Amigos Leitores - Intervenção urbana
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VAMOS FAZER UM 68?<br />
Carlos Gerbase (gerbase@zaz.com.br)<br />
Li, algumas semanas atrás, um livro que envelheceu assustadoramente (em<br />
seguida explicarei o uso deste advérbio), chamado Um ensaio sobre a<br />
revolução sexual após Reich e Kinsey, de Daniel Guérin, um francês<br />
bissexual, que hoje teria 95 anos (tentei descobrir, via Internet, se ainda está<br />
vivo, mas não consegui). O livro (da Brasiliense, editado em 1980) chegou à<br />
minha casa emprestado pelo meu amigo Moa (ou Moah Cyr, como<br />
queiram), há uns dez anos, mas eu nunca tinha prestado atenção nele<br />
(apesar de nunca tê-lo devolvido; até para isso é preciso um certo<br />
interesse). Mas, depois de rodar Tolerância, atravesso um surto (que alguns<br />
poderão associar a uma adolescência tardia, quiçá doentia) de curiosidade<br />
sobre o tema (a sexualidade humana, suas regras, seus mistérios), que me<br />
levaram a esse Ensaio.., à releitura de O taoísmo do amor e do sexo (do<br />
205<br />
chinês Jolan Chang) e à obra de José Ângelo Gaiarsa (de quem já li três<br />
livros, algo repetitivos, mas sempre incisivos e corajosos).<br />
Mas vou voltar à vaca fria, ou seja, ao livro de Guérin. O dado mais<br />
importante: foi escrito em 1969, ainda sob o tremendo impacto dos<br />
acontecimentos de maio de 68 (e ainda quando os Beatles tocavam e<br />
gravavam juntos; quando o "amor livre" era uma prática, e não uma<br />
lembrança; quando havia uma oposição clara entre direita e esquerda, entre<br />
capitalismo e socialismo; quando o termo "pós-modernidade" não havia<br />
sido cunhado, pois a modernidade ainda parecia ser o melhor remédio<br />
contra o reacionarismo). Em 69, Guérin apontava para um grande número<br />
de manifestações sociais e mudanças comportamentais da juventude<br />
ocidental e profetizava que o final do nosso século assistiria a uma radical<br />
transformação das relações amorosas, com efeitos profundos na família<br />
nuclear e na sociedade.<br />
Para fortalecer seu prognóstico, Guérin fornece ao leitor informações<br />
básicas sobre os trabalhos de Reich (de quem se proclama fã) e de Kinsey (a<br />
quem faz críticas, mas reconhece como pesquisador sério), além de<br />
recuperar algumas idéias básicas de Freud. Enfim, traça um bê-a-bá dos<br />
estudos sobre sexo no século 20, dentro de uma perspectiva "progressista",<br />
ou seja, a de que a humanidade está (ou estava) evoluindo para um estágio<br />
de maior tolerância sexual, em que as minorias seriam mais felizes, porque<br />
menos reprimidas (para Kinsey, a problemática do homossexualismo é<br />
muito representativa, ou muito mais representativa do que parece à maioria<br />
heterossexual). Mas a evolução alcançaria também a maioria da população<br />
ocidental, e seus reflexos já estariam evidentes na crescente liberalização<br />
dos meios de comunicação de massa, nos festivais de rock (onde rola de<br />
tudo), na literatura libertária, nas revistas "para adultos", na indústria da<br />
pornografia, etc.