08.05.2013 Views

Capítulo I - Repositório Institucional da UFSC

Capítulo I - Repositório Institucional da UFSC

Capítulo I - Repositório Institucional da UFSC

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

posição exigia. Seria possível, ain<strong>da</strong> sim, um arranjo perfeito para ambas as<br />

partes? Pode-se dizer que, em se tratando de interesses de um benfeitor em<br />

manter o domínio sobre o agregado, sim. Como veremos mais adiante, esse tipo<br />

de relação nas famílias até o século XIX funcionava como uma espécie de troca<br />

entre quem recebia e quem doava. E, mais que isso, essa relação, além de<br />

significar mais uma forma de domínio de uma classe sobre outra, podia trazer<br />

compensações futuras 217 . Já nas famílias pobres, tal prática de arrebanhar<br />

agregados não era comum. Conforme Franco nos esclarece, isso somente<br />

ocorreria se houvesse vantagens que compensassem o ônus de incorporar<br />

dependentes adicionais ao círculo familial 218 .<br />

Por esse trecho de Schwarz podemos compreender a disposição do<br />

ci<strong>da</strong>dão na socie<strong>da</strong>de quanto à sua situação financeira. Principalmente aquele<br />

ci<strong>da</strong>dão livre, mas nascido em um lar humilde:<br />

Não sendo proprietários nem escravos, estas personagens não<br />

formam entre os elementos básicos <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de, que lhes<br />

prepara uma situação ideológica desconcertante. O seu acesso<br />

aos bens <strong>da</strong> civilização, <strong>da</strong><strong>da</strong> a dimensão marginal do trabalho<br />

livre, se efetiva somente através <strong>da</strong> benevolência eventual e<br />

discricionária de indivíduos <strong>da</strong> classe abona<strong>da</strong>. Assim, se não<br />

alcançam alguma espécie de proteção, os homens pobres vivem<br />

ao deus-<strong>da</strong>rá, sobretudo cortados <strong>da</strong> esfera material e institucional<br />

do mundo contemporâneo. Este por sua vez, padronizado nos<br />

países clássicos <strong>da</strong> Revolução burguesa, é programaticamente<br />

contrário àquela mesma proteção que, no Brasil, é o bilhete de<br />

ingresso em seu recinto. 219<br />

Guiomar, que tivera humilde nascimento 220 , por um golpe do destino,<br />

recebe este bilhete. Um bilhete premiado que permite o acesso para uma nova<br />

217<br />

Veja-se sobre este assunto este trecho de Franco: “Para aquele que se encontra submetido ao<br />

domínio pessoal, inexistem marcas objetiva<strong>da</strong>s do sistema de constrições a que sua existência<br />

está confina<strong>da</strong>: seu mundo é formalmente livre. Não é possível a descoberta de que sua<br />

vontade está presa à do superior, pois o processo de sujeição tem lugar como se fosse natural<br />

e espontâneo. Anulam-se as possibili<strong>da</strong>des de autoconsciência, visto como se dissolvem na<br />

vi<strong>da</strong> social to<strong>da</strong>s as referências a partir <strong>da</strong>s quais ela poderia se constituir. Plenamente<br />

desenvolvi<strong>da</strong>, a dominação pessoal transforma aquele que a sofre numa criatura<br />

domestica<strong>da</strong>: proteção e benevolência lhe são concedi<strong>da</strong>s em troca de fideli<strong>da</strong>de e serviços<br />

reflexos‖. (FRANCO, Maria Sylvia de Carvalho. Homens livres na ordem escravocrata. 4ª ed.<br />

São Paulo: Fun<strong>da</strong>ção Editora <strong>da</strong> UNESP, 1997, p. 95).<br />

218<br />

FRANCO, Maria Sylvia de Carvalho. Homens livres na ordem escravocrata. 4ª ed. São Paulo:<br />

Fun<strong>da</strong>ção Editora <strong>da</strong> UNESP, 1997, p. 48.<br />

219<br />

SCHWARZ, Roberto. Um mestre na periferia do capitalismo: Machado de Assis. 4ª ed. São<br />

Paulo: Duas Ci<strong>da</strong>des, 2000, p. 88.<br />

220<br />

ASSIS, Machado de. A mão e a luva. 5ª ed. São Paulo: Ática, 1977.<br />

97

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!