Tese Mestrado - Tiago Macaia Martins.pdf - RUN
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a) Moderação <br />
Séneca propõe três formulações preliminares: “a temperança do espírito no <br />
exercício do poder de castigar” 10 ; “a suavidade do superior para com o inferior na <br />
determinação de punições” 11 ; “a inclinação do espírito para suavizar a punição” 12 . <br />
Destas primeiras formulações, podemos inferir alguns elementos importantes <br />
do conceito – algumas das camadas de determinação que o compõem. Em primeiro <br />
lugar, na base de tudo parece haver uma ideia de auto-‐domínio, ou de restrição, <br />
evidenciada em expressões como “temperança do espírito” (temperantia animi), <br />
“suavidade” (lenitas), e “inclinação do espírito à suavidade” (inclinatio animi ad <br />
lenitatem). Esta característica nuclear situa a clemência na categoria de virtudes <br />
associadas à moderatio, que se caracterizam por terem que ver com a ideia de auto-controlo<br />
– de sorte que o virtuoso é aquele que se revela senhor de si. Nesta forma de <br />
auto-‐controlo está implicada a ideia de uma restrição no uso do poder (ou seja, a ideia <br />
de que se fica aquém do que se poderia fazer). Numa palavra, trata-‐se de contenção <br />
no uso de um poder de que se dispõe. Mas, além de tudo isto, se considerarmos a <br />
ideia de moderação, temperança, auto-‐controlo, etc., verificamos que ela sempre diz <br />
respeito a um poder que se tem, mas que nalguns casos esse poder diz respeito <br />
apenas a uma possibilidade da vida própria (v. g., entregar-‐se a este ou àquele prazer). <br />
Noutros casos, pelo contrário (e é isso que está em causa na clemência) trata-‐se <br />
também do poder num outro sentido: o poder sobre outrem. Séneca não aponta <br />
expressamente este aspecto – mas ele está implicado no que diz, como já veremos, e, <br />
na verdade, de forma muito nítida. <br />
Confrontemos este conceito com o vício que Séneca afirma ser o oposto da <br />
clemência, a crueldade (crudelitas): “dureza barbárica [atrocitas] 13 do espírito ao <br />
10<br />
11<br />
12<br />
Cf. 2.3.1, “clementia est temperantia animi in potestate ulciscendi”. <br />
Cf. 2.3.1, “lenitas superioris aduersus inferiorem in constituendis poenis”. <br />
Cf. 2.3.1, “inclinatio animi ad lenitatem in poena exigenda”. <br />
13<br />
A palavra atrocitas, que traduzimos por dureza barbárica, pode igualmente ser traduzida como <br />
atrocidade, monstruosidade, crueldade, rudeza, violência, furor, selvajaria, rigidez, aspereza. Em virtude <br />
do contexto, a grande intensidade da palavra contrasta de pelo menos dois modos: por um lado, com <br />
suavidade (lenitas), por outro, com a noção de moderação (moderatio). Por esse motivo, traduzimo-‐la <br />
12