Baixar - Brasiliana USP
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132 MYSTERIO DA TIJUCA<br />
Pelos olhos vivos e travessos, pelo<br />
moreno quente de suas faces coradas<br />
e viçosas, por seus lábios carnudos e<br />
vermelhos, pelo vigor de sua larga<br />
respiração e pela seductora frescura<br />
de seus dentes, a segunda mulher do<br />
commendador pedia um marido mais<br />
esperto e mais senhor de si; de sorte<br />
que, por occasião de se escancarar a<br />
janella de que ha pouco falíamos,<br />
escaparam, de envolta com os últimos<br />
raios da mocidade do infeliz<br />
marido, as estopinhas da fidelidade<br />
conjugai, cujos votos a esposa do<br />
commendador principiava a romper<br />
com toda a força de seus ricos membros.<br />
Uma janella aberta, e que se não<br />
pôde fechar, é um perigo constante<br />
para a casa a que pertence, principalmente<br />
se n'esta houver uma flor,<br />
porque os insectos andam soltos lá<br />
por fora.<br />
O primeiro insecto que entrou pela<br />
janella foi o Portella, aquelle bello<br />
moço morigerado do commercio, que<br />
foi chamado por Henriqueta e Leão<br />
Vermelho para servir de padrinho a<br />
nossa Clorinda, e o qual mais tarde<br />
vimos, transformado em commendador,<br />
a conversar em companhia do<br />
Adelino Fontoura e do Duque Estrada<br />
em casa da afilhada.<br />
Portella estava por aquelle tempo<br />
no vigor dos annos; teria quando<br />
muito vinte e cinco, porque fora justamente<br />
n'essa época que elle baptisara<br />
afilha natural de Leão Vermelho.<br />
Vejamos agora quaes foram as<br />
circumstancias que o approximaram<br />
da mulher do commendador Ferreira,<br />
porque essas circumstancias articulam-se<br />
de alguma fôrma com as<br />
futuras scenas do romance. O pae<br />
de Olympia n'esse tempo campeava<br />
ainda no commercio, de sociedade<br />
com um tal João Figueiredo, tão portuguèz<br />
como elle, porém muito menos<br />
fino e menos traquejado nas salas.<br />
O nosso Portella era caixeiroda casa.<br />
N'esse tempo, como deve saber o<br />
leitor, os empregados do commercio<br />
não gosavam em geral de umas<br />
tantas regalias, que só mais tarde<br />
lhes foram conferidas pelos patrões.<br />
O bigode, a gravata, o fraque, por<br />
exemplo, eram fructoprohibido para<br />
os caixeiros. Entrar em um café, fumar<br />
um charuto, saber dançar uma<br />
quadrilha franceza, tudo isto era para<br />
os infelizes moços crimes de lesa moralidade<br />
commercial. Mas o commendador<br />
Ferreira não se deixava levar<br />
por esses preconceitos e dava aos seus<br />
empregados plena liberdade de deixar<br />
crescer o bigode, vestir um fraque,<br />
penetrar nos raros cafés d'esse tempo<br />
e fumar os charutos que quizessem.<br />
O Figueiredo oppunha-se amargamente<br />
contra similhantes liberalidades<br />
do sócio.— Você me quer<br />
estragar os rapazes !... dizia elle,<br />
penetrado de um grande desgosto<br />
— Pois você não vê, seu Ferreira,<br />
como tudo por ahi anda já desmoralisado<br />
! Não vê como hoje só ha<br />
pelintras?! Não vê que hoje já os<br />
rapazes, em vez de aproveitarem o<br />
domingo para ir á missa, querem ir<br />
fumar charutos no Passeio Publico e<br />
metterem-se á tarde na patifaria do<br />
theatro ?!<br />
E o Figueiredo, possuído cada vez<br />
mais de sua indignação, continuava<br />
a exhortar o sócio á ver se o chamava<br />
ás suas theorias; mas o commendador<br />
não se deixava catechisar, e<br />
continuava a dar folga aos rapazes.<br />
E', porém verdade que, entre os<br />
caixeiros da casa, só um se aprovei-