II Caderno - Instituto dos Registos e Notariado
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Nº 4/2005 – Maio/Junho/Julho 2005 66<br />
disposição que regula o modo como se completam<br />
os registos lavra<strong>dos</strong> por recolha de elementos de<br />
títulos estrangeiros: “a transcrição pode ser<br />
completada, por averbamento, com base em<br />
declarações <strong>dos</strong> interessa<strong>dos</strong>, provadas<br />
documentalmente”.<br />
Concluímos, pois, que, sendo certo que o<br />
registo de óbito tem por base uma declaração<br />
verbal (art.º 192º, n.º 1 do CRC), produzida por<br />
uma das pessoas a quem a lei confere legitimidade<br />
(art.º 193º, n.º 1), para se introduzir nele, por<br />
averbamento, qualquer menção que inicialmente<br />
tenha ficado omissa, a prova de tal elemento terá<br />
que ser apreciada pelo conservador que só vai<br />
permitir que ela se registe após verificar a sua<br />
exactidão e legalidade. Entronca tal critério nos<br />
princípios orientadores do registo civil.<br />
A primeira questão parece, pois, estar<br />
resolvida.<br />
2.2. Debrucemo-nos sobre a segunda: valor<br />
e eficácia das decisões de tribunais estrangeiros.<br />
As decisões <strong>dos</strong> tribunais estrangeiros<br />
relativas ao estado e à capacidade <strong>dos</strong> portugueses<br />
para serem registadas, por meio de averbamento,<br />
aos assentos a que respeitem, têm que ingressar na<br />
ordem jurídica portuguesa através de um processo<br />
previsto e regulado no art.º 1094º do Código de<br />
Processo Civil (CPC), sem prejuízo do que se ache<br />
estabelecido em trata<strong>dos</strong> ou convenções. É este o<br />
conteúdo do art.º 7º do CRC.<br />
No caso vertente, o falecido era divorciado<br />
por sentença proferida por tribunal canadiano. Na<br />
ausência de qualquer acordo entre Portugal e o<br />
Canadá, para registar tal divórcio ao casamento há<br />
que submeter a decisão à apreciação, pelo tribunal<br />
da relação competente, <strong>dos</strong> requisitos elenca<strong>dos</strong> no<br />
art.º 1096º do CPC. Disso não há qualquer dúvida.<br />
O artigo 1094º, n.º 1 do CPC emprega a<br />
expressão “eficácia”, quando estabelece que<br />
“nenhuma decisão sobre direitos priva<strong>dos</strong>,<br />
proferida por tribunal estrangeiro…tem eficácia<br />
em Portugal, seja qual for a nacionalidade das<br />
partes, sem que esteja revista e confirmada”. Por<br />
seu turno, resulta do disposto no art.º 7º, n.º 1 do<br />
CRC que, após prévia revisão e confirmação, as<br />
decisões de tribunais estrangeiros relativas ao<br />
estado ou à capacidade civil <strong>dos</strong> portugueses são<br />
registadas aos assentos a que respeitem.<br />
O n.º 2 do referido preceito do CPC<br />
permite que, para que a decisão de tribunal<br />
estrangeiro seja invocada como simples meio de<br />
prova, em processo pendente nos tribunais<br />
portugueses, não seja necessária a revisão e<br />
confirmação, sujeitando-se apenas à apreciação de<br />
quem julgar a causa.<br />
A Senhora Conservadora consulente<br />
explana bem, na análise do problema, as razões da<br />
doutrina 2 e da jurisprudência 3 , razão pela qual<br />
citamos directamente da consulta. Conclui que,<br />
para que a sentença estrangeira seja invocada<br />
como prova, não necessita de ser revista e<br />
2 Diz-se na consulta: “Como defende Luís de Lima Pinheiro,<br />
em Direito Internacional Privado, volume <strong>II</strong>I, Competência<br />
Internacional e reconhecimento de Decisões Estrangeiras, a<br />
letra do n.º 1 do citado artigo (1094º do CPC) parece<br />
subordinar à revisão to<strong>dos</strong> os mo<strong>dos</strong> de relevância das<br />
sentenças estrangeiras. O n.º 2 do mesmo artigo esclarece<br />
que não é necessária revisão para que a sentença possa<br />
ser invocada como meio de prova sujeito à apreciação do<br />
juiz. Deve ser atribuído à sentença estrangeira o valor<br />
probatório reconhecido a outros documentos autênticos<br />
passa<strong>dos</strong> em país estrangeiro. Decorre da conjugação <strong>dos</strong> n.º<br />
1 do art.º 365º com o n.º 1 do art.º 371º do CC, que os<br />
documentos autênticos passa<strong>dos</strong> no estrangeiro fazem prova<br />
plena <strong>dos</strong> factos neles atesta<strong>dos</strong> com base nas percepções da<br />
entidade documentadora, ao passo que os meros juízos<br />
pessoais do documentador só valem como elementos sujeitos<br />
a livre apreciação do Julgador. Assim a sentença constitui<br />
prova plena <strong>dos</strong> testemunhos e documentos que refere,<br />
mas as conclusões que daí retira não se impõem ao tribunal<br />
português.”<br />
3 Seguindo ainda a conservadora consulente, na citação da<br />
jurisprudência: “Como se refere no Acórdão do Tribunal da<br />
Relação do Porto de 19 de Julho de 1983, a acção de<br />
revisão de sentença estrangeira é uma acção declarativa<br />
de simples apreciação, e uma acção deste tipo não cria, não<br />
constitui uma situação nova. Declara, tão só, que ela existe<br />
(apreciação positiva) ou não existe (apreciação negativa),<br />
reconhece ou aprecia uma situação pré existente. Daí vem<br />
que os efeitos da sentença proferida na acção declarativa se<br />
produzem “ex-tunc”. As sentenças constitutivas têm apenas<br />
eficácia “ex-nunc”, criam situações novas, um estado<br />
jurídico novo: são as sentenças de separação de pessoas e<br />
bens e de divórcio. São também as sentenças estrangeiras<br />
relativas ao estado das pessoas, ou melhor, que decretem a<br />
separação judicial e a conversão desta em divórcio, por<br />
exemplo. Mas para que tenham validade em Portugal, têm de<br />
ser revistas e confirmadas. Só depois de revistas e<br />
confirmadas os seus efeitos retroagem à data da<br />
propositura das acções em que foram proferidas.”