Artigos do 18° COLE publicados na revista LTP - 9ª parte
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O LUGAR DA LITERATURA JUVENIL: ENTRE A INDÚSTRIA CULTURAL E OS PROBLEMAS DE GÊNERO E MODO<br />
1. Introdução: Sobre a literatura<br />
Falar em literatura é mexer em um terreno arenoso e complexo.<br />
Tal complexidade se manifesta em obras das mais diferentes. A<br />
leitura <strong>do</strong> texto literário abre um espaço de debate para o leitor,<br />
levan<strong>do</strong>-o a pensar consigo mesmo sobre o seu mun<strong>do</strong> e o seu<br />
lugar neste mun<strong>do</strong>. A importância de um texto literário está além<br />
de um momento de prazer e relaxamento, pois sua existência<br />
cultural faz com que o sujeito passe a questio<strong>na</strong>r os não ditos e<br />
a duvidar das coisas que se encontram prontas e acabadas. Para<br />
Candi<strong>do</strong> (1995), a literatura tem uma função humaniza<strong>do</strong>ra que<br />
possibilita ao homem a refl exão sobre o seu estar no mun<strong>do</strong>.<br />
Desde sempre, o papel da literatura e da leitura foram<br />
sustenta<strong>do</strong>s pelo contato com a imagi<strong>na</strong>ção e com a realidade<br />
recriada nos textos. Este contato tor<strong>na</strong> a literatura um alicerce para<br />
o equilíbrio psíquico em uma sociedade que ainda se encontra em<br />
processo de auto-reconhecimento. Segun<strong>do</strong> Candi<strong>do</strong> (1985, p. 53),<br />
a arte, e portanto a literatura, é uma transposição<br />
<strong>do</strong> real para o ilusório por meio de uma estilização<br />
formal, que propõe um tipo arbitrário de ordem para as<br />
coisas, os seres, os sentimentos. Nela se combi<strong>na</strong>m um<br />
elemento de manipulação técnica, indispensável à sua<br />
confi guração, e implican<strong>do</strong> uma atitude de gratuidade.<br />
Gratuidade tanto <strong>do</strong> cria<strong>do</strong>r, no momento de conceber<br />
e executar, quanto <strong>do</strong> receptor, no momento de sentir e<br />
apreciar.<br />
Candi<strong>do</strong> (1985), Escarpit (1969), Eagleton (1997),<br />
Compagnon (2001) compartilham o conceito de gratuidade da<br />
arte e, por extensão, da literatura. A gratuidade estaria ligada<br />
à produção representativa ou transfi gurada de uma sociedade<br />
ou de um contexto, das pessoas, de valores, para que o leitor<br />
pudesse, de algum mo<strong>do</strong>, (re) ver-se no escrito e no li<strong>do</strong>.<br />
Candi<strong>do</strong> (1995, p. 243) considera a literatura como uma<br />
necessidade universal <strong>do</strong> homem e, portanto, um direito. Para ele,<br />
... assim como não é possível haver equilíbrio psíquico<br />
sem o sonho durante o sono, talvez não haja equilíbrio<br />
social sem a literatura. Deste mo<strong>do</strong>, ela é fator<br />
LEITURA: TEORIA & PRÁTICA (SUPLEMENTO), n.58, jun.2012<br />
indispensável de humanização e, sen<strong>do</strong> assim, confi rma<br />
o homem <strong>na</strong> sua humanidade, inclusive porque atua em<br />
grande <strong>parte</strong> no subconsciente e no inconsciente. Neste<br />
senti<strong>do</strong>, ela pode ter importância equivalente à das<br />
formas conscientes de inculcamento intencio<strong>na</strong>l, como<br />
a educação familiar, grupal ou escolar. Cada sociedade<br />
cria as suas manifestações fi ccio<strong>na</strong>is, poéticas e<br />
dramáticas de acor<strong>do</strong> com os seus impulsos, as suas<br />
crenças, os seus sentimentos, as suas normas, a fi m de<br />
fortalecer em cada um a presença e atuação deles.<br />
No caso da literatura produzida para jovens, a gratuidade,<br />
a literatura enquanto necessidade huma<strong>na</strong> e representação<br />
transfi gurada de uma sociedade, não vem sozinha, pois é somada<br />
à fi ccio<strong>na</strong>lidade e à exemplaridade. Esses três elementos juntos<br />
são importantes para que possamos entender o que se produz, o<br />
que circula no merca<strong>do</strong> editorial para jovens e, principalmente,<br />
o que o jovem lê.<br />
Em relação ao merca<strong>do</strong>, este sempre existiu e a literatura,<br />
portanto, sempre esteve relacio<strong>na</strong>da com o comércio e o<br />
dinheiro; a única diferença é que houve uma expansão das<br />
relações de merca<strong>do</strong> com a impressão <strong>do</strong> livro e os avanços das<br />
produções técnicas (WELLERSHOFF, 1970).<br />
Segun<strong>do</strong> Escarpit (1974), podemos considerar a literatura<br />
como organização mercantil, pois, enquanto tal, compreende<br />
uma produção, um merca<strong>do</strong> e um consumo. Seu produtor é<br />
o editor, aquele que fabrica e coloca o livro à venda. Desse<br />
mo<strong>do</strong>, o produto literário, a obra em si, é resulta<strong>do</strong> de uma<br />
série de fi ltros sociais, econômicos e culturais que agem sobre<br />
os projetos <strong>do</strong>s escritores. O produtor compra textos que serão<br />
aceitos pelo merca<strong>do</strong>, tentan<strong>do</strong>, muitas vezes, melhorá-los<br />
com seus “conselhos”. Seu objetivo é somente a venda <strong>do</strong><br />
produto.<br />
Pensan<strong>do</strong> nesta existência cultural, passamos ao nosso<br />
próximo tópico para tratarmos da indústria cultural e da<br />
produção de bens simbólicos. Tal discussão se aplica ao<br />
conceito de juventude que foi “engoli<strong>do</strong>” pelo merca<strong>do</strong> e<br />
transforma<strong>do</strong> em estilo de vida. Entender o funcio<strong>na</strong>mento da<br />
indústria cultural nos permite a<strong>na</strong>lisar a produção literária para<br />
jovens, seus recursos, suas intenções e sua abrangência.<br />
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