II Caderno - Instituto dos Registos e Notariado
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Nº 4/2005 – Maio/Junho/Julho 2005 61<br />
Tudo decorre afinal do disposto nos art.ºs<br />
1.º, al. b), 2.º, n.º 1, 3.º e 4.º do CRC, a que atrás<br />
fizemos referência, bem como nos art.ºs 1797.º<br />
aludido, e 1802.º do CC.<br />
Há, pois, regras para o estabelecimento da<br />
filiação por forma a que o vínculo de base natural<br />
possa ser reconhecido na ordem jurídica.<br />
A filiação materna e paterna são, contudo,<br />
basilarmente diferentes como bem se alcança do<br />
estatuído no art.º 1796.º do CC, artigo que, de<br />
forma genérica, enuncia o modo de<br />
estabelecimento da maternidade e da paternidade.<br />
Resulta deste normativo que conhecida a<br />
mãe biológica fica automaticamente sabida a mãe<br />
jurídica. A filiação em relação à mãe funda-se,<br />
pois, essencialmente no nascimento, sem se<br />
distinguir se o filho provém ou não do casamento<br />
<strong>dos</strong> pais.<br />
Pires de Lima e Antunes Varela 7 notam,<br />
contudo, que: “ esse tratamento conjunto ou<br />
indiscriminado ditado pela Constituição não<br />
impede que no n.º 2 do artigo 1796.º a lei distinga<br />
(tanta est vis naturae) entre os filhos nasci<strong>dos</strong> fora<br />
e os filhos nasci<strong>dos</strong> dentro do casamento e que<br />
para o estabelecimento da paternidade fixe,<br />
naturalmente, critérios distintos (art.s 1847.º e<br />
sgs.) num e noutro caso.<br />
Para os filhos nasci<strong>dos</strong> de mãe casada, vale a<br />
presunção estabelecida no início do n.º 2 do artigo<br />
1796.º (…); para os filhos nasci<strong>dos</strong> fora do<br />
casamento, a paternidade só se estabelece através<br />
do reconhecimento (emanado de declaração do<br />
próprio ou de decisão judicial)”.<br />
Por outras palavras, F. Brandão Ferreira<br />
Pinto 8 no que respeita ao estabelecimento da<br />
paternidade observa:<br />
“…e porque esta já não é um facto ostensivo,<br />
pois nunca dela se pode ter uma certeza tão<br />
absoluta como a resultante da constatação de um<br />
parto, recorre-se a uma presunção para afirmar que<br />
o pai é o marido da mãe e na hipótese de<br />
maternidade de mãe solteira, viúva, divorciada ou<br />
separada judicialmente de pessoas e bens, a<br />
7 Código Civil Anotado, Volume V, Coimbra Editora, 1995,<br />
pág.ªs 4 e 5.<br />
8 F. Brandão Ferreira Pinto, obra citada, pág.ªs 47 e48.<br />
paternidade estabelece-se por reconhecimento, que<br />
pode resultar de perfilhação ou de decisão judicial<br />
proferida em acção própria”.<br />
Também Guilherme de Oliveira 9 considera<br />
que, sendo a paternidade e a maternidade factos<br />
biológicos a que a lei dá relevância jurídica, é no<br />
que respeita à prova que se acentua o seu carácter<br />
diverso.<br />
“A dificuldade - que faz a diferença - está<br />
somente na circunstância de não poder provar-se o<br />
facto biológico da paternidade como se demonstra<br />
um parto”.<br />
Assim, refere, enquanto o n.º 1 do art.º<br />
1796.º do CC tem a intenção determinada de<br />
vincar a total sujeição da lei ao facto biológico da<br />
maternidade, o n.º 2 do mesmo artigo, relativo à<br />
paternidade, limita-se a sintetizar vagamente as<br />
formas de estabelecimento jurídico do vínculo.<br />
Compreende-se, pois, que várias pessoas<br />
possam declarar o facto ostensivo da maternidade<br />
e que a declaração da mãe possa ser tácita,<br />
enquanto, diversamente, acrescenta, só o pretenso<br />
pai deva fazer a declaração expressa de<br />
perfilhação.<br />
Decorre <strong>dos</strong> art.ºs 1847.º do CC e 148.º do<br />
CRC que a paternidade só pode, pois, estabelecerse<br />
por reconhecimento voluntário ou judicial, ou,<br />
por força da lei, quando da declaração de<br />
maternidade resulte a presunção de paternidade.<br />
Presunção esta que se encontra definida no art.º<br />
1826.º do CC, e que o art.º 1835.º do mesmo<br />
diploma determina que conste obrigatoriamente do<br />
registo do nascimento do filho, não sendo<br />
admitidas menções que a contrariem, salvo nos<br />
casos previstos na própria lei.<br />
Da lei e doutrina teremos que concluir que<br />
sendo a mãe casada, e não afastando esta a<br />
presunção de paternidade nos termos legais<br />
aplicáveis, é imperioso o lançamento da presunção<br />
legal da paternidade, fazendo constar no registo de<br />
nascimento como pai do registando o marido da<br />
mãe. Se a mãe for solteira o reconhecimento<br />
paterno é feito por perfilhação voluntária, ou, se<br />
esta não existir, por reconhecimento judicial. O<br />
mesmo sucede quanto à mãe viúva ou divorciada,<br />
9 Estabelecimento da Filiação, Livraria Almedina, Coimbra<br />
1991, pág.ªs 7 a 10.