10.06.2013 Views

Amigos Leitores - Intervenção urbana

Amigos Leitores - Intervenção urbana

Amigos Leitores - Intervenção urbana

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

No projeto genealógico de Foucault, os feminismos fariam parte da<br />

insurreição dos “saberes dominados”, da ‘(...) imensa e proliferante<br />

criticabilidade das coisas, das instituições, das práticas, dos discursos<br />

(...)(10), saberes localizados em uma deixis discursiva que levam em conta,<br />

em sua expressão, suas próprias condições de possibilidade, criticando o<br />

instrumental analítico que elaboram ou utilizam. Na ótica de Foucault, “o<br />

caráter essencialmente local da crítica indica na realidade algo que seria<br />

uma espécie de produção teórica autônoma, não centralizada, isto é, que<br />

não tem necessidade, para estabelecer sua validade, da concordância de um<br />

sistema comum.”(11)<br />

Foucault convida a penetrar a rede constitutiva das relações sociais que<br />

individualizam em níveis e patamares a fim detectar “(…) como funcionam<br />

as coisas no nível do processo de sujeição ou dos processos contínuos e<br />

ininterruptos que sujeitam os corpos, dirigem os gestos, regem os<br />

comportamentos, etc.” (12) O pensamento foucaultiano, deste modo, casase<br />

à análise feminista na medida em que ambos pretendem desvelar os<br />

discursos de verdade sobre o humano e seus recortes<br />

sexuados/sexualizados, pois segundo este autor, “(…) somos julgados,<br />

condenados, classificados, obrigados a desempenhar tarefas e destinados a<br />

um certo modo de viver ou morrer em função de discursos verdadeiros que<br />

trazem consigo efeitos específicos de poder” (13).<br />

Esta mesma constatação tem sido o mote para discursos e movimentos<br />

feministas na crítica das instituições sexuadas e binárias e do imaginário que<br />

as fundamenta: detectar os mecanismos e estratégias da ordem do discurso<br />

hierárquico e assimétrico para melhor subvertê-las. Falar, portanto, de<br />

igualdade/desigualdade não é o mesmo que mostrar as engrenagens<br />

produtoras das hierarquias e das sujeições, históricas e fundamentadas<br />

apenas em sua própria enunciação, pois como sublinha Foucault “(…) a ação<br />

do poder sobre o sexo se faria pela linguagem ou por um ato de discurso<br />

154<br />

criando, ao mesmo tempo em que se articula, um estado de direito. Fala, e é<br />

a regra.”(14)<br />

Nesta ótica, a historicidade das práticas discursivas mostra a contingência<br />

das representações sociais, da inteligibilidade instituída em imagens de<br />

corpo, em funções definidas, em papéis sexuados cuja objetivação constrói<br />

a realidade que supostamente refletem. Os discursos sobre o corpo e a<br />

sexualidade e a divisão hierarquizada dos seres humanos em mulheres e<br />

homens são, de fato, efeito e instrumento de poder instituinte.(15)<br />

Esta perspectiva penetra fundo os campos de saber sobre o sexo, o corpo e<br />

o gênero, na medida em que a categorização binária do humano passa a ser<br />

uma identidade passível de dissolução, já que constituídas em práticas<br />

discursivas e históricas, que segundo Foucault “(…) tomam corpo em<br />

conjuntos técnicos, em instituições, em esquemas de comportamento, em<br />

tipos de transmissão e de difusão, em formas pedagógicas que as impõem e<br />

mantém, ao mesmo tempo.” (16).<br />

A desnaturalização das funções sexuadas e dos corpos marcados<br />

biologicamente - como veremos adiante - se faz a partir da própria noção de<br />

prática discursiva, “(…) este conjunto de regras anônimas, históricas, sempre<br />

determinadas no tempo e no espaço”(17), que permite a identificação dos<br />

lugares de fala e de autoridade instituindo o sexo e constituindo os corpos<br />

como eixo de partilha do mundo.<br />

De fato, como aponta Foucault, o alvo é a decodificação do regime instituído<br />

de produção da verdade - verdade sobre a identidade humana, que se<br />

cristalizou na divisão sexual e binária da sociedade. É nesta ótica que Teresa<br />

de Lauretis estima encontrar o sujeito do feminismo: não seria A mulher,<br />

nem as mulheres, mas um construto teórico, uma forma de<br />

conceptualização, de compreender e explicitar certos processos,(18) entre

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!