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Tese Mestrado - Tiago Macaia Martins.pdf - RUN

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clemência, no mesmo sentido em que a crueldade parece semelhante à severidade. A <br />

semelhança reside no facto de a misericórdia, tal como a clemência, se expressar <br />

numa suavização do sofrimento alheio (e, portanto, também numa suavização das <br />

penas). <br />

Analisemos o conceito de misericórdia que Séneca propõe. Séneca introduz a <br />

sua noção de misericórdia (misericordia) como um vício (vitium animi) 31 . A semelhança <br />

com a clemência tem que ver com o aspecto exterior do que está em causa nestes dois <br />

conceitos. Séneca sugere, portanto, que a sua distinção se dá noutro plano. <br />

Vejamos então como. <br />

O conceito de misericórdia é definido como “o vício de um espírito fraco que <br />

sucumbe perante a visão dos males alheios” 32 . A ideia de fraqueza do espírito (animus <br />

pusillis), de afectação, e de falta de auto-­‐controlo 33 é essencial nesta análise e <br />

contrasta com a força e moderação própria da virtude 34 . Séneca adianta ainda que “a <br />

misericórdia não se foca na causa, mas no infortúnio; a clemência está do lado da <br />

razão” 35 , sugerindo que a misericórdia não permite uma visão adequada da situação <br />

que de cada vez se enfrenta. <br />

Na distinção entre a misericórdia e a clemência, Séneca introduz uma figura <br />

que acompanhará a argumentação até ao fim da obra: a figura do sábio. A <br />

identificação deste conceito é de grande relevância para a distinção entre a virtude e o <br />

vício, mais exactamente, para a distinção entre os actos propriamente virtuosos e <br />

31<br />

32<br />

Cf., 2.4.4. <br />

Cf., 2.4.5, “uitium pusilli animi ad speciem alienorum malorum succidentis”. <br />

33<br />

A noção de falta de controlo é levada até às últimas instâncias na noção de aegritudo (doença, <br />

aflição): o conceito de doença afasta-­‐se da noção de que o indivíduo tem algum controlo e aproxima-­‐se <br />

da ideia de inevitabilidade. <br />

34<br />

35<br />

A ideia da virtude enquanto força está profundamente ligada à ideia de masculinidade (uir), que <br />

engloba a força física como a força “de espírito”. Parece ser nesse sentido que Séneca, perto da <br />

definição de misericórdia, dá o exemplo de mulheres como afectadas pelas desgraças alheias. <br />

Cf., 2.5.1, “misericordia non causam, sed fortunam spectat; clementia rationi accedit”. <br />

23

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