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Delírio do Verbo: O Jornalismo Gonzo e a realidade ... - Flanador

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20). Tal definição, embora simplista diante da diversidade da atividade jornalística como<br />

um to<strong>do</strong>, é condizente com a concepção de jornalismo como anti-gonzo. Em cada palavra<br />

dessa definição reside um aspecto importante <strong>do</strong> fazer jornalístico convencional, como<br />

objetividade, captação, <strong>realidade</strong>, difusão, recepção etc. Cada um a seu mo<strong>do</strong>, esses fatores<br />

(que não atuam isoladamente) são o motor da crise pela qual passa o jornalismo<br />

contemporâneo.<br />

Mas, antes de analisar a crise <strong>do</strong> jornalismo, temos que defini-lo enquanto objeto<br />

de estu<strong>do</strong>. Michael Kunczik encara o jornalismo, mais <strong>do</strong> que como uma prática ou<br />

discurso, como atividade profissional em si. Para ele, “o jornalismo é considera<strong>do</strong> a<br />

profissão principal ou suplementar das pessoas que reúnem, detectam, avaliam e difundem<br />

as notícias” (KUNCZIK, 2001: 16). Dessa definição, contu<strong>do</strong>, podemos tirar o único fator<br />

de convergência entre a maioria <strong>do</strong>s autores que analisam a questão jornalística: a notícia é<br />

a matéria-prima, o produto principal da atividade jornalística. A concepção <strong>do</strong> jornalismo<br />

intrinsecamente atrela<strong>do</strong> à notícia é tão forte que, para alguns, a própria acepção <strong>do</strong> termo<br />

acaba por reduzir-se ao ponto em que a atividade jornalística passe a ser tomada como o ato<br />

de “transformar os acontecimentos - ou, por vezes, simples informações - em notícias, pelo<br />

fato de as publicar" (GAILLARD, 1974: 23).<br />

Nilson Lage prefere considerar a notícia, no seu senti<strong>do</strong> mais amplo, e desde o<br />

tempo mais antigo, como o mo<strong>do</strong> corrente de transmissão da experiência, isto é, a<br />

articulação simbólica que transporta a consciência <strong>do</strong> fato a quem não o presenciou. Esta<br />

definição nos permite desvincular a notícia <strong>do</strong>s meios de comunicação de massa e trazê-la a<br />

uma infinidade de suportes. Basea<strong>do</strong> nesta concepção, talvez, o escritor Gabriel García<br />

Márquez deu a um de seus livros o nome Notícia de um seqüestro. Resulta<strong>do</strong> de intenso<br />

trabalho de apuração jornalística, a obra retrata as minúcias de dez seqüestros ocorri<strong>do</strong>s no<br />

início da década de 90. No entanto, o início da obra já nos dá pistas para atingirmos nosso<br />

principal foco: o relato como construção da <strong>realidade</strong>.<br />

Antes de entrar no automóvel olhou por cima <strong>do</strong> ombro para ter certeza de que ninguém a<br />

espreitava. Eram sete e cinco da noite em Bogotá. Havia escureci<strong>do</strong> uma hora antes, o<br />

Parque Nacional estava mal ilumina<strong>do</strong> e as árvores sem folhas tinham um perfil<br />

fantasmagórico contra o céu turvo e triste, mas não havia à vista nada a temer (GARCÍA<br />

MÁRQUEZ, 1996: 7)<br />

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