Delírio do Verbo: O Jornalismo Gonzo e a realidade ... - Flanador
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argumentos com um conceito antitético, mesmo saben<strong>do</strong> que, se tivesse escolhi<strong>do</strong> a ordem<br />
inversa, o resulta<strong>do</strong> teria si<strong>do</strong> diferente. E mais, quan<strong>do</strong> coloco meu pensamento por meio<br />
de citações de teóricos reconheci<strong>do</strong>s, apenas busco reforçar meu ponto de vista acerca <strong>do</strong><br />
tema e fazê-lo pre<strong>do</strong>minar sobre os demais...<br />
Tal como o exemplo anedótico da<strong>do</strong> por Neil Postman de <strong>do</strong>is padres que desejam<br />
saber se podem fumar e rezar ao mesmo tempo. Ambos redigem uma pergunta ao Papa,<br />
mas de uma forma diferente. Por isso obtiveram respostas contraditórias para a mesma<br />
dúvida. Um <strong>do</strong>s padres perguntou: “É permiti<strong>do</strong> fumar enquanto rezo?”, ao que o Papa<br />
respondeu: “Não, enquanto se ora deve estar-se completamente concentra<strong>do</strong> na oração”. O<br />
outro padre então perguntou: “É permiti<strong>do</strong> rezar enquanto fumo?”, e resposta <strong>do</strong> Papa não<br />
foi outra senão: “Claro que sim, pois to<strong>do</strong>s os momentos são apropria<strong>do</strong>s para rezar”.<br />
(TEÓFILO, 1998 – adaptação minha).<br />
A idéia deste desmascaramento é efetuar uma discussão que coloque em xeque o<br />
mito que envolve a produção textual acadêmica e, sobretu<strong>do</strong>, jornalística. O conceito de<br />
objetividade, ti<strong>do</strong> ainda como recurso de ordem nessas duas esferas, precisa, antes de<br />
qualquer coisa, ser revisto. No que concerne à atividade jornalística, a opção pela<br />
objetividade como estratégia de retórica é ainda mais grave, pois afeta a concepção de<br />
mun<strong>do</strong> <strong>do</strong>s receptores dessa mensagem, que, na maioria das vezes, ignoram o contexto no<br />
qual tal conteú<strong>do</strong> foi concebi<strong>do</strong>.<br />
Em suma, o conceito de objetividade está liga<strong>do</strong> à suposta relação existente entre<br />
as declarações jornalísticas e a <strong>realidade</strong>. Em teoria, a objetividade tende a mensurar o grau<br />
de identidade entre o fato e a sua descrição mediante a informação. Para efetuar a primeira<br />
crítica de minha reflexão subjetiva acerca da objetividade, recorramos ao conceito clássico<br />
de notícia que remete ao modelo de perguntas formula<strong>do</strong> há vinte séculos por Quintiliano:<br />
quis, quid, ubi, quibus auxilius, cur, quo-mo<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong>? Uma adaptação dessa lista (ou<br />
interrogatório) derivou no chama<strong>do</strong> lead jornalístico: “quem, o quê, onde, quan<strong>do</strong>, como,<br />
porquê?”. Para Gaillard, uma notícia é uma resposta a estas seis perguntas.<br />
Não há duvida de que a resposta às referidas perguntas ajudaria a transmitir um<br />
fato a um interlocutor. A dúvida reside na seguinte questão: de que mo<strong>do</strong> pode-se atribuir a<br />
um homem o <strong>do</strong>m divino de responder a estas perguntas de mo<strong>do</strong> exato e fidedigno, se ele<br />
é apenas um media<strong>do</strong>r (não-onisciente) entre o fato e o receptor? Sem falar no fato de que<br />
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