Dissertação completa - Programa de Pós-Graduação em Letras
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Como já disse e julgo que agora já <strong>de</strong>u para enten<strong>de</strong>r, o Pedro <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
s<strong>em</strong>pre tinha tido dificulda<strong>de</strong> <strong>em</strong> amar duas pessoas ao mesmo<br />
t<strong>em</strong>po, quando foss<strong>em</strong> ou <strong>de</strong>vess<strong>em</strong> ser amadas <strong>em</strong> registros afetivos<br />
diferentes: <strong>em</strong> pequenos, a mãe e a irmã; na gran<strong>de</strong> crise, a irmã e a<br />
namorada; e agora <strong>de</strong> novo a mesma namorada recuperada como<br />
mulher e a irmã. A Fernanda estava na mó <strong>de</strong> cima, p. 189.<br />
A carta que escreve a Ricardo Vale, atribuindo culpa a Paula pelo terrorismo que<br />
a PIDE cometeu contra Ana, acaba sendo mesmo uma espécie <strong>de</strong> verda<strong>de</strong> inconsciente<br />
que ele percebia <strong>em</strong> si <strong>em</strong> relação à irmã, ou seja, realmente ele traduzia, s<strong>em</strong> querer,<br />
todo seu sentimento dúbio e cruel <strong>em</strong> relação a ela. É assim que se inicia o processo <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>sequilíbrio total da personag<strong>em</strong>, a caminhar para a concretização do estupro, já<br />
previsto numa discussão repleta <strong>de</strong> cinismo, <strong>de</strong> ironia, mas calcado nas malhas da<br />
verda<strong>de</strong> sinistra <strong>de</strong> suas amarguras.<br />
E é nesse momento, quando Pedro se aproximou <strong>de</strong> Paula, que submerge toda a<br />
herança dominadora que lhe foi repassada. É <strong>de</strong>ssa forma que a violência simbólica,<br />
conforme Bourdieu (2007), <strong>de</strong>termina que ela não se opera na or<strong>de</strong>m das intenções<br />
conscientes; é abandonada, e no lugar <strong>de</strong>la surge a violência física, consciente,<br />
representada pelo ódio. Após breve frase proferida pela irmã, que lhe causara gran<strong>de</strong><br />
impacto, segue a cena:<br />
“Tudo para mim começava e acabava <strong>em</strong> ti!...”, dizia no entanto<br />
Pedro, a afagar-lhe os cabelos, a querer beijá-la, a prendê-la nos seus<br />
braços, ele próprio quase <strong>em</strong> lágrimas, comovido com a sua própria<br />
comoção. “Perdoa-me, perdoa-me...”. Paula procurou afastá-lo,<br />
arrancar do seu corpo as mãos com que ele agora a segurara pela<br />
cintura, a puxar<strong>em</strong>-na para ele, a <strong>de</strong>scer<strong>em</strong> sobre as ná<strong>de</strong>gas.<br />
Sacudiu-o bruscamente. Afastou-se. Olhou-o com repulsa. “Sabes o<br />
que é que não consigo mesmo perdoar-te, Pedro? É que tu és<br />
irr<strong>em</strong>ediavelmente, irrecuperavelmente menor. Apenas um pobre<br />
diabo...” E então... Bom, o resto foi rápido e brutal. Pedro avançou<br />
para a irmã <strong>de</strong> punho erguido, <strong>em</strong>purrou-a, ela caiu, ele caiu sobre<br />
ela, rasgou-lhe a camiseta, comprimiu-lhe os seios, bateu-lhe várias<br />
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vezes com a nuca no chão, hesitou por um brevíssimo momento