II Caderno - Instituto dos Registos e Notariado
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Nº 4/2005 – Maio/Junho/Julho 2005 62<br />
desde que à data do nascimento se mostre afastada<br />
a presunção legal de paternidade ou que, a existir,<br />
por ela seja expressamente afastada.<br />
Sendo o casamento um facto sujeito a registo<br />
e acarretando a falta deste, como vimos, a<br />
respectiva ineficácia, questiona-se Tomás Oliveira<br />
e Silva 10 sobre em que medida se projecta essa<br />
ineficácia no estabelecimento da presunção legal<br />
de paternidade adveniente de um casamento não<br />
integrado à data da declaração do nascimento.<br />
Considera este autor que sempre que o<br />
declarante do registo de nascimento afirme um<br />
estado civil que não pode provar, por,<br />
designadamente, o casamento ter sido contraído no<br />
estrangeiro, o funcionário do registo civil pode<br />
tomar a atitude pragmática de “fazer ouvi<strong>dos</strong> de<br />
mercador”, aceitando o casamento e a consequente<br />
presunção de paternidade. Isto porque, refere, a lei<br />
não exige que, no acto de registo de nascimento,<br />
seja feita a prova do estado civil da mãe do<br />
registado.<br />
Este autor enumera algumas situações<br />
práticas de estado civil declarado diferente do que<br />
consta do registo civil português, perspectiva as<br />
vantagens e inconvenientes de cada possibilidade<br />
de actuação por parte do registo civil, sempre<br />
defendendo como preferível a aceitação da<br />
declaração actual, correndo embora o risco do<br />
funcionário extrair efeitos jurídicos de um facto<br />
que pode nunca vir a ser integrado no regime<br />
jurídico nacional ou até, porventura, nunca ter<br />
ocorrido. E conclui:<br />
“…as considerações…a respeito das<br />
vantagens e inconvenientes de cada uma das<br />
orientações (sobre a incidência da falta de registo<br />
do casamento da mãe na existência da presunção<br />
de paternidade), fazem inclinar o fiel da balança<br />
para a solução pragmática, indicada em primeiro<br />
lugar. Mas se isto constitui um bom apoio na<br />
análise temática “de jure constituendo”, será<br />
insuficiente todavia, para um juízo “de jure<br />
constituto”.<br />
10 Filiação- Constituição e Extinção do Respectivo Vínculo,<br />
Livraria Almedina, Coimbra 1989, pág.as 109 a 112 e 314 a<br />
316.<br />
Ora, e tal como se referiu no Proc.CC<br />
97/2004 DSJ-CT, o princípio da unidade registral<br />
que enforma o instituto do registo civil português<br />
não permite que se acolha num assento (no nosso<br />
caso o de nascimento de um filho) um estado civil<br />
que não se pode registar num outro (o de<br />
casamento <strong>dos</strong> pais).<br />
Acresce que outro <strong>dos</strong> princípios<br />
fundamentais do direito em geral, e do registo civil<br />
em particular, é o da certeza registral, em defesa<br />
do qual militam to<strong>dos</strong> os coman<strong>dos</strong> legais a que já<br />
nos referimos e em cujo cumprimento nos temos<br />
de envolver.<br />
Ora, se por um lado a lei não recusa, no<br />
momento da declaração do nascimento, a<br />
elaboração desse registo no caso de se não dispôr<br />
de prova das declarações apresentadas, verdade é<br />
também que a própria lei recomenda que, sempre<br />
que possível, devem ser exibi<strong>dos</strong> os documentos<br />
de identificação <strong>dos</strong> pais – art.º 102.º, n.º 2 – e, no<br />
n.º 3 do mesmo normativo, estabelece-se:<br />
“O funcionário que receber a declaração<br />
deve averiguar a veracidade das declarações<br />
prestadas, em face <strong>dos</strong> documentos exibi<strong>dos</strong>, <strong>dos</strong><br />
registos em seu poder e das informações que lhe<br />
for possível obter”.<br />
O cumprimento deste preceito impõe-se de<br />
forma especial sempre que o estado civil da mãe<br />
não é o de solteira, atentas as consequências<br />
decorrentes do estabelecimento da presunção de<br />
paternidade, a que se fez referência.<br />
2.3. Também na jurisprudência tem sido esta a<br />
orientação desde sempre firmada, como decorre da<br />
conclusão do Acórdão do Supremo Tribunal de<br />
Justiça, de 10 de Janeiro de 1984, Proc. 71153:<br />
“ Não pode produzir efeito em Portugal o<br />
facto constante de sentença francesa de divórcio<br />
não confirmada em Portugal, nomeadamente, a<br />
cessação da coabitação, para o efeito de afastar a<br />
presunção de paternidade nos termos do artigo<br />
1829.º do Código Civil”.<br />
Por outro lado, nos Serviços Jurídicos da<br />
Direcção – Geral a posição que ao longo do tempo<br />
tem sido genericamente assumida, como nos Proc.s<br />
93 RC 17, 249 RC 18 e 489 RC 20, é no sentido de<br />
que o estado civil <strong>dos</strong> pais a mencionar no registo