Tese Mestrado - Tiago Macaia Martins.pdf - RUN
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“A um, aplicará apenas um correctivo verbal – não infligirá nenhum castigo, por <br />
levar em consideração a sua idade, ainda susceptível de emenda; a outro, <br />
manifestamente consumido por horror ao [seu] crime ordenará que o deixem <br />
incólume, porque foi enganado, porque foi o vinho que o perdeu; aos inimigos deixará <br />
que partam sãos e salvos – e por vezes até os louvará, caso tenham pegado em armas <br />
por causas nobres, em nome da lealdade, em nome de uma aliança, em nome da <br />
liberdade.” 59<br />
Comecemos por um aspecto que estas “obras da clemência” têm em comum 60 : <br />
todos os actos em causa são apresentados com uma fundamentação. Ou seja, nenhum <br />
deles é apresentado como puramente arbitrário. A todos Séneca associa uma razão. <br />
Para esclarecermos a natureza dessa fundamentação, vejamos se as várias <br />
fundamentações possuem algum elemento unificador. <br />
Num caso, o fundamento da clemência está associado à possibilidade de <br />
mudança do padrão de comportamento (“ser susceptível de emenda”), e isto devido à <br />
idade, apesar de a pessoa ter agido, aparentemente, com plena consciência do que <br />
fazia 61 . Neste exemplo, deparamo-‐nos com uma aparente desconsideração da <br />
responsabilidade, que pode ser interpretada, pelo menos, de duas formas. Um dos <br />
modos de analisar a questão é admitir que a tenra idade do transgressor se reflecte na <br />
sua consciência, de tal modo que a responsabilidade é mitigada. A outra forma de <br />
interpretação consiste em admitir que a responsabilidade tenha sido efectivamente <br />
desconsiderada, sob o fundamento de uma mera possibilidade de “emenda” futura; <br />
neste caso, estamos perante uma situação totalmente distinta: o elemento de <br />
59<br />
Cf. 2.7.2, “aliquem uerbis tantum admonebit, poena non adficiet, aetatem eius emendabilem <br />
intuens; aliquem inuidia criminis manifeste laborantem iubebit incolumem esse quia deceptus est, quia <br />
per uinum lapsus; hostes dimittet saluos, aliquando etiam laudatos, si honestis causis pro fide, pro <br />
foedere, pro libertate in bellum acciti sunt.”. <br />
60<br />
Para além da semelhança ao perdão. <br />
61<br />
Note-‐se que esta fundamentação é reforçada numa passagem ulterior: “O sábio desculpará <br />
muita coisa, poupará a vida a muitos de entendimento pouco são, mas ainda assim sanável”. Cf. 2.7.4, <br />
“sapiens multa remittet, multos parum sani sed sanabilis ingenii seruabit.”. O facto de não aparecer <br />
nesta passagem a referência à idade parece diminuir o peso da mesma em comparação com o da <br />
possibilidade de reforma. <br />
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