Tese Mestrado - Tiago Macaia Martins.pdf - RUN
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passa por virtude 2) o que há de semelhante entre a severidade e a crueldade leva a <br />
esquecer o que há de radicalmente diferente entre ambas, de sorte que se confundem <br />
e a severidade (confundida com a crueldade) passa por um vício. <br />
Aqui, interessa em especial aquilo que é identificado como o contrário da <br />
clemência e a forma como a severidade – em vez de ser compreendida como o oposto <br />
da clemência – é, pelo contrário, apresentada como uma virtude (por assim dizer, a par <br />
da clemência): “Os ignaros pensam que a severidade é contrária à clemência, mas <br />
nenhuma virtude é contrária a outra. Que se opõe então à clemência? A crueldade, <br />
que não é senão uma dureza barbárica do espírito ao punir?” 27 . <br />
Este é o ponto em que temos de focar a nossa atenção. Não é surpreendente <br />
que Séneca defina a crueldade como o contrário da clemência. 28 Esse aspecto não <br />
levanta nenhuma dificuldade especial. Mas já o mesmo não se pode dizer a respeito da <br />
tese apresentada em relação à severidade (e ao nexo entre a severidade e a <br />
clemência). Séneca afirma que não são contrárias, porque ambas são virtudes – e duas <br />
virtudes não podem ser contrárias. A tese que sustenta é a de que a fronteira entre <br />
clemência e severidade não tem nada que ver com a fronteira entre a virtude e o vício. <br />
São ambas virtudes. Quer dizer: a fronteira entre elas é interior à esfera da virtude <br />
enquanto tal. <br />
Ora, como é claro, isto significa o seguinte: o De Clementia não se limita a <br />
admitir (e recomendar como virtude) a suavização da pena devida e merecida. Como <br />
se isso não bastasse, também admite (e recomenda como virtude) a agravação da <br />
pena devida e merecida (a agravação da pena na forma da severidade). Quer dizer, <br />
segundo Séneca, também a ultrapassagem da pena – um desvio por excesso em <br />
relação à poena debita ac merita – pode muito bem não ter nada de errado ou <br />
27<br />
Cf. 2.4.1, “Huic contrariam imperiti putant seueritatem; sed nulla uirtus uirtuti contraria est. <br />
quid ergo opponitur clementiae? Crudelitas, quae nihil aliud est quam atrocitas animi in exigendis <br />
poenis”. <br />
28<br />
Como vimos supra, a crueldade distingue-‐se da clemência essencialmente por dois aspectos. <br />
Por um lado, enquanto a clemência suaviza uma punição, a crueldade agrava-‐a. Por outro lado, <br />
enquanto a clemência leva a essa suavização por via da moderação, a crueldade agrava a punição <br />
justamente por falta daquela moderação – de forma totalmente arbitrária. <br />
20