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Tese Mestrado - Tiago Macaia Martins.pdf - RUN

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continuação do capítulo IX –naquele passo a que podemos chamar o poema da misericórdia. <br />

5 – O poema da misericórdia <br />

“Ó misericórdia! De que opulenta doçura e de que doce opulência jorras para nós! Ó imensidão da <br />

bondade de Deus, com que afecto deves ser amado pelos pecadores! Salvas os justos, com a justiça <br />

a acompanhar-­‐te, libertas aqueles que, ao invés, a justiça condena. Aqueles com a ajuda dos seus <br />

méritos, estes ao arrepio dos seus deméritos; aqueles reconhecendo os bens que lhes deste, estes <br />

ignorando os males que detestas. Ó imensa bondade que excedes assim toda a inteligência, que <br />

venha sobre mim esta misericórdia que com tanta opulência procede de ti! Que em mim se <br />

derrame o que de ti dimana. Por demência perdoa-­‐me, a fim de não ser castigado pela justiça. <br />

Porque, mesmo se é difícil compreender [intelligere] como a tua misericórdia não está ausente da <br />

tua justiça, é todavia necessário acreditar [credere] que nunca o que transborda da tua bondade, a <br />

qual é nulla sem a justiça, tem como adversário a tua justiça, mas antes verdadeiramente concorda <br />

com ela. Se és misericordioso é porque és sumamente bom, e se és sumamente bom sendo <br />

sumamente justo, és verdadeiramente misericordioso pela mesma razão que és sumamente justo. <br />

Ajuda-­‐me, ó Deus justo e misericordioso, cuja luz procuro, ajuda-­‐me a reconhecer o que digo: és <br />

verdadeiramente misericordioso porque és justo.” 107<br />

O peregrino de Anselmo transporta estilisticamente o texto do capítulo IX para uma <br />

forma mais explicitamente poética e salmódica de oração, a que por isso mesmo chamamos <br />

poema da misericórdia. À primeira vista, poderá parecer uma mera exaltação poética da <br />

misericórdia e um louvor dos atributos divinos. No entanto, este “poema” funciona ao mesmo <br />

tempo como um elemento-­‐chave na argumentação do autor sobre a contradição que temos <br />

vindo a analisar, entre a bondade e a justiça. <br />

107<br />

Cf. Proslogion, Cap. IX, “O misericordia, de quam opulenta dulcedine, et dulci opulentia nobis <br />

profluis! O immensitas bonitatis Dei, quo affectu amanda es peccatoribus! Justos enim salvas, justitia <br />

comitante; istos vero liberas, justitia damnante. Illos, meritis adjuvantibus; istos, meritis repugnantibus. <br />

Illos, bona quae dedisti cognoscendo; istos, mala quae odisti ignoscendo. O immensa bonitas, quae sic <br />

omnem intellectum excedis, veniat super me misericordia illa, quae de tanta opulentia tui procedit! <br />

Influat in me, quae profluit de te. Parce per clementiam, ne ulciscaris per justitiam. Nam etsi difficile sit <br />

intelligere quomodo misericordia tua non absit a tua justitia; necessarium tamen est credere quia <br />

nequaquam adversatur justitiae, quod exundat ex bonitate, quae nulla est sine justitia, imo vere <br />

concordat justitiae. Nempe si misericors non es, nisi quia es summe bonus; et summe bonus non es, nisi <br />

quia es summe justus: vere idcirco es misericors, quia summe justus es. Adjuva me, juste et misericors <br />

Deus, cujus lucem quaero; adjuva me, ut intelligam quod dico. Vere ergo ideo misericors es, quia <br />

justus.” <br />

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