Tese Mestrado - Tiago Macaia Martins.pdf - RUN
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superlativa do poder, ou enquanto encarna a perfeição do poder máximo, mas <br />
também como desafiado a encarnar a virtude divina. Ou seja, à superlatividade do <br />
poder, num sentido ôntico, é associada uma superlatividade num sentido deôntico: a <br />
da perfeição ética e moral. Esta estrutura argumentativa assume um carácter <br />
particularmente explícito, por exemplo, na seguinte passagem: “Convém imitar e <br />
tomar isto como modelo: ser por tal forma tido como o mais poderoso de todos <br />
(maximum) que ao mesmo tempo seja tido como o melhor (optimus)” 8 . <br />
Assim, o terreno em que se move a discussão do De Clementia é o terreno de <br />
um discurso sobre a virtude do poder supremo. De sorte que, embora o discurso sobre <br />
a virtude do poder político tome como referencial um discurso sobre a virtude do <br />
poder divino (e este constitua como que o modelo daquele), aquilo a que Séneca se <br />
reporta é um plano de perfeição ética igualmente aplicável nos dois domínios e aquilo <br />
que diz pretende valer igualmente para ambos. <br />
A abordagem da clemência ao longo da obra é complexa, desenvolvendo-‐se <br />
numa teia de determinações com fios condutores ziguezagueantes. A nossa análise <br />
focar-‐se-‐á naquela parte do De Clementia em que o autor sente a necessidade de <br />
definir e delimitar a clemência e, ao fazê-‐lo, trata justamente do problema da aparente <br />
incompatibilidade entre aquela e a justiça 9 . A parte em questão é a que vai do capítulo <br />
três ao sétimo do Livro II. <br />
Nestes capítulos, o problema não está apresentado explicitamente como um <br />
conflito da clemência com a justiça (a que é feita alguma referência, mas não de tal <br />
modo que seja explicitamente referida). No entanto, como veremos, a linha <br />
argumentativa da discussão foca precisamente uma tensão ou conflito cujo segundo <br />
termo tem que ver com o conceito de justiça, supõe esse conceito e acaba por <br />
corresponder precisamente ao quadro de tensão que procuramos analisar neste <br />
estudo. <br />
8<br />
Cf. 1.19.9, “Hoc adfectare, hoc imitari decet, maximum ita haberi, ut optimus simul habeare.”. <br />
9<br />
Também não caberá neste estudo um confronto pormenorizado entre os conceitos abordados <br />
no De Clementia e a forma como são usados noutras obras, quer de Séneca, quer de outros autores seus <br />
contemporâneos. <br />
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