não tem a<br />
chave certa, nem para abrir as pedras, como tinham o Ali Bábá e os quarenta ladrões<br />
(numa memória da pedra mágica da história das mil e um noites, Abre-te Sésamo, que<br />
permitiu o acesso a uma riqueza material), nem as palavras que permitem o acesso a<br />
uma riqueza espiritual proporcionada pela Poesia. As pedras, pela sua rudeza, também<br />
evocam o ofício desespera<strong>do</strong> <strong>do</strong>s poetas e a necessidade de poderes extraordinários<br />
para fazerem Poesia. Ao associar os termos “pedra” e “palavra” ao mun<strong>do</strong> poético<br />
exibe a dificuldade <strong>do</strong> acesso à Poesia <strong>–</strong> é tão difícil abrir pedra como é difícil abrir<br />
palavras, sobretu<strong>do</strong> se o instrumento não for o apropria<strong>do</strong> ou, pior, se for falso…Para<br />
entrar no mun<strong>do</strong> Poético é necessário conhecer o código. Será que estas<br />
condicionantes enfraquecem o poeta?<br />
123 No poema IV da série Maio <strong>–</strong> Abril, o poeta afirma : “a poesia também é opressão” (<strong>Ferreira</strong>,<br />
1998:303).<br />
Para a definição / construção <strong>do</strong> Poeta Militante 135