12.09.2017 Views

Revista Elas por elas 2014

A revista sobre gênero Elas por Elas foi criada, em 2007, com o objetivo de dar voz às mulheres e incentivar a luta pela emancipação feminina. A revista enfatiza as questões de gênero e todos os temas que perpassam por esse viés. Elas por Elas traz reportagens sobre mulheres que vivenciam histórias de superação e incentivam outras a serem protagonistas das mudanças, num processo de transformação da sociedade. A revista aborda temas políticos, comportamentais, históricos, culturais, ambientais, literatura, educação, entre outros, para reflexão sobre a história de luta de mulheres que vivem realidades diversas.

A revista sobre gênero Elas por Elas foi criada, em 2007, com o objetivo de dar voz às mulheres e incentivar a luta pela emancipação feminina. A revista enfatiza as questões de gênero e todos os temas que perpassam por esse viés. Elas por Elas traz reportagens sobre mulheres que vivenciam histórias de superação e incentivam outras a serem protagonistas das mudanças, num processo de transformação da sociedade. A revista aborda temas políticos, comportamentais, históricos, culturais, ambientais, literatura, educação, entre outros, para reflexão sobre a história de luta de mulheres que vivem realidades diversas.

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

uma condição social. Mesmo assim, eu<br />

tenho muita esperança, principalmente<br />

nessas meninas que têm muita vontade<br />

de estudar e trabalhar para mudar essa<br />

realidade. As mulheres têm o desejo e<br />

a iniciativa de ver as coisas melhores.<br />

E isso é um dos motivos que me fazem<br />

ter muito orgulho de ter vindo desse<br />

povo”, analisa Shirlene.<br />

São muitas as funções das mulheres<br />

na comunidade do Açude. Cuidam das<br />

crianças, da casa, de tudo um pouco.<br />

Muitas trabalham como diaristas, cozinheiras,<br />

camareiras e guias de turismo<br />

nas pousadas da Serra do Cipó.<br />

Plantam, colhem, cuidam dos animais.<br />

Em geral, são as mulheres que executam<br />

todas essas tarefas.<br />

Rita Sabino enfatiza a im<strong>por</strong>tância<br />

da educação dentro e fora de casa.<br />

“Meu sonho é ver essa meninada estudada,<br />

tendo mais o<strong>por</strong>tunidade que a<br />

gente, mas sem abandonar a comunidade<br />

e esquecer as origens, lembrando<br />

sempre do que nós ensinamos. Essa<br />

geração tem muitas possibilidades. A<br />

educação que a minha mãe (Dona<br />

Mercês) nos deu foi uma mistura de<br />

disciplina e amor. Eu só tenho a agradecer.<br />

Aqui, a educação fica <strong>por</strong> conta<br />

das mulheres. Os homens são muito<br />

bons pra nós, mas são pouco comunicativos.<br />

Nós somos a força dessa comunidade.<br />

Isso já é uma tradição. Penso<br />

que vai continuar assim, com as mulheres<br />

no comando. O ensino sobre as<br />

coisas certas começa dentro de casa e<br />

deve continuar na escola. O mais im<strong>por</strong>tante<br />

é o caráter e o respeito”.<br />

Mulheres negras no comando<br />

Hoje, a história é um pouco diferente.<br />

A criminalidade e o êxodo rural<br />

fizeram com que a quantidade de homens<br />

fosse reduzida de maneira significante.<br />

Mas não é só <strong>por</strong> uma questão<br />

de números que <strong>elas</strong> são protagonistas.<br />

De acordo com o historiador Pablo<br />

Matos Camargos, que trabalhou no<br />

projeto Quilombos Gerais, coordenado<br />

pelo Centro de Documentação Eloy<br />

Ferreira da Silva (Cedefes), em boa<br />

parte das comunidades, as mulheres<br />

são maioria e ocupam lugares de destaque.<br />

Ele visitou mais de cem comunidades<br />

remanescentes de quilombolas<br />

em Minas Gerais. “Em todos os aspectos,<br />

até mesmo <strong>por</strong> causa de uma<br />

tradição africana matriarcal, a mulher<br />

é muito ativa, mas não existe a institucionalização<br />

dessa liderança. Os homens<br />

é que participam das instâncias decisórias.<br />

O tempo inteiro <strong>elas</strong> sofrem o<br />

preconceito de gênero, social e de raça.<br />

E a pobreza e o isolamento são entraves<br />

para o avanço social”.<br />

Para o pesquisador, a parte mais<br />

im<strong>por</strong>tante do projeto foi levantar a<br />

questão do direito à terra. “Resolvendo<br />

isso o restante terá mais condições de<br />

ser solucionado. Em alguns casos, o<br />

próprio estado se apropriou das terras<br />

quilombolas. Além disso, a grilagem e<br />

a iniciativa privada tomaram conta do<br />

resto. E nessa luta pela conquista do<br />

território tem muita mulher envolvida”,<br />

enfatiza Pablo Matos.<br />

Estatísticas da Federação Quilombola<br />

de Minas Gerais apontam que hoje<br />

existam 500 comunidades no estado.<br />

A entidade foi criada em 2005 com o<br />

intuito de respaldar as demandas das<br />

comunidades. Sandra Maria da Silva é<br />

a presidente da Federação. Ela é moradora<br />

da comunidade Carrapatos de<br />

Tabatinga, em Bom Despacho. Um<br />

exemplo de força e determinação.<br />

“A minha mãe é a nossa referência.<br />

Eu só estou aqui nessa Federação <strong>por</strong><br />

causa dela. Ela tem 80 anos e está<br />

mais forte do que eu. Tem uma força<br />

excepcional. Sempre foi uma militante<br />

pelos nossos direitos e fez isso sem nenhuma<br />

instituição <strong>por</strong> trás. Ela é a mãe<br />

Tiana. Uma amostra da resistência e<br />

do pensamento coletivo das mulheres<br />

negras”.<br />

A presidente reclama da invasão<br />

urbana sofrida nas comunidades. “Ser<br />

uma mulher quilombola, hoje, é ser<br />

tudo. Mãe, filha, trabalhadora e educadora<br />

no nosso lar. Antigamente, vivíamos<br />

da agricultura e pecuária de subsistência,<br />

fora da realidade das cidades. Não tínhamos<br />

saúde e educação, mas tígurou<br />

aos quilombolas o direito às terras<br />

em que vivem, e o decreto nº 4887, de 20<br />

de novembro de 2003, ofi cializa o procedimento<br />

para identificação, reconhecimento,<br />

delimitação, demarcação e titulação<br />

dos territórios ocupados.<br />

Dados da Fundação Cultural Palmares<br />

mostram que em 2010 existiam 1.170 comunidades<br />

quilombolas certificadas e mais<br />

3.524 em uma fila de espera, espalhadas<br />

<strong>por</strong> todas as regiões do Brasil, com uma<br />

população estimada em mais de 2,5 milhões<br />

de descendentes de escravos. Porém,<br />

o movimento negro estima que esse número<br />

de comunidades remanescentes<br />

deve ultrapassar os 5.500.<br />

Historicamente, nos quilombos brasileiros<br />

havia uma desigualdade em relação<br />

ao número entre homens e mulheres. Isso<br />

acontecia devido ao processo de chegada<br />

dos escravos trazidos da África, que na<br />

maioria eram homens. Essa despro<strong>por</strong>ção<br />

refletiu na população quilombola durante<br />

o período colonial, em que se calculava<br />

que para cada mulher havia três ou mais<br />

homens.<br />

Algumas pesquisas apontam que<br />

ocorria nesses quilombos a prática da<br />

poliandria, fenômeno cultural no qual<br />

uma mulher se relaciona com mais de<br />

um homem, sem que haja conflito. Uma<br />

tradição matriarcal vinda de tribos africanas.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Elas</strong> <strong>por</strong> <strong>Elas</strong> - março <strong>2014</strong> 41

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!