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Delírio do Verbo: O Jornalismo Gonzo e a realidade ... - Flanador

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3.1.1 – A notícia como construção de pseu<strong>do</strong>-<strong>realidade</strong>s<br />

“Devemos começar descartan<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s os fatos...” – Rousseau<br />

A notícia, quan<strong>do</strong> "vira" merca<strong>do</strong>ria, fica passível de ser moldada segun<strong>do</strong><br />

padrões merca<strong>do</strong>lógicos, ou seja, será confeccionada de mo<strong>do</strong> atrair a atenção <strong>do</strong><br />

leitor/consumi<strong>do</strong>r, com to<strong>do</strong>s os seus apelos estéticos, emocionais e sensacionais. Nesse<br />

mun<strong>do</strong>-cão, vem novamente à tona o velho dita<strong>do</strong> jornalístico “Se um cachorro morde um<br />

homem, não há notícia. Se o homem morde o cachorro, isso é notícia”. Para Leão Serva, a<br />

práxis jornalística que é justificada e resumida através desse dita<strong>do</strong> é o de “destacar e<br />

noticiar o raro, o para<strong>do</strong>xo, o imprevisto – o caos, aparente ou verdadeiro. É isso que<br />

caracteriza a notícia, sua matéria-prima” (SERVA, 2001: 50). Esta noção de<br />

sensacionalismo é levada ao extremo na piada que circulou em um <strong>do</strong>s encontros da<br />

Organization of News Ombudsmen, relatada pela então ombudsman da Folha de S.Paulo,<br />

Júnia Nogueira de Sá, sobre a clássica definição <strong>do</strong> homem morden<strong>do</strong> o cachorro:<br />

Se um cachorro morde um homem, isso não é notícia. Se o homem morde o cachorro,<br />

também não é notícia. Se o homem estivesse pagan<strong>do</strong> ao cachorro por seus favores sexuais,<br />

aí sim seria notícia. Mas não seria uma notícia de primeira página. Para ser manchete, o<br />

cachorro tinha de ser menor de idade e o homem deveria ter um cargo importante no<br />

governo. Ou o cachorro e o homem deveriam ter, ambos, o mesmo sexo – a menos que<br />

trabalhassem no cinema, o que transformaria a manchete numa notinha da coluna de<br />

fofocas. Se o cachorro tivesse falsifica<strong>do</strong> o nome de alguém bastante conheci<strong>do</strong> num<br />

cheque, aí seria notícia de novo. Agora, se o cachorro fosse um grande anunciante, o caso<br />

teria muito menos interesse <strong>do</strong> que poderia parecer a princípio.<br />

O recurso ao sensacionalismo torna-se, então, uma das formas de esfacelamento<br />

da <strong>realidade</strong> pelos meios de comunicação. Aquele, que diz fazer o “puro registro <strong>do</strong>s fatos”,<br />

passa a assumir o papel de ficcionista, ten<strong>do</strong> em vista que os princípios clássicos <strong>do</strong><br />

jornalismo teoricamente baseiam-se na idéia de “esclarecer os cidadãos”, relacionada a<br />

critérios de objetividade que dizem respeito ao suposto poder de “verdade” conti<strong>do</strong> nos<br />

próprios fatos. “Em to<strong>do</strong> tipo de comunicação há a necessidade de atrair o receptor [...]<br />

através <strong>do</strong> uso da sensação, da emoção e <strong>do</strong> sentimento, como armadilhas para prender o<br />

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