José Gomes Ferreira – A Poética do Canto e do Grito - Repositório ...
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da água que sempre alimentara o poder narrativo de seu pai e descobriu que esta<br />
entrava por uma torneira invisível através de um “processo demasia<strong>do</strong> complica<strong>do</strong> para<br />
explicar” (ibidem: 46). Encontrou Iff, o Génio da Água, que vinha <strong>do</strong> Mar das<br />
Correntes de Histórias, e pediu-lhe que o levasse até esse Mar. Ao chegar lá, Haroun<br />
reparou que havia muitas correntes de cor diferente que se entrelaçavam (cada fio era<br />
uma história), forman<strong>do</strong> uma tapeçaria líquida onde se encontravam as histórias<br />
inventadas e as histórias por inventar. A forma fluida determinava que as histórias<br />
gozassem da capacidade de mudar, de se transformarem em novas visões de si mesmas,<br />
de se combinarem originan<strong>do</strong> novas histórias. (…) “Assim, ao contrário de uma<br />
biblioteca de livros, o Mar das Correntes de Histórias era muito mais <strong>do</strong> que um<br />
depósito de histórias. Não era uma coisa morta, era uma coisa viva.” (Rushdie, 91:55)<br />
Foi esta bela imagem <strong>do</strong> Mar das Histórias, que evoca a criação como um processo<br />
complexo, em que a indefinição <strong>do</strong>s limites <strong>do</strong> mar e o emaranha<strong>do</strong> <strong>do</strong>s fios ilustram a<br />
origem das poéticas e a dificuldade de encontrar o ponto inaugural, o signo originário<br />
da obra, que transportamos para a nossa reflexão sobre <strong>José</strong> <strong>Gomes</strong> <strong>Ferreira</strong>. Embora<br />
conscientes de que o processo de criação é complexo e que muitos momentos de<br />
experimentação mental não chegam a ser regista<strong>do</strong>s, o esta<strong>do</strong> de permanente<br />
metamorfose ou transformação que caracteriza a criação coloca em discussão a própria<br />
noção de génese de ponto inaugural.<br />
Contu<strong>do</strong>, com <strong>José</strong> <strong>Gomes</strong> <strong>Ferreira</strong>, a nossa tarefa está facilitada, pois o autor<br />
marcou o seu (re) nascimento poético, com o poema Viver sempre também cansa,<br />
elegen<strong>do</strong>-o como porta de entrada oficial no mun<strong>do</strong> da poesia verdadeira.<br />
Universo da Criação <strong>Poética</strong> 47