Capítulo I - Repositório Institucional da UFSC
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considera<strong>da</strong> um membro <strong>da</strong> família, nem tampouco sua posição se nivelaria à <strong>da</strong><br />
baronesa e de sua afilha<strong>da</strong>. Como se percebe no trecho anterior e no trecho logo<br />
abaixo, Guiomar rispi<strong>da</strong>mente mostra à governanta qual lugar deveria ocupar e se<br />
manter, considerando a inferiori<strong>da</strong>de <strong>da</strong> mulher em relação à sua:<br />
100<br />
Olhou fria e longamente para a inglesa, com um desses olhares,<br />
que são, por assim dizer, um gesto <strong>da</strong> alma indigna<strong>da</strong>. O que a<br />
irritava não era a alusão, que não valia muito, era a pessoa que a<br />
fazia, – inferior e mercenária. Mrs. Oswald percebeu isto mesmo;<br />
mordeu a ponta do lábio, mas transigiu com a moça. 228<br />
Em outra passagem, mais à frente no romance, Guiomar já não atribui<br />
interesse próprio às atitudes de Mrs. Oswald, mas nem por isso mu<strong>da</strong> de opinião<br />
em relação à sua posição:<br />
Mrs. Oswald fez uma pausa para <strong>da</strong>r aberta ao protesto de<br />
Guiomar, mas Guiomar não protestou, quero dizer não protestou<br />
de viva voz; fez apenas um gesto negativo, bastante a satisfazer<br />
os melindres <strong>da</strong> inglesa. A moça foi sincera; não atribuía<br />
realmente a nenhum interesse vil, – pecuniário, – a ação de Mrs.<br />
Oswald. Nem por isso a absolvia, – não só porque ela viria<br />
concorrer talvez para uma crise penosa, mas também, – bom é<br />
notá-lo outra vez, – porque a condição <strong>da</strong> inglesa naquela casa<br />
era relativamente inferior. 229<br />
Entretanto, o próprio narrador informa as intenções de Mrs. Oswald:<br />
Interpôs-se para servir aos outros, e mais ain<strong>da</strong> a si própria. Viu a<br />
dificul<strong>da</strong>de, mas não desanimou; era preciso armar ao<br />
reconhecimento <strong>da</strong> baronesa. Por isso não hesitou em confiar a<br />
Guiomar o desejo <strong>da</strong> madrinha, exagerando-o, entretanto, –<br />
porque nunca a baronesa dissera que "tal casamento era a sua<br />
campanha", e Mrs. Oswald atribuiu-lhe esta frase mortal para<br />
to<strong>da</strong>s as esperanças e sonhos <strong>da</strong> moça. Mas, se falava<br />
demasiado ao pé de uma, era muito mais sóbria de palavras com<br />
a outra, e <strong>da</strong> exageração ou <strong>da</strong> atenuação <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>de resultara<br />
aquele perene estado de luta abafa<strong>da</strong>, de receios, de indecisão e<br />
de amarguras secretas. Convém dizer, para <strong>da</strong>r o último traço ao<br />
perfil, que esta Mrs. Oswald não seguia só a voz do seu interesse<br />
pessoal, mas também o impulso do próprio gênio, amigo de pôr à<br />
prova a natural sagaci<strong>da</strong>de, de tentar e levar a cabo uma destas<br />
operações delica<strong>da</strong>s e difíceis, de maneira que, se houvesse uma<br />
diplomacia doméstica, – ou se se criassem cargos para ela, Mrs.<br />
228 ASSIS, Machado de. A mão e a luva. 5ª ed. São Paulo: Ática, 1977, p. 40.<br />
229 Idem, p. 55.