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Revista Elas por elas 2014

A revista sobre gênero Elas por Elas foi criada, em 2007, com o objetivo de dar voz às mulheres e incentivar a luta pela emancipação feminina. A revista enfatiza as questões de gênero e todos os temas que perpassam por esse viés. Elas por Elas traz reportagens sobre mulheres que vivenciam histórias de superação e incentivam outras a serem protagonistas das mudanças, num processo de transformação da sociedade. A revista aborda temas políticos, comportamentais, históricos, culturais, ambientais, literatura, educação, entre outros, para reflexão sobre a história de luta de mulheres que vivem realidades diversas.

A revista sobre gênero Elas por Elas foi criada, em 2007, com o objetivo de dar voz às mulheres e incentivar a luta pela emancipação feminina. A revista enfatiza as questões de gênero e todos os temas que perpassam por esse viés. Elas por Elas traz reportagens sobre mulheres que vivenciam histórias de superação e incentivam outras a serem protagonistas das mudanças, num processo de transformação da sociedade. A revista aborda temas políticos, comportamentais, históricos, culturais, ambientais, literatura, educação, entre outros, para reflexão sobre a história de luta de mulheres que vivem realidades diversas.

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ENTREVISTA<br />

Núbia Campos<br />

“Continuamos,<br />

eu e minha namorada,<br />

na resistência”<br />

A advogada Núbia (à esquerda) e a companheira Lie<br />

<strong>Elas</strong> <strong>por</strong> <strong>Elas</strong> - Você já vivenciou<br />

algum caso de violência ou<br />

discriminação pelo fato de ser<br />

lésbica?<br />

Núbia Campos - Já sofri inúmeras<br />

vezes discriminação pelo fato de me<br />

relacionar com mulheres. Fisicamente,<br />

nunca fui agredida, felizmente. Mas a<br />

violência psicológica foi muito grande<br />

<strong>por</strong> parte de ex-amigos de infância, religiosos,<br />

bem como <strong>por</strong> alguns integrantes<br />

da minha família, que abominaram<br />

minha conduta de muitas formas<br />

diferentes. Há muitas formas de discriminação<br />

<strong>por</strong> causa da expressão da sexualidade<br />

e todas <strong>elas</strong> causam sofrimento.<br />

Continuamos, contudo, eu e<br />

minha namorada, na resistência. O<br />

problema das pessoas lidarem com o<br />

meu relacionamento deve ser tratado<br />

Arquivo pessoal<br />

<strong>por</strong> <strong>elas</strong> internamente, não posso me<br />

privar de viver e me expressar <strong>por</strong><br />

causa d<strong>elas</strong>. Sobre o medo, sim, existe,<br />

mas no meu caso não impede que expressemos<br />

em público o afeto. O que<br />

de fato ocorre é que quem está ligada<br />

na militância sabe quais são os lugares<br />

que são menos seguros e você acaba<br />

evitando. Há grupos fascistas organizados<br />

que ainda hoje matam homossexuais<br />

e transexuais, espancando-os.<br />

Isso causa-nos medo sim, e nas nossas<br />

famílias, mas nada podemos fazer a<br />

não ser lutar, vamos resistir, não vamos<br />

nos curvar.<br />

Casos de lesbofobia têm sido<br />

frequentes, na sua opinião?<br />

Os casos de lesbofobia são muito<br />

frequentes, assim como a homofobia,<br />

com homens homossexuais, e a transfobia.<br />

Os motivos da intolerância das<br />

pessoas são crenças culturais e muitas<br />

vezes religiosas. Há verdades “imutáveis”<br />

que, se feridas, causarão abominação.<br />

Ocorre que as pessoas são criadas com<br />

uma visão de “normalidade” e as condutas<br />

que fogem da heterossexualidade<br />

e monogamia são rapidamente tidas<br />

como “anormais”. Isso gera, socialmente,<br />

uma postura de intolerância, que têm<br />

níveis diferentes. Há pessoas que conseguem<br />

ter uma lésbica como amiga,<br />

mas não “aceitariam” se fosse sua filha;<br />

outras não conseguem visualizar duas<br />

mulheres de mãos dadas na rua; <strong>por</strong><br />

fim, há pessoas que chegam a violentar<br />

fisicamente a lésbica <strong>por</strong> causa de sua<br />

conduta, bem como homens, machistas,<br />

que adotam o estupro corretivo de lésbicas<br />

como conduta a ser seguida nestes<br />

casos. Tal intolerância é fruto de diversos<br />

mecanismos sociais, em minha visão,<br />

de grupos determinados que desejam<br />

manter o status quo social, com propósitos<br />

específicos. A família tradicional<br />

monogâmica, que tanto os fundamentalistas<br />

religiosos defendem no Congresso<br />

Nacional, e que também continua a escravizar<br />

a mulher perante o marido e a<br />

família, serve a propósitos determinados<br />

dentro de um sistema capitalista. Outras<br />

possíveis configurações e formas de se<br />

relacionar desafiam gravemente este<br />

modelo. Ou seja, para mim e para<br />

muitos que estão no movimento, a luta<br />

pela liberdade sexual está inserida na<br />

luta da liberdade social, com uma crítica<br />

mais aprofundada, uma vez que a discriminação<br />

homofóbica, assim como<br />

outras discriminações, nascem a partir<br />

de conceitos e verdades sociais de desconstrução<br />

muito complexa, que não se<br />

fazem de uma hora para outra.<br />

O que precisa ser feito para<br />

mudar esse quadro?<br />

Em minha opinião, para mudar o<br />

quadro, deve haver, emergencialmente,<br />

leis mais protetivas. Mas é claro que<br />

não é só. Digo das leis pois têm efeito<br />

imediato para um problema muito grave<br />

e que ocorre hoje. Não podemos esperar.<br />

Certamente a criminalização da homofobia<br />

não fará com que ela desapareça,<br />

como num passe de mágica. A história<br />

nos mostra isso com o racismo. Mas o<br />

reconhecimento é mais que necessário,<br />

com os números alarmantes divulgados<br />

pelo governo federal, através da Secretaria<br />

de Direitos Humanos. Queremos<br />

que os crimes sejam devidamente punidos,<br />

com penas compatíveis, simplesmente<br />

<strong>por</strong>que não somos cidadãos de<br />

segunda categoria e queremos proteção<br />

integral do estado. No mais, acreditamos<br />

que deva haver, no âmbito da educação,<br />

preparação dos educadores em geral<br />

para que as diversas formas de exercício<br />

da sexualidade sejam ensinadas como<br />

“normais”, a fim de que as próximas<br />

gerações sejam ensinadas sobre tal fenômeno,<br />

sem que haja rejeição. Há<br />

muitos interesses neste jogo, infelizmente,<br />

e <strong>por</strong> isso não pararemos de lutar, até a<br />

aprovação de todas as leis e políticas<br />

públicas que julgarmos necessárias para<br />

a nossa proteção.ø<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Elas</strong> <strong>por</strong> <strong>Elas</strong> - março <strong>2014</strong> 83

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