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Revista Elas por elas 2014

A revista sobre gênero Elas por Elas foi criada, em 2007, com o objetivo de dar voz às mulheres e incentivar a luta pela emancipação feminina. A revista enfatiza as questões de gênero e todos os temas que perpassam por esse viés. Elas por Elas traz reportagens sobre mulheres que vivenciam histórias de superação e incentivam outras a serem protagonistas das mudanças, num processo de transformação da sociedade. A revista aborda temas políticos, comportamentais, históricos, culturais, ambientais, literatura, educação, entre outros, para reflexão sobre a história de luta de mulheres que vivem realidades diversas.

A revista sobre gênero Elas por Elas foi criada, em 2007, com o objetivo de dar voz às mulheres e incentivar a luta pela emancipação feminina. A revista enfatiza as questões de gênero e todos os temas que perpassam por esse viés. Elas por Elas traz reportagens sobre mulheres que vivenciam histórias de superação e incentivam outras a serem protagonistas das mudanças, num processo de transformação da sociedade. A revista aborda temas políticos, comportamentais, históricos, culturais, ambientais, literatura, educação, entre outros, para reflexão sobre a história de luta de mulheres que vivem realidades diversas.

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As mulheres ainda são minoria<br />

na arte? Esse ainda é um espaço<br />

a ser ocupado p<strong>elas</strong> mulheres?<br />

O problema da maioria ou minoria<br />

não é um problema numérico, mas<br />

sim de poder. Em seu último livro<br />

(2013), Alain Quemin, estudando os<br />

artistas mais consagrados no mundo<br />

da arte contem<strong>por</strong>ânea, observa a presença<br />

ínfima de mulheres nos topos<br />

das listagens mais im<strong>por</strong>tantes; <strong>elas</strong><br />

são aí minoria, ainda que, dentre os<br />

alunos das instituições de arte sejam,<br />

provavelmente, maioria.<br />

O estudo mostra o quanto o gênero,<br />

entre outras categorias como nacionalidade,<br />

lugar de nascimento, geração,<br />

etc, são variáveis de reconhecimento<br />

significativo quando se pensa no ranking<br />

internacional mais legítimo ou central.<br />

Mas claro que há realidades locais e<br />

nacionais que são diversas, o Brasil,<br />

<strong>por</strong> exemplo, é um país distinto nesse<br />

quesito, pois no topo das listas de<br />

artistas mais consagrados há a presença<br />

de Adriana Varejão, Beatriz Milhazes,<br />

entre outras. No entanto, vale notar<br />

que o Brasil não ocupa uma posição<br />

central no mercado da arte contem<strong>por</strong>âneo<br />

internacional.<br />

Sinto que, <strong>por</strong> vezes, tomamos a<br />

nossa realidade, tão particular e um<br />

tanto periférica, como sendo “a norma”,<br />

ou um índice forte de grandes alterações<br />

nessa questão. Será? Não estou segura,<br />

o livro de Quemin aponta coisas bem<br />

diversas.<br />

Na sua tese de doutorado, você<br />

destaca o acesso desigual à formação<br />

artística e o papel desempenhado<br />

pelos críticos de arte<br />

para a justificar a desigualdade<br />

de gênero na arte. Qual o peso<br />

desse passado histórico e qual a<br />

realidade hoje desses dois aspectos:<br />

formação e crítica?<br />

Creio que o modo com que os críticos<br />

julgaram e classificaram as artistas<br />

naquele momento (final do XIX e início<br />

do XX), como “amadoras”, foi im<strong>por</strong>tante<br />

no sentido de desestimular estudos,<br />

colecionismo e a musealização das<br />

obras de muitas dessas artistas, e, com<br />

isso, tiveram um passo decisivo, embora<br />

não previsível naquele momento, na<br />

sua exclusão do cânone. A questão da<br />

formação está atrelada à da crítica. Ela<br />

foi significativa para excluir as mulheres<br />

do grande gênero da pintura histórica,<br />

que era considerado o mais elevado<br />

pelo sistema acadêmico.<br />

Excluídas do acesso ao modelo vivo,<br />

que era, na França, um monopólio da<br />

Academia, as mulheres só podiam executar<br />

gêneros menores, como as pinturas<br />

de gênero, as paisagens e naturezasmortas.<br />

Com isso, foram relegadas a<br />

nichos menos valorizados das práticas<br />

artísticas, vistas como distantes da genialidade,<br />

um atributo então visto como<br />

essencialmente e naturalmente masculino,<br />

e não fruto das condições de formação<br />

desiguais. Com a crise do sistema<br />

acadêmico essa modalidade de exclusão<br />

se esgarça, perde sua força. Mas é<br />

substituída <strong>por</strong> outros tipos de relações<br />

assimétricas entre os gêneros no interior<br />

do campo das artes.<br />

De todos os dados que você<br />

colheu sobre a segregação das<br />

mulheres na arte, o que te chamou<br />

mais atenção ou qual o fato mais<br />

absurdo?<br />

Não saberia dizer. Talvez o que me<br />

marcou mais foi ter sido contatada pela<br />

família da escultora Julieta de França,<br />

primeira mulher brasileira a gozar do<br />

prêmio de viagem ao exterior entre<br />

1901 e 1905, após conhecerem minha<br />

tese, e me mostrarem um álbum da artista,<br />

com todos os recortes de jornais<br />

sobre ela, <strong>por</strong> ela mesmo colhidos,<br />

fotos de obras suas que hoje estão desaparecidas.<br />

Essa documentação rara, maravilhosa,<br />

se chama “Souvenir de ma carrière<br />

artistique” e hoje está no Museu<br />

Paulista. Esse fato me fez ver que talvez<br />

haja muitas obras e documentação com<br />

as famílias, que podem ser redescobertas<br />

e contribuírem para uma transformação<br />

efetiva do nosso atual conhecimento<br />

sobre <strong>elas</strong> e suas produções.<br />

Recentemente, o Brasil recebeu<br />

a exposição Elles, de Paris. Na<br />

sua opinião, a coleção com obras<br />

só de mulheres deu visibilidade<br />

ao tema no Brasil?<br />

Creio que aqui a visibilidade e o impacto<br />

gerado pela exposição foram<br />

muitíssimo menores do que na França,<br />

incomparável eu diria. Lá a exposição<br />

gerou um debate cultural ampliado,<br />

que, efetivamente, revolveu e transformou<br />

as perspectivas historiográficas.<br />

Aqui me pareceu um fato isolado, mas<br />

ainda assim, mesmo que pontual, estimula<br />

perguntas, dúvidas, interesse em<br />

um público ainda muito pouco habituado<br />

a esse tipo de temática. Não foi uma<br />

mostra revolucionária, mas certamente<br />

trouxe contribuições.ø<br />

1. Graduada em Ciências Sociais pela<br />

Universidade de São Paulo, mestre e doutora<br />

em Sociologia pela Universidade de São<br />

Paulo, realizou doutorado Sanduíche na<br />

École des Hautes Études en Sciences Sociales-<br />

Paris e pós-doutorado pela Université<br />

de Genève. É docente do Instituto de Estudos<br />

Brasileiros (USP) desde 2009, atuando na<br />

área de Sociologia, com ênfase em Sociologia<br />

da Arte e da Cultura, particularmente nos<br />

seguintes temas: Arte e gênero e Mecenatos<br />

públicos e privados no Brasil (séculos XIX e<br />

XX). Atualmente dedica-se aos seguintes<br />

projetos de pesquisa: “Artistas Modernistas<br />

na Coleção do Instituto de Estudos Brasileiros”<br />

e “Outros modernismos: produção<br />

artística e cultura visual no Brasil, 1920-<br />

1940”. É autora da obra Profissão Artista:<br />

Pintoras e Escultoras Brasileiras, 1884-1922,<br />

entre outros livros e artigos.<br />

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