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Capítulo I - Repositório Institucional da UFSC

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tratava de passeios noturnos, para a i<strong>da</strong> a festas, saraus, teatros. Não era de<br />

bom-tom tal atitude, não condizia com o portar-se de uma moça de família. Se<br />

porventura alguma mulher fosse vista só em algum desses eventos, praticamente<br />

já era marginaliza<strong>da</strong> diante <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de. Mas, conforme esclarece Hahner, esse<br />

estereótipo <strong>da</strong> mulher reclusa não era para to<strong>da</strong>s: o real comportamento variava<br />

de acordo com a classe. Enquanto para a mulher de elite era prudente a proteção<br />

do lar para afastá-las de presumíveis perigos de sedução ou assédio sexual, para<br />

a mulher livre e pobre a rua era seu ambiente de trabalho, portanto na<strong>da</strong> mais<br />

natural que sua presença constante 165 .<br />

Embora Lúcia estivesse em um evento religioso, a Festa <strong>da</strong> Glória 166 , o<br />

fato de estar só já denuncia sua condição. Se sua aparência e seu modo de vestir<br />

lhe confere a imagem de mulher de socie<strong>da</strong>de, jamais deveria estar<br />

desacompanha<strong>da</strong>. Sá chega a questionar o ver<strong>da</strong>deiro motivo de sua presença<br />

ali, duvi<strong>da</strong>ndo <strong>da</strong> possível religiosi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> moça e sugerindo que ela na reali<strong>da</strong>de<br />

havia marcado um encontro naquele local. Dificilmente adivinharia ele que na<br />

reali<strong>da</strong>de Lúcia estava ali para render homenagens em devoção à Nossa Senhora<br />

<strong>da</strong> Glória, uma vez que seu ver<strong>da</strong>deiro nome de batismo era Maria <strong>da</strong> Glória: “– É<br />

meu nome. Foi Nossa Senhora, minha madrinha, quem mo deu. Nasci a 15 de<br />

agosto. Por isso todos os anos vou levar-lhe um trabalho de minhas mãos, e<br />

pedir-lhe que me perdoe” 167 .<br />

Já devi<strong>da</strong>mente informado por Sá <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>deira profissão de Lúcia, Paulo<br />

ain<strong>da</strong> assim continua como que descrente de que aquela jovem que está a sua<br />

frente seja impura e pertença a tão baixa qualificação. Tanto que continuou<br />

165 HAHNER, June Edith. Emancipação do sexo feminino: a luta pelos direitos <strong>da</strong> mulher no Brasil,<br />

1850 – 1940. Florianópolis: Ed. Mulheres; Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2003.<br />

166 Para exemplo meramente ilustrativo citamos um trecho de Mendonça sobre esta festa: ―A de<br />

N.S. <strong>da</strong> Glória do Outeiro era a mais granfina <strong>da</strong>s festas religiosas, pois ao povo se unia a nata<br />

<strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de local e a própria Família Imperial comparecia ‗au grand complet‘ e concorria para<br />

o culto com dádivas preciosas. No tempo de D. Pedro I essas festas ficaram consagra<strong>da</strong>s pelo<br />

mais alto esplendor de luxo, nos trajes, nas alfaias, na apresentação. Havia grandes conjuntos<br />

corais e famosos solistas cantores. As princesas, as condessas, as baronesas competiam em<br />

elegância e em fausto, oferecendo também às imagens, jóias magníficas, que iriam brilhar ao<br />

luzir <strong>da</strong>s arandelas e dos globos transparentes. E as classes populares, as mais humildes,<br />

onde a pele negra dos escravos punha um estranho brilho de ébano polido, desfilavam na sua<br />

vestimenta dos grandes dias, os pés descalços, ostentando nas rudes mãos as tochas votivas<br />

e os estan<strong>da</strong>rtes comemorativos”. (MENDONÇA, Ana Amélia Q. C. de. Festas Populares do<br />

Rio antigo. {Revista O Cruzeiro}, Edição Comemorativa do IV Centenário, 1965).<br />

167 ALENCAR, José de. Lucíola: um perfil de mulher. 7ª ed. São Paulo: Edições Melhoramentos,<br />

[s/d], p. 176.<br />

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