Capítulo I - Repositório Institucional da UFSC
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já havia conquistado até ali e, de quebra, garantir um futuro de luzimento social:<br />
115<br />
(...) na simpatia pelas ambições rasteiras mais fortes; pelo apetite<br />
terreno e conformista de Guiomar – uma heroína de choque, sob<br />
medi<strong>da</strong> para o Brasil, <strong>da</strong> raça que o Romantismo não amoleceu e<br />
a tradição não intimidou. De fato, a moça – cujo ideal se resume<br />
em luzimento social, uma boa casa com bons móveis e um bom<br />
marido em boa posição – contrasta vantajosamente com as<br />
paixões chorosas de Estevão, e com a inércia de Jorge, o<br />
sobrinho <strong>da</strong> baronesa, que espera sentado pelos benefícios de<br />
seu sobrenome. 274<br />
Candido diz que o mais lhe atrai nos livros de Machado é o tema<br />
recorrente <strong>da</strong> transformação do homem em objeto do homem, que é uma <strong>da</strong>s<br />
maldições liga<strong>da</strong>s à falta de liber<strong>da</strong>de ver<strong>da</strong>deira, econômica e espiritual. Afirma<br />
também que há uma conotação ampla que visualiza o homem como devorador<br />
do homem. E que essa devoração geral e sur<strong>da</strong> tende a transformar o homem em<br />
instrumento do homem. Nessa perspectiva, a baronesa acaba servindo de<br />
instrumento para Guiomar passar de humilde órfã a esposa deseja<strong>da</strong> por na<strong>da</strong><br />
menos que três pretendentes. Esta, como boa estrategista, agarra com to<strong>da</strong> gana<br />
possível a oportuni<strong>da</strong>de que o dinheiro <strong>da</strong> madrinha lhe proporciona, não para se<br />
preparar para a profissão de normalista, mas, sim, aperfeiçoar-se para viver em<br />
um novo nível social. Tarefa cumpri<strong>da</strong> com esmero, pois revelara rapi<strong>da</strong>mente<br />
“plena harmonia de seus instintos com a socie<strong>da</strong>de em que entrara” 275 .<br />
Schwarz sugere – ain<strong>da</strong> que não a absolva – que Guiomar não se utiliza<br />
<strong>da</strong> madrinha como trampolim para obter fortuna, afinal, a moça desenvolveu um<br />
afeto espontâneo 276 pela sua protetora, e, por conseguinte, corresponde ao<br />
sentimento desta. A jovem “sacrificava tudo à dedicação filial de que já dera<br />
tantas provas” 277 . Dessa maneira, segundo Schwarz, quem corresponde está na<br />
esfera do recíproco e natural, inocentado <strong>da</strong> manipulação, própria de quem<br />
“usa” 278 .<br />
Com relação à opção de Guiomar em aproveitar a chance de se mol<strong>da</strong>r<br />
274<br />
SCHWARZ, Roberto. Ao Vencedor as Batatas: forma literária e processo social nos inícios do<br />
romance brasileiro. São Paulo: Duas Ci<strong>da</strong>des, 2000, p. 98.<br />
275<br />
ASSIS, Machado de. A mão e a luva. 5ª ed. São Paulo: Ática, 1977, p. 34.<br />
276<br />
Idem, p. 33.<br />
277<br />
Idem, p. 48.<br />
278<br />
SCHWARZ, Roberto. Ao Vencedor as Batatas: forma literária e processo social nos inícios do<br />
romance brasileiro. São Paulo: Duas Ci<strong>da</strong>des, 2000, p. 97.