55De acordo com Rodrigues (2002), um analisador histórico é umacontecimento ou movimento social que vem a nosso encontro e con<strong>de</strong>nsa diversasforças até então dispersas, funcionando como catalisador químico e realizandointervenções sem intermediação: basta estar atento para os pontos <strong>de</strong> diferença,nas cenas que emergem.Em se tratando da experiência da Associação <strong>de</strong> <strong>Capoeira</strong> Lenço <strong>de</strong> Sedaarticulada à Socieda<strong>de</strong> <strong>Cultural</strong> Pasárgada, mil acontecimentos pululavam noslugares e recantos vazios da cida<strong>de</strong>. Recortamos três <strong>de</strong>les, conforme a intensida<strong>de</strong>com que vieram a nosso encontro e a potência <strong>de</strong> intervenção na vida dacomunida<strong>de</strong>: o bloco <strong>de</strong> caricato “Dexeu Falá”, a “Festa da Criança”, e asIntervenções <strong>de</strong> <strong>Capoeira</strong> na Escola Estadual Capitão Egídio Lima.4.2.1. Dexeu FaláO bloco caricato “Dexeu Falá” é uma das manifestações que aglomeravam aspessoas em um processo <strong>de</strong> criação coletiva e, no período <strong>de</strong> 1981 a 1992, saiu àsruas no carnaval da cida<strong>de</strong>. O carnaval em Timóteo era um evento estruturado pelaprefeitura municipal, com regulamentos para que escolas e blocos pu<strong>de</strong>ssemparticipar dos <strong>de</strong>sfiles carnavalescos e concorrer a prêmios, conforme requisitos préestabelecidos.Por meio <strong>de</strong> boletim, em 1989, o bloco Dexeu Falá <strong>de</strong>nunciava que o carnavalda cida<strong>de</strong> havia se transformado e se distanciado <strong>de</strong> suas características iniciais:“no princípio era a festa: o povo livre, a praça, a alegria, a vida. Depois, outrosinteresses separaram o povo da festa. Criaram arquibancadas e palcos comexpectadores passivos e atores” (BLOCO CARICATO DEXEU FALÁ, 1989, p.1). Otexto refere-se ao fato do carnaval em Timóteo ter se tornado uma festa queimpossibilitava a participação <strong>de</strong> grupos periféricos, uma vez que as pessoas, para<strong>de</strong>sfilar nas escolas <strong>de</strong> samba, tinham que comprar fantasias. As estrelas da festa<strong>de</strong>sfilavam na alameda, enquanto aqueles que não possuíam condições econômicasficavam como expectadores - mas só tinha acesso às arquibancadas aqueles quepodiam pagar pelos ingressos.O bloco Dexeu Falá, surge nesse contexto, com o intuito <strong>de</strong> escapar <strong>de</strong>ssaorganização, e produzir, na cida<strong>de</strong>, um carnaval aberto a todos:
56O Dexeu Falá é um bloco sem compromisso com as regras burocráticas queenvolvem todas as escolas, um bloco que vai sair com quantos elementostiver, com a bateria que tiver; aberto para o povão se infiltrar durante toda asua passagem. (...) O que interessa é ver as cores preto e amarelo vestidaspor todos que têm alguma coisa pra falar, aberto aos oprimidos e classesque têm a liberda<strong>de</strong> como meta (...) (DEXEU FALÁ, 1982, p.3).A conexão do bloco <strong>de</strong> carnaval com a capoeira está colocada em diversospontos. O processo <strong>de</strong> formação do bloco era semelhante àquele que acontecia nasrodas <strong>de</strong> capoeira: o grupo estava nas ruas, e os que quisessem participar da festapo<strong>de</strong>riam entrar. Além disso, os sambas-enredos e a bateria do bloco eramcompostos, em sua maioria, por capoeiristas. Os enredos apresentados pelo blocoeram criados coletivamente, em reuniões abertas à população da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Timóteoe circunvizinhas, e ganhavam forma no grupo com as músicas e alegorias.Inicialmente, apresentavam protestos e contestações, numa perspectiva i<strong>de</strong>ológicamarxista, com ênfase na luta <strong>de</strong> classes. Posteriormente, passaram a girar em torno<strong>de</strong> temas diversos, como ecologia, solidarieda<strong>de</strong>, bem comum, valorização da paz.Contudo, a principal diferença que o Dexeu Falá trazia à cida<strong>de</strong> era a invenção <strong>de</strong>um espaço aberto à alegria e à irreverência, no qual todos podiam participar.4.2.2. A capoeira na Escola Estadual Capitão Egídio Lima.Foi no ano <strong>de</strong> 1984 que aconteceu a primeira experiência da capoeira Lenço<strong>de</strong> Seda no contexto escolar. Em uma primeira aproximação, essa conexãocapoeira-escola parece um tanto conflituosa e inusitada. A capoeiragem possui umaforma <strong>de</strong> organização muito diferente da lógica escolar, acontecendo nas ruas <strong>de</strong>Timóteo <strong>de</strong> forma fluida, abrindo processos invenção. A escola, por sua vez, é umainstituição disciplinar, com estrutura e organização arquitetadas para a vigilância e ocontrole dos alunos. Conforme Foucault (1987),(...) principalmente <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> 1762 – o espaço escolar se <strong>de</strong>sdobra; aclasse torna-se homogênea, ela agora só se compõe <strong>de</strong> elementosindividuais que vêm se colocar uns ao lado dos outros sob o olhar domestre. A or<strong>de</strong>nação em fileiras, no século XVIII, começa a <strong>de</strong>finir a gran<strong>de</strong>forma <strong>de</strong> repartição dos indivíduos na or<strong>de</strong>m escolar: filas <strong>de</strong> alunos nasala, nos corredores, nos pátios; colocação atribuída a cada um em relaçãoa cada tarefa e a cada prova; colocação que ele obtém <strong>de</strong> semana emsemana, <strong>de</strong> mês em mês, <strong>de</strong> ano em ano; alinhamento das classes <strong>de</strong>ida<strong>de</strong> umas <strong>de</strong>pois das outras (FOUCAULT, 1987, p.125-126).Se apresentássemos essa <strong>de</strong>scrição da organização da escolar sem a citaçãodo período histórico ao qual se refere, acreditaríamos estar <strong>de</strong>screvendo uma escola
- Page 6 and 7: AGRADECIMENTOSIêQuando eu aqui che
- Page 8 and 9: ABSTRACTThis paper presents a study
- Page 10 and 11: 6. CAPOEIRA ANGOLA: TRADIÇÃO E CR
- Page 13 and 14: 12julgamento de valor e determina q
- Page 15: 14coisa de que se sai transformado,
- Page 18 and 19: 17pelo mestre Reginaldo Véio 3 e s
- Page 20 and 21: 192. O MÉTODOÔ menino aprenda a l
- Page 22 and 23: 21pesquisadora que se lança na exp
- Page 24 and 25: 23significados são construídos e
- Page 26 and 27: 25De acordo com Meier e Kudlowiez (
- Page 28 and 29: 273. A CAPOEIRA NO BRASIL: ARTICULA
- Page 30 and 31: 29Entendemos que investigar o adven
- Page 32 and 33: 31No escravismo, os senhores - colo
- Page 34 and 35: 33socialização, emergiu uma cultu
- Page 36 and 37: 35eram identificados por cores, sin
- Page 38 and 39: 37polícia, ao jogo do bicho, aos o
- Page 40 and 41: 39manifestações dos artistas e in
- Page 42 and 43: 41“vadiação” é um termo chei
- Page 44 and 45: 43registrar seu Centro de Cultura F
- Page 46 and 47: 45musicalidade e o jogo, articulado
- Page 48 and 49: 47O estado de dominação estava co
- Page 50 and 51: 49a alta periculosidade, os baixos
- Page 52 and 53: 51conhecimento dos fundamentos dess
- Page 54 and 55: 53políticos e agentes de transform
- Page 58 and 59: 57contemporânea, pois essa estrutu
- Page 60 and 61: 59envolve todo mundo. Envolve pra m
- Page 62 and 63: 61da Escola Estadual Capitão Egíd
- Page 64 and 65: 63grandes proporções, chegando a
- Page 66 and 67: 65Nas imagens, vemos crianças banh
- Page 68 and 69: 675. A CAPOEIRAGEM EM TEMPOS DE MOD
- Page 70 and 71: 69pessoal e o bem-estar da comunida
- Page 72 and 73: 71Entendemos, portanto, que, nas re
- Page 74 and 75: 73principalmente no que diz respeit
- Page 76 and 77: 75consumo se tornaram mais intensos
- Page 78 and 79: 77Os movimentos sociais conquistara
- Page 80 and 81: 79atabaque, que vai dar sustentaç
- Page 82 and 83: 81produz, simultaneamente, prática
- Page 84 and 85: 835.3. O corpo: das modelizações
- Page 86 and 87: 85capaz. Maquinações corporais,
- Page 88 and 89: 87O processo de desenvolvimento e a
- Page 90 and 91: 89(...) a prática desta ciência,
- Page 92 and 93: 91positividade, para potencializar
- Page 94 and 95: 93unicidade. Rupturas de sentido, c
- Page 96 and 97: 95Hoje, o berimbau é considerado o
- Page 98 and 99: 97Ao pai que nos criouAbençoe essa
- Page 100 and 101: 99Ainda com os corridos, os capoeir
- Page 102 and 103: 101relata um acontecimento que expr
- Page 104 and 105: 103cada pessoa que compõe a roda.
- Page 106 and 107:
105resposta mínima, onde pensament
- Page 108 and 109:
1076.3. A produção da malícia e
- Page 110 and 111:
109Pepinha fala dessa construção
- Page 112 and 113:
111a ser o protagonista de si mesmo
- Page 114 and 115:
113dos ritmos e da dança na diásp
- Page 116 and 117:
115se estabelecem no plano macro da
- Page 118 and 119:
117quer de modo mais coletivo)” (
- Page 120 and 121:
119compõe a capoeiragem. Em nosso
- Page 122 and 123:
121o respeito à linhagem de mestre
- Page 124 and 125:
123uma malta rival. Na contemporane
- Page 126 and 127:
125No cruzamento dos diferentes asp
- Page 128 and 129:
127Foucault (1986) o poder não é
- Page 130 and 131:
129por associarem a capoeira ao pec
- Page 132 and 133:
131diversos. Suas apresentações l
- Page 134 and 135:
133coloca-se continuamente à prova
- Page 136 and 137:
135microscópico, o qual, no entant
- Page 138 and 139:
137REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASACES
- Page 140 and 141:
139GALEANO, Eduardo. As palavras an
- Page 142:
141REIS, Letícia Vidor de Sousa. O