Amigos Leitores - Intervenção urbana
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E afirmo que, produto do organismo, este sentimento é um produto<br />
orgânico educável como todos os outros sentimentos, uma paixão cultivável<br />
como as demais paixões. Não estabeleço diferença entre o amor e a<br />
memória ou a respiração, a paixão amorosa e a paixão pela observação, por<br />
exemplo. A educação amorosa ou sensual ou sentimental é uma questão de<br />
vontade. E a própria vontade é educável.<br />
Desde que o despojemos de seu romanticismo, que se faça dele um objeto<br />
de educação e de vontade, pode o amor ser o que Sébastien Faure chama<br />
"um oásis no deserto espantoso que é a vida", o que por meu lado chamo<br />
uma simples conseqüência da "camaradagem", tão somente. O amor,<br />
considerado como manifestação do companheirismo, ignora o<br />
monopolismo, o exclusivismo, os ciúmes, como também ignora a recusa e o<br />
rompimento.<br />
***<br />
Expliquemo-nos melhor. Admito perfeitamente que, até mesmo impostas,<br />
sejam a recusa e o rompimento manifestações da personalidade. Mas nego<br />
que sejam atos, gestos, provas, mostras de companheirismo. Se o<br />
companheirismo é um acordo ou pacto que contraem, para se garantirem<br />
mutuamente anarquistas dos dois sexos, por meio da eliminação do<br />
sofrimento no seio da associação, para se resguardarem contra os riscos da<br />
luta contra o meio hostil ou por cima do meio indiferente, não se concebe<br />
no domínio do amor, recusa ou ruptura impostas. De outra forma, é ir<br />
contra a própria finalidade do acordo. Se o companheirismo é questão de<br />
reciprocidade, de troca de serviços de toda a espécie, não se descortina a<br />
razão por que o amor deva ser eliminado da lista dos objetos de<br />
reciprocidade.<br />
10<br />
Tenho posto todo o meu empenho para que o meio a que tu e eu<br />
pertencemos se estabeleça, exista, prospere, para que as idéias que nos são<br />
mutuamente queridas se propalem e sejam acolhidas por um número cada<br />
vez maior de unidades humanas. Tenho oferecido aos meus companheiros<br />
de idéias todos os serviços compatíveis com as minhas aptidões e os meus<br />
conhecimentos. Tenho-te feito conhecer novos camaradas, aberto novos<br />
horizontes. Como compensação, quisera o teu afeto, manifestações de<br />
carinho (poderia pedir-te outra coisa: reciprocidade econômica, intelectual,<br />
recreativa, etc.), e tu recusas. Toma lá dá cá! Consumiste de mim. É graças a<br />
mim que a tua concepção de vida se dilatou, transformou, renovou. Que<br />
contraíste amizades, que sem mim não terias tido o prazer de conhecer, e<br />
agora recusas, justa reciprocidade, a que tome de ti. Bem sabias que eu não<br />
faço "nada por nada".<br />
Na nossa associação de egoístas, se oferecemos os nossos serviços é para<br />
recebermos, em troca, alguma coisa. Pretendias obter ajuda sem<br />
reciprocidade? Repara que não apelo para a tua humanidade, para a tua<br />
piedade, etc. Trata-se, pura e simplesmente, de um pacto.<br />
Conviemos em que, pela delicadeza das variadas manifestações da<br />
camaradagem, nos protegeríamos contra as asperezas da luta pela vida,<br />
edificaríamos o oásis cuja sombra nos resguardasse dos raios do tórrido sol<br />
que passa por sobre o meio anarquista. Pus todo o meu empenho, todo, em<br />
criar esta associação de egoístas, edificar este oásis. Mandar-se-me-á<br />
passear quando eu peça reciprocidade (econômica, intelectual) afetiva?<br />
Porventura um favor não vale outro? Se não tivesse esperado receber o<br />
equivalente do que dei, o egoísta que eu sou teria permanecido fora da<br />
associação. Não quero prejudicar os meus co-associados, mas tampouco ser<br />
por eles prejudicado. Toma lá dá cá! Sem o respeito a esta fórmula, de nada<br />
vale a associação.