Marcelo Camargo/ABr VIOLÊNCIA | <strong>por</strong> Nanci Alves Estupro: problema global Crime invisível que condena as mulheres ao silêncio
Quantas mulheres você conhece? E quantas você sabe que sofreram violência sexual? Talvez você não conheça nenhuma, pois é um crime que ninguém fala sobre ele, nem para a melhor amiga. Crime invisível! Porém, os casos de estupro são maiores do que o de homicídio doloso (com intenção de matar), conforme os resultados dos estudos do 7º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), publicado em 2013. Os estudos registram 50,6 mil casos de estupro em todo o país, enquanto os de homicídios dolosos chegaram a 47,1 mil mortes. O número de estupros no Brasil subiu 18,17% em 2012, na comparação com o ano anterior. O que significa dizer que foi de 22, 1 estupros <strong>por</strong> grupo de 100 mil habitantes em 2011, para 26,1 em 2012. Ao avaliar essa pesquisa, o membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, professor Robson Sávio, alerta para a necessidade de considerarmos duas variáveis. A primeira é que o estudo foi baseado na nova legislação, a Lei Federal 12.015, de 2009, que altera a conceituação de “estupro”, passando a incluir, além da conjunção carnal, os “atos libidinosos” e “atentados violentos ao pudor”. Isso, provavelmente, aumenta a quantidade de registros. A segunda é que há, cada vez mais, políticas públicas com mecanismos que garantem a integridade da mulher que denuncia o estupro: novos canais de denúncia, delegacias especializadas, etc. Portanto, melhores mecanismos que auxiliam no aperfeiçoamento da coleta de dados. “Infelizmente, os casos reais são muito maiores que aqueles noticiados às agências estatais, principalmente às polícias – dado que outras agências públicas, como a saúde pública, <strong>por</strong> exemplo, têm obrigação de notificação do crime”, afirma. Na realidade, <strong>por</strong> medo e pelo estigma, milhares de mulheres não denunciam o estupro. Muitas vezes são abusadas durante anos, mas preferem o sofrimento solitário a se ex<strong>por</strong>em publicamente. De acordo com Robson Sávio, vivemos uma “certa hipocrisia social que revitima a mulher. Além de sofrer a violência, a mulher é quase condenada ao silêncio”. Nossa cultura retrata uma sociedade machista e patriarcal, que ainda vê a mulher como mercadoria, e não dona de seu corpo e da sua sexualidade. Essa mentalidade precisa mudar para atingirmos um patamar de igualdade e respeito. Na avaliação de Robson Sávio, é inadmissível que o Estado não aprimore os mecanismos de prevenção e punição dos autores da violência contra a mulher. “Lembrando que em relação aos autores do ato violento há que se pensar em medidas para além da simples detenção, haja vista que, muitas vezes, foram também vítimas de abusos sexuais, principalmente na infância. A vingança como punição nesse e noutros casos não resolve o problema. Trata-se, <strong>por</strong>tanto, de um enfrentamento complexo e difícil, <strong>por</strong>que é perpassado <strong>por</strong> outros elementos, como <strong>por</strong> exemplo a rotulação e estigmatização das vítimas pela sociedade”, ressalta. Problema mundial Notícias de estupros coletivos na Índia chocam o mundo inteiro, mas, na realidade, a violência sexual é um problema global. De acordo com estudo feito em 56 países e publicado em fevereiro de <strong>2014</strong>, na revista The Lancet, uma em cada 14 mulheres já foi, pelo menos uma vez, vítima de violência sexual <strong>por</strong> parte de alguém que não o seu parceiro. Matéria divulgada na Agência Brasil mostra que a realidade varia de país para país. As mais altas taxas de violência sexual estão no Centro da África Subsaariana (21% na República Democrática do Congo), no Sul da mesma região (17,4% na Namíbia, África do Sul e no Zimbabue), e na Oceania (16,4% na Nova Zelândia e Austrália). Os países do Norte da África e Médio Oriente (4,5% na Turquia) e no Sul da Ásia (3,3% na Índia e em Bangladesh) registraram as taxas mais baixas. No Brasil, a <strong>por</strong>centagem encontrada foi de 7,6%. Já no Uruguai e na Argentina, o percentual ficou em 5,8%. O Peru registrou a taxa de 15,3%. Na Europa, os países do Leste (6,9% na Lituânia, Ucrânia e no Azerbaijão) têm percentual muito mais baixo do que os do Centro (10,7% na República Tcheca, Polônia, Sérvia, em Montenegro e Kosovo) e do que os do Ocidente (11,5% na Suíça, Espanha, Suécia, no Reino Unido, na Dinamarca, Finlândia e Alemanha). Já a pesquisa da ONU, realizada em seis países asiáticos com 10 mil homens, indica que 24% deles admitem ter praticado o crime. Durante quatro anos, agentes da ONU visitaram lares de áreas urbanas e rurais de Bangladesh, Camboja, China, Indonésia, Papua- Nova Guiné e Sri Lanka. A novidade desse estudo é que ele se baseia em conversas individuais com homens, e não com mulheres vítimas de estupros, tanto em zonas urbanas como rurais. A pergunta não era, especificamente, se haviam praticado estupro e sim se já haviam forçado uma mulher que não era a esposa ou namorada a ter relações sexuais. O resultado mostra que 11% dos entrevistados relataram ter cometido o crime ao menos uma vez na vida, sendo que a taxa subiu para 24% quando foram consideradas a esposa, a noiva ou a namorada. Os pesquisadores constaram também que homens com histórico de vitimização, como abuso sexual na infância ou coagidos sexualmente, tinham mais probabilidade de cometer o crime. Uma das pesquisadoras que participaram do estudo, Emma Fulu, disse, <strong>Revista</strong> <strong>Elas</strong> <strong>por</strong> <strong>Elas</strong> - março <strong>2014</strong> 59