Artigos do 18° COLE publicados na revista LTP - 9ª parte
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PROCESSOS INFERENCIAIS EM ATIVIDADES ESCOLARES DE LEITURA E O (RE)CONHECIMENTO DA VOZ DO ALUNO-LEITOR<br />
Introdução<br />
Em seu artigo “Em terra de sur<strong>do</strong>s-mu<strong>do</strong>s – um estu<strong>do</strong><br />
sobre as condições de produção de textos escolares”, retoma<strong>do</strong><br />
por muitos que desejam entender os processos de signifi cação<br />
desenvolvi<strong>do</strong>s dentro da sala de aula, Percival Brito (1983) nos<br />
revela o caráter fortemente institucio<strong>na</strong>liza<strong>do</strong> das interações<br />
desenvolvidas no espaço escolar. Ao investigar problemas<br />
de produção textual <strong>do</strong>s alunos, o autor nos mostra que, ao<br />
contrário <strong>do</strong> que se pensava, tais problemas não se relacio<strong>na</strong>m<br />
a uma possível falta de interlocutor – que impediria a escrita de<br />
um texto com foco em quem vai lê-lo -, mas sim pela opressora<br />
presença de um interlocutor altamente institucio<strong>na</strong>liza<strong>do</strong> e<br />
representa<strong>do</strong> pela fi gura <strong>do</strong> professor.<br />
Dessa maneira, o professor deixaria de se apresentar<br />
como alguém com quem o aluno interagiria em sala de aula<br />
para assumir o papel de representante da instituição escolar,<br />
corporifi can<strong>do</strong> suas regras e normas de conduta e sen<strong>do</strong> o<br />
agente regula<strong>do</strong>r dessa interação, indican<strong>do</strong> os signifi ca<strong>do</strong>s que<br />
seriam ou não aceitos neste espaço. O aluno também deixa de<br />
ser sujeito nesta interação, pois, ao invés de se colocar como<br />
alguém que tem algo importante a dizer e que merece ser<br />
ouvi<strong>do</strong>, passa a se construir como alguém que deve buscar o<br />
acerto e atender o que se espera dele.<br />
Partin<strong>do</strong> da proposta apresentada por Brito (1983),<br />
Gerhardt (2006) busca, então, no aporte teórico sociocognitivo<br />
a compreensão dessa interação, no que diz respeito à construção<br />
de signifi ca<strong>do</strong>s pelos alunos ao responderem às tarefas escolares.<br />
Com base nos estu<strong>do</strong>s em cognição que entendem a construção<br />
da linguagem e <strong>do</strong> pensamento como um processo efetua<strong>do</strong><br />
interativamente, a autora chega à conclusão de que a tarefa<br />
escolar, de forma geral, busca “preparar” e “educar” o aluno,<br />
que se despersonifi ca, para que estruturem seu comportamento<br />
com o objetivo de atender às expectativas da escola.<br />
Dessa forma, a autora nos leva a refl etir sobre o que seria<br />
a avaliação escolar, entenden<strong>do</strong> que, em verdade, toda tarefa<br />
escolar atua <strong>na</strong> construção da cognição <strong>do</strong> aluno, que, por<br />
2 - A produção da dissertação contou com apoio <strong>do</strong> CNPq, de março de 2011 a fevereiro de 2012.<br />
LEITURA: TEORIA & PRÁTICA (SUPLEMENTO), n.58, jun.2012<br />
meio de sua realização, acaba por incorporar as normas de<br />
comportamento defi nidas pela instituição escolar. Assim, acaba<br />
questio<strong>na</strong>n<strong>do</strong> as condições de validação dessas tarefas, uma vez<br />
que elas estariam avalian<strong>do</strong> não a aquisição de informações, mas<br />
sim a adaptação a um esquema que dá ao aluno a oportunidade<br />
de conseguir notas altas e aprovação:<br />
Nesse questio<strong>na</strong>mento, com base no que temos dito, é<br />
possível supor que as noções de “certo” e “erra<strong>do</strong>” podem<br />
estar intimamente vinculadas a (...) se o aluno sabe o que a<br />
escola espera que ele saiba e não se ele consegue relacio<strong>na</strong>r<br />
e expressar conceitos. E, quanto a isso, podemos também<br />
conjeturar em que medida esses saberes são justamente os<br />
relacio<strong>na</strong><strong>do</strong>s a uma elite sociocultural, e autoriza<strong>do</strong>s pela<br />
escola. (Gerhardt, 2006, p 1200).<br />
Com base <strong>na</strong>s postulações apresentadas por Gerhardt<br />
(2006), este artigo visa, então, a a<strong>na</strong>lisar as respostas dadas por<br />
alunos <strong>do</strong> 9o ano <strong>do</strong> ensino fundamental a questões de leitura<br />
apresentadas em um livro didático (LD) de Língua Portuguesa<br />
em contraposição ao que o gabarito <strong>do</strong> livro apresenta como<br />
resposta correta. Assim, apresentamos uma peque<strong>na</strong> <strong>parte</strong><br />
<strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s de uma pesquisa de dissertação 2 que buscava<br />
entender o comportamento cognitivo <strong>do</strong>s estudantes ao<br />
responderem às questões de leitura e comparar o que os alunos<br />
fi zeram ao que o LD esperava que eles fi zessem. Seu foco está<br />
no processo de geração de inferências em leitura por <strong>parte</strong> <strong>do</strong>s<br />
alunos, com base <strong>na</strong>s Ciências da Cognição, especifi camente a<br />
Psicolinguística e a Linguística Cognitiva.<br />
Iniciamos, então, este texto problematizan<strong>do</strong> o papel <strong>do</strong> LD<br />
<strong>na</strong>s interações desenvolvidas em sala de aula e apresentan<strong>do</strong><br />
a defi nição de inferência e a compreensão de como se dão os<br />
processos inferenciais <strong>na</strong> mente <strong>do</strong> leitor, sob essa perspectiva<br />
teórica. Em seguida, apresentaremos as questões selecio<strong>na</strong>das<br />
para a aplicação com os estudantes, bem como o texto que as<br />
motivou, e a sistematização das respostas dadas, de forma a<br />
entender os processos desenvolvi<strong>do</strong>s pelos alunos e avaliar em<br />
que medida o LD atua <strong>na</strong> validação desses processos.<br />
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