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Amigos Leitores - Intervenção urbana

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Em contraste com o ciborg de Clynes/Kline, que foi concebido como um "<br />

super-homem" capaz de sobreviver em ambientes não-terrestres e hostis, o<br />

ciborg é, para Haraway, um produto da terra pós-capitalista. Mantendo sua<br />

ecologia tradicional, aconteceu que o ser humano foi redesenhado como<br />

uma entidade que poderia transgredir as fronteiras simbólicas e sociais<br />

terrenas entre o homem e o animal, entre o organismo humano como<br />

animal e a máquina, entre o físico e não-físico (Haraway, 1991:151-3).<br />

Negociada de acordo com o contexto histórico recente, a transgressão foi,<br />

ao mesmo tempo, tratada em termos de ficção científica e dos mundos<br />

culturais cotidianos do pós-modernismo e do capitalismo multinacional póscolonial.<br />

Distinguindo-se do ciborg de Clynes e Kline, o ciborg harawayiano exibiu<br />

duas outras características, que o aproxima das mais recentes imagens<br />

populares do ciborg, tais como apresentados no filme RoboCop e na série O<br />

Exterminador do Futuro. Influenciado pela ficção científica feminista, tal<br />

ciborg foi concebido para ser "uma criatura em um mundo pós-gênero"; e já<br />

que foi concebido como um mentor social e político, foi retratado<br />

(mantendo suas "origens ilegítimas") como "de oposição, utópica e<br />

completamente sem inocência", no sentido em que está resolutamente<br />

comprometido com "a parcialidade, ironia, intimidade e perversidade"<br />

(Haraway, 1991:150, 151). Precisamente neste sentido múltiplo é que<br />

Haraway sugeriu que o ciborg poderia se tornar "nossa ontologia" e que<br />

poderia dar-nos "nossa política " (Haraway, 1991:150). Na medida em que<br />

política e ontologia progressistas o asseguravam, ele se tornou apto a<br />

circunscrever, em espírito se não no nome, suas origens militares e<br />

industriais (Haraway,1991:150).<br />

Como Wiener sugeriu, as origens imediatas da palavra "cibernética" podem<br />

ser remontadas à pesquisa militar associada aos programas específicos de<br />

pesquisa universitário interdisciplinares do pós-guerra (Heims, 1993,;<br />

131<br />

Bowker, 1993). Porém, o ciborg também exibe uma genealogia similar, com<br />

uma inflexão diferente, na medida que é produto híbrido do programa<br />

espacial norte-americano e um laboratório de pesquisa médica (Clynes e<br />

Kline eram na ocasião [1960] os pesquisadores do Rockland Hospital Estatal,<br />

Orangeburg, Nova Iorque). Em contrapartida, o ciborg da socialista e<br />

feminista Haraway foi criação em comum do ativismo político e radicalismo<br />

acadêmico da metade dos anos 80. A distinção entre as duas categorias de<br />

ciborg pode ser traçada pelos respectivos antecedentes dos seus autores.<br />

Enquanto o corpo fisiologicamente ecológico, "o problema de corpoambiente"<br />

(Clynes e Kline, 1960:26), determinou seu primitivo campo<br />

semântico, foram os antecedentes acadêmicos, socialistas e feministas que<br />

determinaram sua rearticulação em termos de gênero e de política por<br />

Haraway.<br />

Como imagem bem adequada ao tempo, o ciborg harawayiano serviu à<br />

consciência oposicionista que surgiu nos anos 80, sobretudo porque<br />

encarnou todas as características contraditórias de uma década que definiu<br />

suas práticas culturais e políticas, no contexto de teoria acadêmica radical,<br />

em termos de pós-modernismo e critérios pós-coloniais de parcialidade,<br />

hibridação, pastiche e ironia brincalhona. Como uma crítica cultural notaria<br />

mais tarde, "a transgressão dos limites da realidade define o ciborg,<br />

tornando-o o conceito pós-moderno" por excelência - ou, de uma<br />

perspectiva inversa: "incerteza é uma característica central do pósmodernismo<br />

e da essência do ciborg " (Springer, 1991:306,310). Na verdade,<br />

como as múltiplas articulações do ciborg oposicionista o sugerem, e como<br />

Clynes já tinha sugerido em 1965, estas reconceitualizações mais recentes<br />

no domínio dos automata foram sintomáticas da incerteza sobre o futuro do<br />

corpo de meados para fins do século XX.<br />

Afinal um ciborg baseado em equipamento pesado integra ou conecta, em<br />

sua forma mais extrema e evocativa, um corpo humano com um ambiente

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