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Tese Mestrado - Tiago Macaia Martins.pdf - RUN

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éticos a que correspondem. <br />

Ainda no que diz respeito ao contexto (bem como ao estilo e ao género do Proslogion, <br />

realçamos um aspecto, que de certo modo já sugerimos, mas que é importante ter presente <br />

para se compreender o que está em causa nas análises do Proslogion. Quando, no Preâmbulo, <br />

S. Anselmo anuncia que vai escrever “por interposta pessoa”, através de uma personagem [sub <br />

persona] –de uma personagem que busca compreender aquilo em que crê –, indica-­‐nos que o <br />

discurso desenvolvido ao longo da obra se dará na voz daquele peregrino a que nos <br />

referimos 81 . Este aspecto tem, por um lado, uma consequência directa no método <br />

argumentativo, que poderíamos talvez adjectivar como “peregrinatório” -­‐-­‐ pois busca as <br />

respostas por vários caminhos e de tal modo que, por vezes, as respostas que dá não <br />

correspondem necessariamente à perspectiva do próprio autor, mas a essa busca (ou <br />

exploração de possibilidades) e a ao estilo próprio desta escrita indagatória ou do género <br />

literário a que pertence. Por outro lado, este “desencontro de consciência” entre o peregrino e <br />

S. Anselmo importa para a compreensão do Proslogion, pois abre a possibilidade de uma <br />

diferença entre o que a personagem diz e o que o próprio autor quer realmente dizer. (e <br />

converte a própria possibilidade dessa diferença numa personagem fundamental do <br />

Proslogion). <br />

Para o início da nossa análise da relação entre a misericórdia e a justiça, que, como se <br />

disse, se centrará nos capítulos IX a XI do Proslogion, recuamos um pouco e procuramos <br />

seguir, em primeiro lugar, o exame das relações entre a misericórdia e a impassibilidade, que <br />

se acha exposto no capítulo VIII. Este “ponto prévio” permite ganhar a pista do conceito de <br />

misericórdia que está em causa no texto de Anselmo, ao mesmo tempo que predelineia alguns <br />

elementos com um papel importante nos capítulos seguintes. <br />

2 – Uma misericórdia impassível <br />

A doutrina da impassibilidade está ligada à ideia de que Deus, sendo perfeito, não é <br />

passível de que outro exerça uma acção sobre si próprio. Importa, antes de mais, ter presente <br />

que, quando Anselmo fala aqui de impassibilidade, estão em causa dois sentidos. Por um lado, <br />

impassibilidade significa a total ausência do que quer que seja correspondente à categoria de <br />

81<br />

Cf. McMahon, Robert, Understanding the Medieval Meditative Ascent, pp. 159-­‐160. McMahon <br />

classifica o Proslogion como um “Christian-­‐Platonist ascent”, e retrata a personagem do Proslogion <br />

como um peregrino numa caminhada (a caminhada, acrescentamos, da peregrinatio vitae). <br />

48

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