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II Caderno - Instituto dos Registos e Notariado

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Nº 4/2005 – Maio/Junho/Julho 2005 28<br />

entre outros… – ”, não podemos daí concluir, por<br />

simples argumento “a contrario” que esse bem é<br />

comum, já que fica sempre em aberto a<br />

possibilidade da existência de outros bens próprios<br />

naquelas condições. Não é o caso, pelas razões<br />

antes expostas (ponto 1), da aquisição por<br />

usucapião com fundamento na posse iniciada por<br />

partilha verbal, uma vez que a causa da aquisição,<br />

como então salientámos, é a usucapião e não a<br />

sucessão ou a partilha da herança.<br />

Além <strong>dos</strong> referencia<strong>dos</strong>, são considera<strong>dos</strong><br />

como bens próprios de cada um <strong>dos</strong> cônjuges, no<br />

regime da comunhão de adquiri<strong>dos</strong>, aqueles a que<br />

se referem os artigos 1722.º, n.º1, alínea a), 1723.º<br />

e 1726.º a 1729.º, em nenhum <strong>dos</strong> quais, a nosso<br />

ver, se poderá incluir um prédio adquirido por<br />

usucapião com base em posse iniciada depois da<br />

celebração do casamento. Não obstante, é pelo<br />

recurso à analogia com o que se passa com os<br />

prédios subroga<strong>dos</strong> no lugar de bens próprios –<br />

que conservam essa qualidade – a que se refere a<br />

alínea c) do citado art.º 1723.º (bens adquiri<strong>dos</strong><br />

com dinheiro ou bens próprios de um <strong>dos</strong><br />

cônjuges, desde que a proveniência do dinheiro ou<br />

valores seja devidamente mencionada no<br />

documento de aquisição, ou em documento<br />

equivalente, com intervenção de ambos os<br />

cônjuges) que o Sr. Notário “a quo” procura<br />

explicar a natureza de bem próprio do prédio<br />

relativamente ao qual foi invocada a usucapião<br />

pelo cônjuge que exerceu a posse. Entendemos que<br />

a analogia não procede em absoluto, desde logo<br />

porque tal preceito respeita exclusivamente a bens<br />

subroga<strong>dos</strong> no lugar de bens próprios.<br />

Como se disse, é o início da posse que marca<br />

o momento da aquisição da propriedade por<br />

usucapião, a ele se reportando a titularidade sobre<br />

o bem. Não operando a usucapião automáticamente,<br />

antes carecendo de ser invocada, será que a<br />

alegada posse, exercitada apenas por um <strong>dos</strong><br />

cônjuges – ainda que de acordo com a declaração<br />

de ambos – pode subtrair o prédio sobre o qual<br />

recaiu à qualificação como bem comum do casal<br />

(atento o facto do seu início ocorrer na constância<br />

do matrimónio), considerada a presunção de<br />

comunhão fixada pela referida alínea b) do artigo<br />

1724.º? A resposta afirmativa a esta interrogação<br />

significaria deixar na disponibilidade da vontade<br />

<strong>dos</strong> cônjuges a determinação da natureza <strong>dos</strong> bens,<br />

tornando-a independente do regime matrimonial<br />

adoptado – quer por virtude da celebração de<br />

convenção antenupcial, quer, na sua falta, da<br />

aplicação do regime legal supletivo – e<br />

desrespeitando, por essa via, o princípio da<br />

imutabilidade das convenções antenupciais e do<br />

regime de bens resultante da lei, tal como é<br />

concebido pelo artigo 1714.º, n.ºs 1 e 2 do Código<br />

citado. 12 Entendido em sentido amplo, este<br />

princípio abrange não só as cláusulas constantes da<br />

convenção ou as normas do regime legalmente<br />

fixado, relativas à administração ou disposição de<br />

bens, mas também a situação concreta <strong>dos</strong> bens<br />

<strong>dos</strong> cônjuges que interessa às relações entre eles.<br />

A regra da imutabilidade proíbe, assim, a<br />

celebração de negócios que, por forma directa ou<br />

indirecta, impliquem modificação das massas<br />

patrimoniais pertencentes ao casal, ou seja, é<br />

vedado aos cônjuges a modificação do seu estatuto<br />

patrimonial depois da celebração do casamento. 13<br />

14<br />

Face ao exposto, como acertadamente se<br />

concluiu no bem elaborado parecer da D.S.J., não<br />

se afigura legalmente admissível determinar em<br />

escritura de justificação que o bem adquirido por<br />

usucapião fundada em posse iniciada na constância<br />

do casamento tem a natureza de bem próprio.<br />

Apenas e ainda, a propósito da discutida<br />

intervenção de ambos os cônjuges como<br />

outorgantes na referida escritura de justificação<br />

notarial, cumpre dizer que a mesma não poderia<br />

explicar 15 a natureza alegadamente própria (de um<br />

12 Vide Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, ob. cit.,<br />

pág. 532: “… não é só o regime de bens convencionado<br />

pelos nubentes que não pode ser modificado na constância<br />

do matrimónio, mas também o regime supletivo que, na falta<br />

de convenção, se aplica por determinação da lei nos termos<br />

do art.º 1717.º.”. (Destaca<strong>dos</strong> a negro nossos)<br />

13 Como referiu Pires de Lima, in Rev. Leg. Jur., ano 99.º,<br />

pág. 172: “Não podem bens próprios entrar na comunhão;<br />

não podem bens comuns ser atribuí<strong>dos</strong> em propriedade<br />

exclusiva a qualquer deles; não podem ser transmiti<strong>dos</strong>,<br />

onerosa e irrevogavelmente, os bens de um para outro.”.<br />

14 Esta é também a orientação perfilhada pelo Conselho<br />

Técnico, v. g., in P.º R.º P.º 174/2000 DSJ-CT, publicado<br />

no B.R.N. <strong>II</strong>, 2/2001.<br />

15 Como parece ter entendido o Ex.mo Notário: “… a<br />

intervenção do cônjuge não titular só se entende, salvo

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