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Capítulo I - Repositório Institucional da UFSC

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dramáticas se resolvem pela imolação voluntária dos protagonistas 193 . Para Lúcia<br />

não há outra possibili<strong>da</strong>de a não ser a renúncia à vi<strong>da</strong>, já que seu arrependimento<br />

não é suficiente para sua completa regeneração, pois aos olhos dos ci<strong>da</strong>dãos<br />

distintos <strong>da</strong> Corte ela seria sempre uma mulher perdi<strong>da</strong>, à margem <strong>da</strong><br />

socie<strong>da</strong>de 194 . Nem sua situação econômica privilegia<strong>da</strong> consegue lhe abrir portas<br />

e “apagar” a mancha de sua existência devassa. Defoe, ain<strong>da</strong> que com o mesmo<br />

objetivo moralizador, haveria de ser bem menos impiedoso com sua Moll<br />

Flanders. O autor acaba por conceder um marido para sua heroína, mesmo<br />

depois de Moll Flanders ter cometido os mais variados atos ilícitos. Além de<br />

bonificá-la com uma boa situação financeira, assegurando, assim, sua<br />

reintegração social 195 .<br />

Já para Lúcia e Margari<strong>da</strong> não há misericórdia e nem um modo de se<br />

reintegrarem à socie<strong>da</strong>de lhes é proposto. Resta-lhes, a partir do momento em<br />

que amam de ver<strong>da</strong>de, apenas o arrependimento e a expiação de seus passados.<br />

193 Para esse assunto ver BOSI, Alfredo. Um mito sacrificial: o Indianismo de Alencar. In: Dialética<br />

<strong>da</strong> colonização. São Paulo: Companhia <strong>da</strong>s Letras, 1992. O autor afirma que o único modo dos<br />

fracos obterem nobreza é se estes vierem a sacrificar suas vi<strong>da</strong>s.<br />

194 Embora transgri<strong>da</strong> to<strong>da</strong>s as regras <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de, é mostrado para Carolina de As Asas de um<br />

Anjo que há um caminho possível para sua regeneração e reintegração na socie<strong>da</strong>de – o<br />

arrependimento:<br />

LUÍS – Todos nós, Carolina, homens ou mulheres, velhos ou moços, todos, sem exceção,<br />

temos faltas em nossa vi<strong>da</strong>; todos estamos sujeitos a cometer um erro e a praticar uma ação<br />

má. Uns, porém, cegam-se ao ponto de não verem o caminho que seguem: outros se<br />

arrependem a tempo. Para estes o mal não é senão um exemplo e uma lição: ensina a apreciar<br />

a virtude que se desprezou em um momento de desvario. Estes merecem, não só o perdão,<br />

porém muitas vezes a admiração que excita a sua coragem.<br />

CAROLINA – Não, Luís; há faltas que a socie<strong>da</strong>de não perdoa e que o mundo não esquece<br />

nunca. A minha é uma destas.<br />

LUÍS – Está engana<strong>da</strong>, Carolina. Se uma moça que, leva<strong>da</strong> pelo seu primeiro amor, ignorando<br />

o mal, esqueceu um instante os seus deveres, volta arrependi<strong>da</strong> à casa paterna; se encontra<br />

no coração de sua mãe, na amizade de seu pai, nas afeições dos seus, a mesma ternura; se<br />

ela continua a sua existência doce e tranqüila no seio <strong>da</strong> família; por que a socie<strong>da</strong>de não lhe<br />

perdoará, quando Deus lhe perdoa, <strong>da</strong>ndo-lhe a felici<strong>da</strong>de?<br />

CAROLINA – Nunca ela poderá ser feliz! A sua vi<strong>da</strong> será uma triste expiação.<br />

LUÍS – Ao contrário, será uma regeneração. Em vez <strong>da</strong> paixão criminosa que a rouba a seus<br />

pais, ela pode achar no seio de sua família o amor calmo que purifique o passado e lhe faça<br />

esquecer a sua falta. (ATO SEGUNDO – Cena VI)<br />

195 Conforme De Marco, o autor de Moll Flanders organiza a narrativa de modo a deixar claro que<br />

o “final feliz” se dá mediante a dedicação ao trabalho <strong>da</strong> personagem. E, que sua recuperação<br />

está diretamente liga<strong>da</strong> à sua integração no trabalho produtivo. (DE MARCO, Valéria. O<br />

Império <strong>da</strong> cortesã: Lucíola, um perfil de Alencar. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 1986). Moll<br />

Flanders, assim como Lúcia, se arrepende de seus pecados, mas seu arrependimento provém<br />

de seu pavor diante <strong>da</strong> possibili<strong>da</strong>de de receber a pena de morte: “Senti então, pela primeira<br />

vez, um sinal ver<strong>da</strong>deiro de arrependimento. Foi com horror que comecei a recor<strong>da</strong>r minha vi<strong>da</strong><br />

passa<strong>da</strong>. Agora, com a perspectiva <strong>da</strong> morte, as coisas desta vi<strong>da</strong>, como deve acontecer a<br />

qualquer um em semelhante situação, tomaram um aspecto diferente do que tinham antes”.<br />

(DEFOE, Daniel. Moll Flanders. São Paulo: Ed. Abril, 1971, p. 310).<br />

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