Tese Mestrado - Tiago Macaia Martins.pdf - RUN
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todo o raciocínio seguido até aqui. Com efeito, até este ponto estava em causa saber como é <br />
que a natureza de Deus é coerente: ou seja, como compaginar as qualidades absolutas da <br />
justiça e da bondade. <br />
A afirmação de que justo é o definido pela vontade divina, funciona ao mesmo tempo <br />
como consumação de toda a peça argumentativa e como a sua negação. É a sua consumação, <br />
no sentido em que, diante do conflito absoluto que os atributos punham em evidência, parece <br />
a única solução possível para que o conceito de Deus não entrasse em colapso. A única saída <br />
de um beco sem saída é que o beco perca essa qualidade, ou seja, que as paredes deixem de <br />
ser paredes. Neste sentido, a solução proposta é igualmente a negação de todo o raciocínio <br />
anterior. Se justo é o que Deus quer (ou, para o formularmos mais claramente em português, <br />
se justo é o que Deus quiser), então não é preciso encontrar um modo de coerência dentro da <br />
própria natureza divina: a própria noção de natureza, pelo menos nos termos em que é <br />
discutida ao longo da argumentação, é negada! Não há conflitos entre quaisquer atributos se a <br />
justiça, ou seja, o debitum interno divino, é definida pela vontade divina e assim excluída de <br />
qualquer critério. A visão voluntarista resume todo o paradoxo a um mero exercício <br />
intelectual: Deus perdoa aos maus porque quer, e isso é justo porque assim foi a sua vontade. <br />
A supremacia da vontade funciona então como elemento neutralizador de toda <br />
a questão, a paz resultante de um veneno mortal sobre todos os atributos: a vontade <br />
substitui o sentido. Reduz-‐se a nada o universo deôntico, para se comprar uma <br />
realidade sem contradições. O preço, no entanto, é o de uma realidade sem <br />
significado.<br />
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