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Há aqui um descompasso entre o que se espera (e o preparo que disto<br />
resulta) e o que efetivamente advém, portanto, esta “outra fonte do cômico [...]<br />
consiste em nossas relações com o futuro, que costumamos antecipar com nossas<br />
idéias expectantes” (OC, p. 224).<br />
Os elementos motor e intelectivo poderiam se apresentar como subtipos.<br />
Enfim, “é bem obviamente verdadeiro, quanto a inúmeros casos, que preparações<br />
motoras formam a expressão da expectativa [...]” (OC, p. 224), enquanto em outros<br />
esta expectativa se traduz no interesse com que se atenta para determinada coisa e<br />
seu desfecho.<br />
Em ambos os casos, o efeito cômico decorre de uma solução deceptiva, que<br />
torna inadequados os preparativos aparentemente requeridos. Há uma expectativa<br />
frustrada como pano de fundo nesta moralidade cômica.<br />
Alguém se apronta para erguer um objeto que em tudo e por tudo parece<br />
pesado, faz um movimento vigoroso e se depara com algo muito mais leve e, com o<br />
impulso, acaba estirado no chão ao perder o próprio equilíbrio. Outro ouve<br />
atentamente algo que soa como muito interessante e é surpreendido por um<br />
desfecho completamente banal.<br />
se expressa:<br />
No segundo caso, onde a antecipação é de caráter intelectivo, a expectativa<br />
— pela avaliação de proporcionalidade (espera-se algo de determinada<br />
magnitude e o resultado decepciona);<br />
— pelo grau de atenção mobilizada (espera-se atentamente um determinado<br />
desfecho e o resultado decepciona);<br />
— pela despesa com a abstração (espera-se algo muito elaborado e sutil e o<br />
resultado decepciona).<br />
Portanto, como se observou até aqui, o contraste quantitativo é o que se<br />
considera, primariamente, como fonte do prazer cômico.<br />
Contudo, se levarmos em consideração um outro formato, bem mais<br />
elaborado e até intencional, não é impróprio atribuir uma outra fonte — secundária,<br />
no caso — de comicidade à relação com os valores estabelecidos e admirados,<br />
onde o fator fundamental é a irreverência sob a forma de mímica, caricatura,<br />
paródia, travestismo e desmascaramentos de toda ordem. Nesta modalidade, o que<br />
propicia prazer é a degradação do sublime, do eminente, da dignidade e da<br />
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