Reflexões: Descomplicando os impostos
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Tributação do Imobiliário<br />
Terren<strong>os</strong> para construção<br />
e o AIMI: Crónica<br />
de uma morte anunciada<br />
96<br />
BRUNA MELO<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
A discussão remonta<br />
ao final de 2016, altura<br />
em que a criação<br />
de um novo imp<strong>os</strong>to,<br />
o Adicional ao IMI<br />
(AIMI) ou, para alguns,<br />
o “imp<strong>os</strong>to Mortágua”,<br />
é aprovado pelo<br />
Parlamento<br />
em conjunto<br />
com o Orçamento<br />
do Estado para 2017.<br />
Sucessor da verba 28 do Imp<strong>os</strong>to<br />
do Selo (aplicável sobre <strong>os</strong> imóveis<br />
de luxo de valor superior a<br />
um milhão de eur<strong>os</strong>), este novo<br />
imp<strong>os</strong>to foi pensado para incidir<br />
sobre as pessoas singulares<br />
e coletivas (e ainda heranças<br />
indivisas) que sejam proprietári<strong>os</strong><br />
ou detenham determinad<strong>os</strong><br />
direit<strong>os</strong> (por exemplo, usufruto),<br />
sobre prédi<strong>os</strong> urban<strong>os</strong> em Portugal.<br />
O objetivo da introdução do<br />
AIMI no n<strong>os</strong>so já complexo sistema<br />
fiscal foi anunciado como<br />
uma medida de forte impacto<br />
p<strong>os</strong>itivo: promover a equidade<br />
fiscal, através da tributação das<br />
pessoas e empresas com maior<br />
capacidade contributiva revelada<br />
pela detenção de imóveis.<br />
Algumas vozes mais à direita<br />
prontamente reclamaram a necessidade<br />
de estímulo à atividade<br />
económica, premente à data<br />
da discussão e p<strong>os</strong>ta em causa<br />
pelo novo imp<strong>os</strong>to. Reconhecendo<br />
o mérito ao então invocado<br />
objetivo extrafiscal, depressa o<br />
legislador se propôs a excluir<br />
do âmbito do AIMI <strong>os</strong> prédi<strong>os</strong><br />
urban<strong>os</strong> classificad<strong>os</strong> como<br />
«comerciais, industriais ou para<br />
serviç<strong>os</strong>» (excluindo porém do<br />
imp<strong>os</strong>to, não as empresas com<br />
atividades económicas produtivas,<br />
industriais ou fabris, que em<br />
regra não são proprietárias mas<br />
apenas arrendatárias deste tipo<br />
de imóveis, mas sim as sociedades<br />
e fund<strong>os</strong> imobiliári<strong>os</strong> que<br />
detêm este tipo de imóveis para<br />
a respetiva exploração) e como<br />
«outr<strong>os</strong>», de entre uma lista que<br />
inclui ainda prédi<strong>os</strong> urban<strong>os</strong><br />
classificad<strong>os</strong> como “habitacionais”<br />
e “terren<strong>os</strong> para construção”.<br />
Depressa esta norma de exclusão<br />
se tornou o epicentro de<br />
um tornado de discussões jurídicas<br />
e fonte de um número avultado<br />
de litígi<strong>os</strong> entre a Autoridade<br />
Tributária e Aduaneira (AT) e<br />
<strong>os</strong> contribuintes, que reclamaram<br />
desde cedo que da exclusão<br />
do AIMI abrangesse igualmente<br />
<strong>os</strong> terren<strong>os</strong> para construção de<br />
prédi<strong>os</strong> que se destinassem a<br />
comércio, indústria ou serviç<strong>os</strong>.<br />
Para este efeito invocaram, entre<br />
outr<strong>os</strong> argument<strong>os</strong>, a necessidade<br />
de a norma de exclusão do<br />
AIMI ser interpretada de forma<br />
extensiva, de modo a abranger<br />
não apenas <strong>os</strong> prédi<strong>os</strong> urban<strong>os</strong><br />
classificad<strong>os</strong> como «comerciais,<br />
industriais ou para serviç<strong>os</strong>»<br />
mas também, em linha com a<br />
alegada intenção do legislador,<br />
<strong>os</strong> terren<strong>os</strong> destinad<strong>os</strong> à construção<br />
desses mesm<strong>os</strong> prédi<strong>os</strong>.<br />
Isto sob pena de a norma preconizar<br />
um tratamento discriminatório<br />
injustificado entre as primeiras<br />
e segundas situações em<br />
desconformidade com <strong>os</strong> princípi<strong>os</strong><br />
constitucionalmente protegid<strong>os</strong><br />
da igualdade e capacidade<br />
contributiva, especialmente por<br />
<strong>os</strong> prédi<strong>os</strong> no estágio de terren<strong>os</strong><br />
para construção serem indiciadores<br />
de menor capacidade<br />
contributiva que aqueles que<br />
estejam já edificad<strong>os</strong>.<br />
A AT tem vindo naturalmente a<br />
indeferir as pretensões d<strong>os</strong> contribuintes,<br />
considerando que foi<br />
intenção expressa e consciente<br />
do legislador a de incluir no âmbito<br />
de aplicação do AIMI determinad<strong>os</strong><br />
prédi<strong>os</strong> suscetíveis de<br />
integrar o ativo das empresas,<br />
como sejam <strong>os</strong> terren<strong>os</strong> para<br />
construção, e que a liquidação<br />
do imp<strong>os</strong>to deve atender à natureza<br />
do prédio à data relevante<br />
para a tributação e não a uma<br />
potencial edificação futura.<br />
Foi com bons olh<strong>os</strong> que o mercado<br />
recebeu as primeiras decisões<br />
d<strong>os</strong> tribunais arbitrais<br />
(CAAD) favoráveis ao contribuinte,<br />
ainda em 2017, na sequência<br />
d<strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> por estes interp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
das decisões da AT, as quais<br />
defenderam a necessidade de<br />
interpretação extensiva da norma<br />
que determina a exclusão de<br />
determinad<strong>os</strong> prédi<strong>os</strong> do AIMI,<br />
por forma a nela abranger <strong>os</strong><br />
terren<strong>os</strong> para construção de prédi<strong>os</strong><br />
afet<strong>os</strong> a comércio, indústria<br />
e serviç<strong>os</strong>.<br />
Na medida em que as decisões<br />
do CAAD recaíram sobre questões<br />
de inconstitucionalidade<br />
das normas que enformam o<br />
AIMI, suscitadas pel<strong>os</strong> contri-