ANUNCIATA E SEU HUMOR - CES/JF

anseio por um espírito lúcido que dela possa extrair as inferências válidas para a
filosofia e a sociologia” (FREUD & JUNG, 1976, p.396).
Um espírito lúcido que não extraia apenas um valor terapêutico da
psicanálise?! Para Freud, conforme declarou a Wilhelm Fliess, “o emprego da
análise para o tratamento das neuroses é somente uma de suas aplicações; o futuro
talvez demonstre que não é o mais importante. Seja como for, seria errôneo
sacrificar todas as outras aplicações a essa única [...]” (FREUD, 1986, p.281).
Como se vê, ao recusar a psicanálise como procedimento terapêutico, Millôr
não fere nenhum brio, digamos assim, de Freud. Este, como se viu, o consideraria
lúcido ao dar outros destinos à especulação freudiana. Quanto a não considerá-la
como ciência, aí suas opiniões pouco divergem, mas isto pouco importaria a Freud,
principalmente quando intentava separar a psicanálise da ameaça de tornar-se mera
crença. Isto fica sublinhado em uma das cartas que escreveu ao pastor protestante
Oskar Pfister:
Tenho declarado freqüentemente que considero mais importante o
significado científico da análise do que o médico, e na terapia considero
mais eficaz sua influência na massa pelo esclarecimento e o
desmascaramento de enganos do que no restabelecimento de pessoas
isoladas (FREUD, 2003, p.160).
O pastor protestante Oskar Pfister (1873-1956), doutor em teologia e
filosofia, manteve um contato permanente com Freud, de 1909 até a morte deste,
em 1939. Além do ministério religioso, atuava como educador e orientador dos
jovens nas paróquias sob seu encargo, sendo este o trabalho que o levou a Freud:
pretendia interligar psicanálise e pedagogia (Cf. WONDRACEK, 2003, p.10).
A amizade entre os dois permaneceu sólida e íntegra, sem descartar a
possibilidade de divergência. E Pfister foi um dos primeiros a questionar Freud a
respeito da relação entre psicanálise e visão do mundo — Weltanschauung (Cf.
IBIDEM, p.10). A carta — ou o trecho dela que se revelou mais pertinente —, citada
anteriormente, constitui a resposta de Freud a tal questão.
Entretanto, não é apenas quando dialoga com “o religioso que busca na
psicanálise uma melhor instrumentação para entender a alma” (IBIDEM, p.7) que
Freud defende uma Weltanschauung científica para a psicanálise (Cf.
FREUD,1976b, p. 193-220). Numa carta a Albert Einstein, de 3 de maio de 1936,
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