75consumo se tornaram mais intensos na <strong>Capoeira</strong> Regional. Na opinião do autor,nasce aí uma nova Regional, com ausência completa dos antigos rituais, velocida<strong>de</strong>excessiva na execução dos movimentos, saltos mirabolantes, rapi<strong>de</strong>z, bateriaacelerada sem critérios <strong>de</strong>finidos.Destacamos que emerge nessa nova Regional uma prática bastante técnica eofensiva, propícia a competições <strong>de</strong>sportivas, nas quais o objetivo é vencer e,simultaneamente, apresentar uma capoeira show, com movimento acrobáticos,rápidos e performances que valorizam a formatação corporal e as exibiçõesindividuais. Essa lógica capitalística atravessa também a organização dos grupos,através <strong>de</strong> mudanças na forma das classificações hierárquicas internas.Lembramos que, com as maltas cariocas, emerge no início do século XX umaorganização grupal na capoeiragem com relações hierárquicas com papéisespecíficos a serem cumpridos. Na capoeira Regional e <strong>Angola</strong>, permanece umaforma <strong>de</strong> organização para <strong>de</strong>signar os diferentes níveis <strong>de</strong> aprendizagem egraduação dos capoeiristas. Porém, mediante a expansão da capoeiragem no Brasile no mundo, com a abertura <strong>de</strong> novas aca<strong>de</strong>mias, o processo <strong>de</strong> classificaçãohierárquica na <strong>Capoeira</strong> Regional foi se transformando em função das <strong>de</strong>mandas <strong>de</strong>mercado e <strong>de</strong> consumo. Mestre Reginaldo <strong>de</strong>staca:A Regional tem uma forma <strong>de</strong> classificação que é muito diferente, ela é porcordas, por cordéis, por cores. Ela assimila esse sistema <strong>de</strong> cores queoriginalmente era das lutas orientais; então ela propõe uma série <strong>de</strong> cordéis.Na dinâmica comercial da coisa, a cada ano o aluno quer ir lá e buscar maisum cor<strong>de</strong>l pra ele, ele paga o ano inteiro na expectativa que vai chegar umahora em que ele vai ter um retorno da <strong>de</strong>dicação. Chegou uma hora em queos cordéis eram muito poucos pra alimentar comercialmente, porquerapidinho a pessoa estava chegando na condição <strong>de</strong> contra mestre, <strong>de</strong>mestre, e aí teoricamente foi e abriu um outro espaço pra si, então o quêque os grupos fizeram? Criaram cordéis intermediários, pra po<strong>de</strong>r fazeresse diálogo comercial (MESTRE REGINALDO VÉIO, 2006) 33 .Diante da inserção da capoeira no mercado das aca<strong>de</strong>mias, principalmentecom o estilo Regional, as formas <strong>de</strong> classificação dos níveis <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento doscapoeiristas transformaram-se. Enten<strong>de</strong>mos que tais mudanças ocorreram medianteduas contingências. A primeira está relacionada ao imperativo <strong>de</strong> oferecer aosalunos um elemento representativo <strong>de</strong> seu <strong>de</strong>senvolvimento na capoeira, como umproduto adquirido no final <strong>de</strong> cada etapa. Os cordéis passam a cumprir essa função.A segunda contingência refere-se à necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atribuir graus mais elevados aos33 Informação verbal obtida em entrevista realizada em 04/03/2006..
76capoeiristas, para aten<strong>de</strong>r à <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> atuação em novas aca<strong>de</strong>mias. Nesseprocesso, vários capoeiristas po<strong>de</strong>riam alcançar, rapidamente, o grau <strong>de</strong> mestre.Paradoxalmente, esse fato suscitou a criação <strong>de</strong> outras classificaçõesintermediarias, pois, simultaneamente, era necessário tentar limitar a multiplicaçãodas aca<strong>de</strong>mias, a expansão da concorrência.Enfim, a lógica <strong>de</strong> mercado e <strong>de</strong> consumo presente no cenáriocontemporâneo atravessa o universo da capoeira em diferentes aspectos, sendoque a <strong>Capoeira</strong> Regional se tornou mais aberta às capturas do po<strong>de</strong>r nacontemporaneida<strong>de</strong>. Todavia, a <strong>Capoeira</strong> <strong>Angola</strong> não está totalmente isenta <strong>de</strong>ssesatravessamentos. Apesar <strong>de</strong> manter as conexões com a tradição, os rituais efundamentos da capoeiragem, um processo <strong>de</strong> diálogo corporal com movimentos egolpes que privilegiam uma prática coletiva, a lógica <strong>de</strong> mercado po<strong>de</strong> serobservada nos eventos promovidos, com a venda <strong>de</strong> camisas, discos, livros. Enfim,com o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> formas alternativas para sobreviver no universocapitalístico.Reafirmamos, com Sant’Anna (2001), que praticamente nenhuma açãohumana na contemporaneida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser experimentada sem a inclusão doconsumo. Os agenciamentos 34 capitalistas para a produção do sujeito consumidoratravessam inúmeras dimensões da vida. Porém, quais seriam as formas <strong>de</strong>resistência? Em quais circunstâncias acontecem? Como se configuram?Diante <strong>de</strong> um po<strong>de</strong>r que se exerce <strong>de</strong> maneira difusa, em re<strong>de</strong>s múltiplas ecom tecnologias <strong>de</strong> governo que atravessam diretamente as formas <strong>de</strong> ser e viver,há também inúmeras formas <strong>de</strong> resistência, com a emergência <strong>de</strong> agrupamentosdiversificados, mutantes e circunstanciais, que conseguem, em <strong>de</strong>terminadosmomentos, inverter posições nos jogos estratégicos <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r no âmbito social.Basta observarmos algumas conquistas do movimento negro, como a legalizaçãodas ações afirmativas; o movimento dos <strong>de</strong>ficientes, com a ampliação dos <strong>de</strong>bates econquistas legislativas que visam garantir (pelo menos em tese) direitos essenciais;o movimento dos idosos, dos homossexuais, e tantos outros.34 O termo “agenciamentos” é utilizado aqui, a partir <strong>de</strong> Deleuze, para <strong>de</strong>signar um conjunto <strong>de</strong>relações materiais e um regime <strong>de</strong> signos que se caracterizam por uma forma relativamente estável eum funcionamento reprodutor. No entanto, a maneira como o indivíduo participa da reprodução<strong>de</strong>sses agenciamentos sociais introduz simultaneamente uma pequena irregularida<strong>de</strong>, o que liberaseu po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> afecção e resgata sua potência <strong>de</strong> sentir, pensar, agir, possibilitando a emergência dadiferença (ZOURABICHVILI, 2004).
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AGRADECIMENTOSIêQuando eu aqui che
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