Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
apenas em fazê-lo sem se dar conta dos efeitos disto — ou seja, um desprazer<br />
como efeito colateral que anula o efeito principal — e, portanto, não obtém<br />
efetivamente prazer final e aquele(s) que o presencia(m) e daí deriva(m) uma<br />
inquestionável forma de prazer, um largo riso, porque:<br />
Uma despesa inibitória usualmente efetuada torna-se subitamente<br />
inutilizável por ouvirmos o comentário ingênuo, e a descarregamos então<br />
pelo riso. Não é necessário aqui que a atenção seja distraída provavelmente<br />
porque a suspensão da inibição ocorre diretamente e não através da<br />
intermediação de uma operação provocada (OC, p.208).<br />
Parece claro porque Freud chega a dizer que a suspensão da inibição ocorre<br />
diretamente neste caso: alguém fez o serviço para outrem e o dispensou da tarefa.<br />
Mas por conta de quê ele se dispensaria disto? Parece apenas um mecanismo onde o<br />
trabalho de uma engrenagem dispensa o comparecimento de outra para que o fato se<br />
dê como tal e pronto e ponto e acabou e estamos conversados. Entretanto, Freud<br />
nunca deixou de lado o apreço pelos argumentos. Sua lógica, pode-se dizer, é —<br />
dados os seus dados — implacável. Quando lhe faltam os elementos comprobatórios,<br />
não deixa de sugerir uma cautelosa hipótese, fornecendo-lhe os criteriosos ares de<br />
pura especulação.<br />
Se se pudesse generalizar, seria muito atraente colocar a característica<br />
específica do cômico [...] em um despertar da infância, considerar o cômico<br />
como o ‘último riso da infância’ restabelecido. Podia-se então dizer: ‘rio-me<br />
da diferença da despesa entre uma outra pessoa e eu próprio cada vez que<br />
redescubro a criança nela’. Ou, posto mais exatamente, a completa<br />
comparação que leva ao cômico seria: ‘assim ele o faz — eu o faço de outro<br />
modo — ele o faz como eu costumava fazê-lo em criança’ (OC, p.253).<br />
Este “último riso da infância” é uma clara alusão ao trabalho de seu<br />
antecessor: Henri Bergson.<br />
Em 1900, Bergson publica seus ensaios sobre o riso cômico. De início,<br />
parece interessado em assim circunscrevê-los quando adverte que o livro ”encerra<br />
três artigos sobre o Riso (ou antes, o riso suscitado sobretudo pelo cômico )<br />
” (BERGSON,1980,p.7). A certa altura, parece antever o que Freud escreverá cinco<br />
anos mais tarde e cuja citação serviu como abertura deste paralelo. Adverte, assim,<br />
Bergson:<br />
40