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Tese Mestrado - Tiago Macaia Martins.pdf - RUN

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ipartição secundum nos/secundum te. A justiça secundum nos é uma reformulação exacta da <br />

“velha justiça”: “Quando punes os maus, é justo porque está de acordo com os seus <br />

méritos” 122 – ou seja, é justo porque Deus age em função dos seus méritos. Por outro lado, a <br />

justiça secundum te, a que está subjacente ao perdão, é definida nos seguintes termos: <br />

“quando […] os perdoas, é justo porque é digno não dos seus méritos mas da tua bondade” 123 ; <br />

a ideia é reforçada mais à frente: “é justo não porque nos retribuas algo devido, mas porque <br />

fazes o que é digno de ti, tu que és sumamente bom” 124 . A questão que levantamos é a <br />

seguinte: que justiça estará em causa neste conceito de secundum te? A primeira característica <br />

deste conceito de justiça é dizer respeito a uma acção: “é justo que faças”. A segunda, e talvez <br />

mais importante: o fundamento da acção (ou seja, a origem da pressão em causa) não é <br />

encontrada em qualquer elemento externo a Deus, mas nos seus próprios atributos – mais <br />

exactamente, na sua bondade. É justo então que Deus perdoe porque está a agir conforme a <br />

sua bondade; mas a segunda passagem remete para o superlativo: sumamente bom. Neste <br />

sentido, de forma mais completa diríamos: justo é que Deus perdoe porque está a agir <br />

conforme ao carácter superlativo da sua bondade. Note-­‐se então que a justiça aqui em causa, <br />

a que reaparece neste ponto sob o nome secundum te corresponde à que foi desenhada a <br />

partir da nova justiça, o tal conceito de justiça em espelho: a justiça do ser (a “nova” justiça) <br />

perspectivada a partir da acção. <br />

Em suma, Anselmo esboça de novo um quadro de oposição secundum nos / secundum <br />

Te, mas agora com um sentido totalmente diferente do que tinha usado no capítulo VIII a <br />

propósito da relação entre a misericórdia e a impassibilidade. No caso da misericórdia, vimos <br />

que a distinção entre o secundum te e o secundum nos residia no facto de associarmos aos <br />

actos imerecidos de Deus uma certa afectação da Sua parte (secundum nos), quando em Deus <br />

não pode haver afectação, em virtude de ser impassível (secundum te). Aqui trata-­‐se de uma <br />

hipótese bastante diferente. A afirmação é que Deus é justo tanto num caso como noutro, <br />

residindo a diferença não necessariamente na nossa perspectiva, mas na origem da pressão <br />

deôntica: num caso, a partir do que a criatura merece (secundum nos), no outro, a partir do <br />

que é devido ao próprio Deus em função da sua natureza – da sua bondade (secundum te). <br />

122<br />

Cf. Proslogion, Cap. X, “Cum enim punis malos, iustum est, quia illorum meritis convenit” <br />

123<br />

Cf. Proslogion, Cap. X, “cum vero parcis malis, iustum est, non quia illorum meritis, sed quia <br />

bonitati tuae condecens est”. <br />

124<br />

Cf. Proslogion, Cap. X, “ita iustus es non quia nobis reddas debitum, sed quia facis quod decet te <br />

summe bonum.”. <br />

70

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