PACIENTE INTERNADO NO HOSPITAL, - Teses FIOCRUZ
PACIENTE INTERNADO NO HOSPITAL, - Teses FIOCRUZ
PACIENTE INTERNADO NO HOSPITAL, - Teses FIOCRUZ
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
José, 37 anos, cobrador de coletivo (cinco anos), antes foi laminador de<br />
fibra de vidro, cabeleireiro, cozinheiro, balconista, acabador de fibra de vidro, meio<br />
oficial de bombeiro hidráulico.<br />
[Entrevista realizada inicialmente fora do quarto, num banco ao sol, depois<br />
prossegui em seu quarto].<br />
“Estou internado para operar, estou com infecção no testículo esquerdo.<br />
Estive internado há doze anos atrás no Hospital X. para extrair uma bala que levei<br />
quando tentei reagir a um assalto. Lá foi horrível ficar sozinho, não tive visitas. Só<br />
uma vez de minha mãe que foi me buscar. Ah! [lembrando] ... E teve de um tio”.<br />
“Foi lá que descobri que tive o vírus. Onde tudo é descartável. Descobri a<br />
vida dos descartáveis. Não souberam me contar. Não queria comer. Achava que<br />
era só comigo. Antes de me falar, já me tratavam reservado, como se fosse pegar<br />
no ar, usando máscaras, roupas. Pedi alta porque não agüentava mais esse<br />
tratamento. Eu sei que eles não estavam errados, mas não souberam me falar. A<br />
gente acha estranho. Eu achava que não era para equipe me tratar assim porque<br />
eu não era o primeiro, e já estavam orientados. Eles que pediram o meu exame<br />
[de HIV]. Quando internei era travesti, com silicone nos seios, nos quadris,<br />
sobrancelhas finas feitas. Por isso, eles me pediram o exame. Eu tenho para mim<br />
que não foi nessa vida - ‘Vida á - toa’ que peguei isso. Sempre usei preservativo.<br />
Com o tiro perdi muito sangue. Fui transfundido. Fiquei em coma”.<br />
“Rasgaram minha blusa, a minha calcinha, me cobriram com lençol,<br />
colocaram no soro, e na ambulância. Rodei todos os hospitais em Nova Iguaçu,<br />
nenhum deles quis me aceitar. Não tinha vaga. Só me vi no hospital com barriga<br />
grande, bexiga inchada. Botaram sonda a sangue frio, senti uma dor. O<br />
enfermeiro me disse que era para superar a outra dor que eu estava sentindo.<br />
Desmaiei e acordei na sala do pré-operatório. Percorri todos os hospitais, nenhum<br />
me aceitou, dentro da ambulância só ouvia dizendo que não tinha vaga. Quando<br />
chegou no Hospital X., eu mesmo empurrei a porta da ambulância com o pé e<br />
falei que só saía dali morto. Ali senti segurança. No Hospital Y., não quiseram<br />
ficar comigo porque sabiam que eu era travesti. Não foi pela incapacidade de<br />
vaga, foi pelo preconceito”.<br />
[Solicitei que mudássemos de lugar pelo sol está quente. Comentou ele: “eu<br />
não ligo eu gosto pra pegar uma corzinha”. E eu disse-lhe que talvez fosse para<br />
17